“O Motorista de Autocarro que Queria Ser Deus”, de Etgar Keret (2008)

Foi o título do livro que me despertou a atenção, claro.

—Mas confesso que as histórias de Keret são, no mínimo, estranhas.

Etgar Keret é um escritor israelita, nascido em 1967, conhecido como autor de histórias curtas, novelas e argumentos para televisão.

O Motorista de Autocarro que Queria Ser Deus é o título da primeira história desta colectânea que, originalmente, se intitula Missing Kissinger, que é a quarta história.

Claro que o título escolhido para a edição portuguesa não é inocente.

—Por vezes, a escrita de Keret faz lembrar os Contos do Gin Tónico, do Mário-Henrique Leiria, mas só por vezes.

Um exemplo:

A história Atravessar Paredes, começa assim:

“Ela tinha um daqueles olhares, meio desiludido, meio quero-lá-saber! Como alguém que descobre ter comprado leite magro por engano e não tem força para ir trocá-lo.”

Outro, tirado do início da história Exclusividade:

“Foi exactamente nessa altura que deitei abaixo uma parede. Os jornalistas são todos umas putas e eu deitei abaixo uma parede”.

Não há dúvida que são inícios prometedores mas, depois, a coisa perde-se um bocado.

A edição é da Sextante e a tradução, do hebraico, é de Lúcia Liba Muczick.

Memória curta

Li hoje no Público.

“No dia 20 deste mês, Passos Coelho, citado pela Lusa, defendia «uma unidade militar de resposta a emergências e, nomeadamente, a este tipo de emergências» (os incêndios), a exemplo da força espanhola enviada durante o verão para ajudar no combate aos fogos em Portugal.”

E, mais í  frente:

“A 26 de Outubro, Assunção Cristas, nas 43 medidas apresentadas pelo CDS para lutar contra a tragédia dos incêndios, pediu que fosse redefenida «a forma de participação das Forças Armadas nas missões de protecção civil, com a criação de uma unidade especial formada e equipada para o efeito».

Acontece que já existe uma unidade das Forças Armadas direccionada para a protecção civil.

Chama-se Regimento de Apoio Militar de Emergência…e foi criado pelo governo Passos-Cristas…

Se a Dona Assunção e o Sr. Coelho já nem se lembram das decisões que tomaram enquanto foram governo, que podemos nós esperar mais destas aventesmas?…

—

Marcelo & Costa

Marcelo apoiava o governo de Costa mas já não apoia.

Marcelo, fundador do PPD-PSD, apoiava um governo do PS, sustentado pelo PCP e BE?

Estranho.

Mas todos diziam que, afinal, Marcelo e Costa eram amigos…

—

Puro engano!

Qual Dr. Jeckyl e Mr. Hyde, Marcelo e Costa são, afinal, uma e a mesma pessoa.

A foto não engana!…

—

 

 

 

“Purity”, de Jonathan Franzen (2015)

—Acabei, finalmente, a leitura deste Purity, o segundo romance que leio de Jonathan Franzen.

E digo finalmente porque foi um pouco difícil ir seguindo esta história complexa, ao longo de quase 700 páginas.

Já tinha lido Liberdade, outro tijolo de Franzen, e este Purity é, também, uma história que se desenrola ao longo de décadas.

Os cenários são vários: Berlim, no tempo da República Democrática da Alemanha, os Estados Unidos e a selva da Bolívia.

A personagem central é Purity Tyler, uma jovem que vive numa espécie de comunidade de ocupas e que não sabe quem é o seu pai. A sua mãe, Anabel, é herdeira de uma fortuna de milhões, mas vive isolada e trabalha como empregada de mesa.

Há também Andreas Wolf, um alemão da RDA, que comete um assassínio e nunca é apanhado e, mais tarde, funda uma organização do tipo Wikileaks (aliás, esta personagem cheira a Assange que se farta).

E, claro, o pai de Purity, jornalista independente, que também não sabe que tem uma filha e que é o elo de ligação entre esta malta toda, uma vez que conheceu Andreas pouco depois da queda do muro de Berlim.

A história é boa mas dá tantas voltas que me custou acabar a coisa.

Os amigos sauditas

Os governos de Washington sempre gostaram muito da Arábia Saudita.

Devem gostar dos trajes.

Só assim se compreende que as relações comerciais entre os Estados Unidos e a Arábia Saudita continuem de vento em popa, apesar do poder saudita se estar cagando para os direitos humanos.

Enfim, parece que a partir de 2018, as mulheres sauditas já poderão tirar a carta de condução.

Deve ter sido Trump – esse grande democrata! – que convenceu o rei Salman a liberalizar um pouco a coisa.

Mas não convém abusar: amanhã, as mulheres começam a conduzir e, no dia seguinte, começam a exigir sexo oral!

Toda a gente sabe como as gajas podem ser exigentes!

Mas as relações entre a administração norte-americana e a monarquia saudita nunca esteve tão bem como agora, com Trump a comandar.

Se bem se lembram, a primeira saída de Trump para o estrangeiro foi para visitar a Arábia Saudita e selar um contrato de milhões de dólares em armas.

Agora, foi a vez dos EUA venderem aos sauditas um sistema anti-míssil de última geração, pela módica quantia de 15 mil milhões de dólares.

Se o sistema anti-míssil for tão bom como a passadeira dourada que avariou e obrigou o pobre do rei Salman a descer as escadas do avião, a pé, na sua recente visita í  Rússia, os sauditas estão all fucked up!

—

Mortos, sim – surdos, nunca!

Na mesma semana em que um norte-americano matou, a tiro, 59 pessoas, até ver… o Congresso preparava-se para aprovar uma lei para simplificar a venda de silenciadores.

Para que os tiros não incomodem tanto os atiradores.

A votação da lei foi adiada, mas está na calha.

Foi proposta pelo republicano Jeff Duncan e leva por título “Hearing Protection Act”.

Por outras palavras, é uma lei para proteger a audição dos atiradores.

Diz a patriota National Rifle Association que a aprovação daquela lei que permite a venda mais facilitada dos silenciadores, é “fundamental para reduzir a surdez parcial ou total dos sócios”.

O tal Jeff Duncan, que assina a lei, acrescenta: “pratico tiro desde criança, quando caçava pombos com o meu pai. Perdi parte da audição devido aos disparos. Com silenciadores teria protegido a minha saúde e a de milhões de americanos”.

O tipo que matou 59 pessoas, Stephen Paddock, devia ter a mesma opinião.

Ficou tão doido com os milhares de tiros que teve que dar para matar e ferir aquela gente toda, que acabou por se suicidar.

Se tivesse um silenciador, talvez pudesse ter morto mais gente e evitar o suicídio, que é sempre uma chatice.

Imagino como ficou a alcatifa da suite…

As eleições autárquicas explicadas pela onomástica

São os nomes que são importantes, não os Partidos.

Por razões óbvias, os Partidos são, por nomenclatura, partidos.

Os nomes, por outro lado, são inteiros. Completos. Totais.

O PCP perdeu Almada?

Claro! Como se chama o candidato comunista?

Chama-se Judas.

Não é a primeira vez que um Judas trai a sua religião…

Diz-se, também, que o grande derrotado é o Passos Coelho.

Mas nem todos os coelhos se lixaram com estas eleições.

Em Ourique, por exemplo, ganhou um Coelho do PS.

Qual o seu apelido completo?

Coelho Guerreiro!

Não Passos Coelho (ou coelho a passo), nem Leal Coelho (ou leal ao Coelho), mas um Coelho Guerreiro – um coelho como deve ser!

Mas há contradições, nestas eleições.

Que dizer quando verificamos que o presidente de Cuba se chama Casaca Português?

E que, em Mogadouro, ganhou um Guimarães, em Alcácer do Sal, um Proença, em Palmela, um Amora, em Melgaço, um Pombal, um Paredes, em Alijó, um Abrantes, em Carregal do Sal, um Moura, em Lamego, e em Condeixa-a-Nova, um Moita?

Que alguns políticos são lobos com vestes de cordeiro, todos sabemos.

Mesmo assim, em Proença-a-Nova, ganhou um Melo Lobo e, na Vidigueira, um Serrano Raposo.

Mas ninguém bate a onomástica alentejana. O Alandroal vai ser governado por um Aranha Grilo, Arraiolos, por um Tirapicos Pinto e Montemor-o-Novo por uma  Anjos Chegado Menino!

Os Grilos parecem ter invadido o Alentejo, nestas autárquicas.

Além do Aranha Grilo, do Alandroal, temos um Clemente Grilo, em Portel (como será um grilo clemente? perdoa mesmo quando é esmagado?).

No Redondo, ganhou um Recto. Um Recto no Redondo é sempre correcto. Sobretudo quando o apelido completo é Rega Matos Recto.

O PS conquistou muitas câmaras ao PCP no Alentejo. Mas, por vezes, precisou de ajuda. Por exemplo, em Viana do Alentejo, ganhou com a ajuda de um Bengalinha Pinto.

Em Vila Viçosa, pelo contrário, o PCP não cedeu e ganhou, com o seu candidato, de apelido Condenado…

Coitado!…

A importância da 3ª idade afirmou-se, nestas eleições.

Os velhotes gostam de votar.

Que o digam os eleitores de Aljezur, que elegeram o candidato do PS, Velhinho Amarelinho.

Já falei dos Coelhos.

Nem todos falharam, no entanto.

Em Faro, por exemplo, houve um Coelho que triunfou, embora tenha sido preciso uma coligação PPD/PSD-CDS/PP-PPM-MPT.

E, mesmo assim, o candidato vencedor não é carne nem peixe – chama-se Bacalhau Coelho!

De Aranhas, Grilos e Coelhos, estamos falados.

Mas temos outros animais nas autárquicas.

Tomem nota: um Robalo, do PSD, no Sabugal, uma Camelo, do PS, em Seia, um Chicharro, também do PS, na Nazaré, um Pombo, do PSD, em Arronches, um Leão, do PS, em Paços de Ferreira, um Cordeiro, do PNT, em S. João da Pesqueira.

No que respeita í  vontade que cada autarca tem para decidir em prol da sua comunidade, as coisas variam entre um Rijo, em Arruda dos Vinhos, e um Folgado, em Alenquer, ambos do PS.

Por vezes, a ajuda divina é essencial. Talvez tenha assim que, em Cascais, ganhou o candidato do PSD/CDS, Lavrador de Jesus e em Sesimbra, o comunista Firmino de Jesus.

Jovens bem comportadas parecem ter conseguido convencer o eleitorado em Castelo de Vide, onde o PSD ganhou com um Nobre Pita, e em Elvas, onde o PS ganhou com um Mocinha.

Os candidatos gostam de beijar os eleitores durante as campanhas? Claro, que o diga ílvaro Beijinha, que ganhou em Santiago do Cacém.

A contradição é patente no presidente de Ourém, que se chama Grossinho Coutinho. Como é que um grosso pode ser grossinho?…

Claro que poucos presidentes poderão gabar-se de terem um nome tão pomposo como a nóvel presidente de Almada, Inês de Saint-Maurice Esteves de Medeiros Victorino de Almeida, mas também poucos se aproximam da simplicidade do novo presidente do Montijo, também do PS, e que se chama, simplesmente, Nuno Canta.

Ei Nuno! Canta, homem!

Coerência terá o presidente da Câmara do Barreiro, eleito pelo PS, e que se chama Costa Rosa (não Laranja, nem Vermelha – mas Rosa!)

Mas é difícil ser tão coerente como o vencedor da Chamusca, o socialista Cegonho Queimado.

Mais difícil ainda: ser mais cínico que o vencedor de Oeiras que é Isaltino e Morais!

Ou há moralidade ou comem todos!

(nenhum destes nomes é inventado – confirmar aqui…)

De Tancos para Pyongyang?

Os factos, toda a gente conhece: desapareceram dos paióis de Tancos algumas armas.

Até agora, ninguém sabe se foram desaparecendo ao longo dos tempos, se desapareceram todas no mesmo dia, se nunca chegaram a fazer parte do inventário, quem as desviou, se eram obsoletas – nada!

Parece que há inquéritos a andar, investigações em curso.

Mas eis que, de repente, o Expresso descobre um relatório que arrasa o actual Ministro da Defesa e apresenta vários cenários possíveis, entre eles, o roubo das armas por mercenários portugueses com destino í  Guiné-Bissau e Cabo Verde (Cabo Verde?!… para quê?!…), ou ainda, para jihadistas.

O Presidente da República, que é o Comandante Supremo das Forças Armadas, desconhece o relatório; o Governo também parece não o conhecer.

Será uma “fake news”?…

Ontem, o actual director do Expresso, Pedro Santos Guerreiro, foi í  Sic garantir que o relatório existe mesmo – e até levava consigo um caderno de folhas A4.

Claro que não disse quem era o autor do relatório porque isso não interessa nada.

Disse, isso sim, que “armamento nuclear” andava por aí, sem ninguém saber onde.

Nuclear?

Ele disse armamento nuclear?

Disse.

Então mas agora Portugal também já é uma potência nuclear e guarda as suas armas nucleares em Tancos, í  mão de semear?!

Note-se que Pedro Santos Guerreiro é um jornalista premiado; ganhou o Prémio de Excelência em Jornalismo Económico, quando era director do Jornal Económico, prémio esse, de 30 mil euros, patrocinado pelo Banco Espírito Santo (dois anos depois, o Banco foi para o galheiro).

De armas é que parece que não percebe peva!

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“Humidade”, de Reinaldo Moraes (2005)

—Reinaldo Moraes nasceu em São Paulo há 67 anos e ficou conhecido, por cá, graças ao romance Pornopopeia, que li há uns anos e de que não gostei particularmente.

Achei-o vulgar e cansativo, no que í s descrições de orgias sexuais dizia respeito, e muito difícil de ler, devido ao brasileiro muito fechado.

Porém, antes de publicar o romance, Moraes tinha lançado este livro de contos, Humidade, e acho que a sua escrita descabelada e pornográfica se adequa muito mais aos contos que a um romance de 600 páginas.

—Esta colecção de contos é, no entanto, um pouco heterogénea, no que respeita í  qualidade: há dois muito bons, há alguns menos bons e há outros perfeitamente dispensáveis.

No entanto, os contos Sildenafil e Humidade, valem o livro.

O conto Sildenafil (princípio activo do Viagra), é todo escrito em discurso directo; é uma conversa entre um marido e sua mulher, na cama, ela tentando que ele a coma, finalmente, depois de muito tempo de jejum sexual.

Em Humidade, Liminha, um informático banal, consegue engatar a Mariana, uma mocetona linda de morrer, boa como o milho, como nós diríamos, mas que se quer manter virgem até ao casamento e, pelos vistos, mesmo depois do casamento.

Mais do que as histórias propriamente ditas, o que torna este livro muito divertido, é a linguagem que Moraes usa.

Posso dar muitos exemplos.

Na história que dá título ao livro, o tal Liminha, depois de mais uma tampa da namorada, exclama:

Ah, replicou o Liminha mentalmente, se a tua mãe não fosse aquela catedral obtusa de gordura e carolice você não seria a neurótica que é e estaria a sentir, agora, uma Foz do Iguaçu de porra apaixonada escorrendo por essas pernas magníficas, depois de uma noite de sexo insano, minha flor…

No conto Festim, Fátima Márcia, que tenta caçar um ricalhaço, vai de táxi para uma festa na mansão do futuro marido:

No táxi, FM, como ela também gostava de ser chamada, foi idealizando lindos e mancebosos exemplares de homo erectus dispostos a adentrar com aguda sensibilidade sua fratura ontológica e encher de sentido seu ser-aí.

E só mais um exemplo, que podiam ser muitos mais. Este é retirado da História í  Francesa, em que um conde já entradote, casado com uma princesa muito mais jovem, gostaria que ela lhe lambesse um determinado sítio, mas não tem coragem para pedir:

Não contente em alojar o estrongalho na pandoreba ainda despreparada da moxa, o conde, ao mesmo tempo, introduziu-lhe um salivado índex no olho do rebulho, sem deixar de bolinar-lhe as balonetas bicudas e dar-lhe trabalho í  lâmbia, que o escolado conde atiçava com a sua própria lâmbia assanhada e babilenta.

Vale a pena o tempo que se perde a decifrar o português!…

O Serviço Nacional de Saúde da Nâmbia

Donald Trump elogiou o Serviço Nacional de Saúde da Nâmbia (ver aqui).

Por duas vezes.

Enalteceu o facto de os países africanos em redor terem sido dizimados pelo ébola, enquanto a Nâmbia se mantinha incólume, graças ao seu sistema de saúde, muito parecido com o que Trump imaginou para os States.

Claro que o facto de a Nâmbia não existir, é apenas um pormenor.

Trump poderia garantir que o sistema de saúde da Nâmbia é tão bom como o sistema prisional da Indofrígia ou como o sistema judicial da Maurinésia.

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