Recordar é viver?

Com as medidas do governo para 2012, vamos andar para trás vários anos

1 – O SEGREDO DE CAVACO SILVA, SEGUNDO A ESPOSA

Na sua edição de 10 de Fevereiro de 1990, o Expresso fazia eco de uma entrevista concedida por Maria Cavaco Silva í  revista “Família Cristã”.

Nessa altura, a Dona Maria era professora na Universidade Católica e o Sr. Silva era primeiro-ministro. Haveria conflito de interesses? Explica a actual esposa do Presidente da República:

«Posso até contar-lhe um episódio de uma aluna que era fervorosa admiradora do senhor primeiro-ministro e que me pediu se eu lhe arranjava um autógrafo. Respondi-lhe que teria que se dirigir a ele, deixando bem clara a minha posição na aula”.

Ora toma!

Mais í  frente, o jornalista pergunta í  Dona Maria se ela pensa que o seu marido foi levado pelos acontecimentos, quando acabou por concorrer ao lugar de chefe do governo. E ela responde:

«As coisas foram acontecendo, e de repente ele viu-se numa situação semelhante í quela que Fernando Pessoa exprime na Mensagem, quando o rei se vê com a espada na mão, e diz: Que farei com esta espada? – Ergueste-a e fez-se! Penso que com o meu marido aconteceu uma situação semelhante, pois viu-se com qualquer coisa, que provavelmente nunca tinha pensado, na mão, e teve que andar para a frente e se ir adaptando, í  medida que as coisas iam acontecendo».

Tem sido esse o nosso drama: Cavaco, 10 anos primeiro-ministro, 10 anos presidente, foi-se adaptando, í  medida que as coisas foram acontecendo…

Sem comentários

* “Os seus propagandistas (do Governo) podiam poupar-nos a ilusões e a demagogia ideológica: daqui (das medidas do Orçamento) não resultará qualquer Estado mais virtuoso na sua magreza, nem nenhum país mais competitivo, nem um Portugal melhor. Sairá um país mais pobre, exausto, mais dependente, menos culto, menos qualificado, com  maiores diferenças sociais, mais zangado e mais violento e, muito provavelmente, com menos liberdades”

– Pacheco Pereira, in Público de hoje

* “Não há alternativa? Há sempre uma alternativa mesmo com uma pistola encostada í  cabeça. E o que eu esperava do meu primeiro-ministro é que ele estivesse, de forma incondicional, ao lado do povo que o elegeu e não dos credores que nos querem extrair até í  última gota de sangue”.

– Nicolau Santos, in Expresso de hoje

* “Até há dias, a estratégia do Governo passava por diferenciar Portugal da Grécia. Paradoxalmente, para evitar sermos vistos como a Grécia, a solução agora proposta é a mesma que levou ao descalabro económico e social que se vive nas ruas de Atenas. O fim dos subsídios de férias e de Natal, a somar a todos os outros cortes salariais e aumentos de impostos, terá inevitavelmente duas consequências: o colapso da procura interna e uma recessão ainda mais profunda do que o previsto.”

– Pedro Adão e Silva, in Expresso de hoje

* “Já basta e ofende a desculpa da herança do anterior governo. Primeiro, porque juraram que não o fariam; segundo, porque só mostra que nada sabiam do estado do país e não estavam preparados para governar, mas apenas para ocupar o poder; terceiro, porque, que se tenha percebido, o tal buraco inesperado de 3 mil milhões decorre, todo ele, da privatização do BPN, nas condições definidas por este governo, e das dívidas escondidas do querido Jardim, criatura emérita do PSD”.

– Miguel Sousa Tavares, in Expresso de hoje

 

PAN PAN (queijo, queijo)

O PAN – Partido pelos Animais e pela Natureza – conseguiu eleger um deputado nas eleições da Madeira.

Obtendo o esmagador resultado de 3135 votos, o PAN juntou mais uma bizarria í  Madeira.

Não lhe bastava (í  ilha) ser governada pelo Alberto João desde a pré-história, é agora, também, detentora do único Parlamento com um representante dos animais.

Todos os que me conhecem sabem que eu gosto de animais e sou um defensor da natureza mas, francamente, penso que os animais e a natureza são assuntos sérios demais para serem tratados por um partido político.

É que o PAN, nas últimas legislativas, por pouco que não conseguiu eleger, também, um deputado por Lisboa.

Como se explica este fenómeno?

Encontrei a resposta nos jornais de hoje: as vendas de comida para animais nos hiper e supermercados, aumentou 7,1%, enquanto as vendas de nutrição infantil diminuiu 2%.

Estamos entregues í  bicharada!…

Obrigado, Coelho!

Venho por este meio agradecer ao primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, ao ministro das Finanças, Vitor Gaspar e ao í€lvaro, o facto de terem decidido cortar-me os subsídios de Natal e de férias do próximo ano.

Feito estúpido, estava decidido a gastar esses dois subsídios em produtos portugueses, ajudando, assim, a dinamizar a nossa economia.

Que burro que eu sou!

“Pornopopeia” (2008), de Reinaldo Moraes

Li algures que este livro do escritor brasileiro Reinaldo Moraes, fazia lembrar os lendários Sexus, Plexus, Nexus, Trópico de Cancer e Trópico de Capricórnio, de Henry Miller.

Ora, eu li esses cinco livros do Miller, de enfiada, em 1980, quando tinha 27 aninhos. Marcaram-me de tal modo que não hesitei em ler este Pornopopeia. No fundo, estava com esperança de reviver os meus verdes anos.

—Não posso dizer que tenha sido tempo perdido (e foi muito, que o calhamaço tem quase 600 páginas!), mas o livro tem pouco a ver com aqueles outros do Miller. Talvez se aproxime de outra obra, menor, muito menor, do escritor norte-americano, chamada Opus Pistorum – livro que Miller terá escrito apenas para ganhar dinheiro, a xis dólares por página, e tendo por obrigação descrever o maior número de fodas possível.

Pornopopeia está escrito em brasileiro, por vezes tão cerrado que quase precisaria de tradução. Exemplo:

“Cê acredita que ela me deu bom-dia coçando a bunda por dentro da calcinha? Bitchí´?! Quê que é aquilo?! Ela tá pensando o quê, essa menina? Que eu sou eunuco? Eu sí´ minêro, sí´! Minêro não moderniza nessas coisa. Muié é muié, vaca é vaca. E as duas a gente toca ca vara. Essa menina tá facilitando comigo. Que nem outro dia que eu entrei no quarto da Estelinha pra falar num sei que e tava lá a Sossí´ de costas pra porta, sem camiseta nem sutiã, cum puta dragão tatuado na lomba, coisa mai doida, sí´. Ni qui ela notou minha presença, virou de perfil pra mim. E eu vi, rapá, eu vi: um peitinho da Sossí´! Um só, branquim de leite.”

O livro conta-nos as andanças de um falhado realizador de cinema que, ao fim e ao cabo, o que quer é snifar coca e comer gajas. Ao contrário dos tais livros do Miller, não há cá filosofias de vida nem porra nenhuma (o Miller andava por Paris, em busca da liberdade e da cultura…). O herói deste livro, prosaicamente chamado Zé Carlos, o que quer é bundas e bucetas e boquetes e punhetas com lulas e o cacete! Exemplo:

“No que ela entrou no carro já lhe passei o cinquentinha do michê, que ela enfiou rápido no decote. Sempre faço isso, de pagar a puta antes. Cria um clima de confiança, esquenta a relação, melhora a qualidade da foda.”

A páginas tantas, o livro fez-me lembrar alguns filmes pornográficos: temos uma descrição detalhada e prolongada de uma orgia numa espécie de igreja oriental, outra orgia num bar de alterne, várias quecas com uma sexagenária e uma tarde de sexo atlético com uma jovem “caiçara”. No meio destas cenas, que envolvem tudo o que se possa imaginar, no que respeita ao desporto sexual, há um fio de história, muito fraquinho, que envolve um dealer de cocaína, que é morto, acidentalmente, pela polícia, que culpa o fodilhão do Zé Carlos.

Em resumo: a coisa é divertida, mas é uma obra menor, acho eu.

Cavaco Silva e as sex shop

O Diário de Notícias faz hoje eco de um artigo publicado na revista Wired e que me deixou de boca aberta.

Cavaco Silva é dos chefes de Estado que mais usam o Twitter!

E esta?

Mas as surpresas não ficam por aqui.

Segundo a revista, Cavaco, que é referido como o “mais curioso dos líderes”, segue unilateralmente 69 outros chefes de Estado!

Mas a melhor é esta: o nosso presidente segue também duas sex shop duas!

São elas: a Love Shop e a Anjos do Pecado!

A Love Shop é de Santarém e a Anjos do Pecado é de Matosinhos e apresenta-se como “a primeira sex shop em Portugal dedicada ao prazer da mulher!”

Desta é que eu estava í  espera, caramba!

O Aníbal, afinal, é um malandreco!…

“Blink” (2005), de Malcolm Gladwell

Malcolm Gladwell é um jornalista nascido no Canadá, em 1963, e que vive em Nova Iorque, pertencendo í  redacção da New Yorker desde 1996.

Autor de quatro livros, foi considerado pela Time, em 2005, uma das 100 pessoas mais influentes.

—Este “Blink” é um livro sobre as decisões que tomamos num piscar de olhos, “o pensamento que não é pensado”, as decisões “instintivas”, mas que, no fundo, são baseadas na enorme base de dados que é (ou devia ser…) o nosso inconsciente.

Socorrendo-se de inúmeras experiências realizadas por diversos autores, Gladwell fala-nos das diversas variáveis que podem influenciar as nossas decisões.

Talvez a mais surpreendente seja a que é relacionada com o sexo ou a cor da pele, ou ainda, de um modo mais generalista, com a aparência geral da pessoa.

Cita, por exemplo, o Implicit Association Test, inventado por um grupo de psicólogos de Harvard e que pode ser consultado e experimentado aqui – www.implicit.harvard.edu.

Gladwell conta como as orquestras sinfónicas norte-americanas só tinham cerca de 5% de mulheres instrumentistas e como, nas audições, os homens eram quase sempre preferidos í s mulheres. Quando, há cerca de 25 anos, alguém se lembrou de colocar os candidatos atrás de biombos, as mulheres passaram a ser mais vezes escolhidas e, hoje em dia, já representam 50% dos membros de qualquer orquestra – mesmo em instrumentos como a tuba que, até há alguns anos, só tinha homens a soprarem nela…

Mostra que a nossa capacidade de decisão instantânea é muito alterada com o aumento da complexidade da escolha e comprova-o com o popular teste da Pepsi e da Coca-Cola. Quando temos que escolher entre dois copos, acertamos um número razoável de vezes; mas basta colocar três copos, dois com Pepsi e um com Coca, ou vice-versa, para o número de erros ser muito maior.

Em resumo, Gladwell acaba por nos dizer que, quando temos que decidir sobre um coisa simples, devemos sempre considerar os prós e os contras, estudar bem a situação e só depois, decidir. No entanto, quando temos que tomar uma decisão verdadeiramente importante, mais vale confiar nos nossos instintos, no nosso inconsciente.

Ao fim ao cabo, concorda com Freud e cita-o: «quando tomo uma decisão pouco importante, penso que é sempre vantajoso considerar todos os prós e contras. Porém, em questões vitais, como a escolha de um parceiro ou parceira, ou de uma profissão, a decisão deve vir do inconsciente, de algures de dentro de nós. Penso que nas decisões importantes da nossa vida pessoal devíamos reger-nos pelas necessidades interiores profundas da nossa natureza».

 

Prémio Nobel da Paz 2011

Foi hoje anunciado o Prémio Nobel da Paz deste ano.

O Prémio foi atribuído a três mulheres: Ellen Johnson Sirleaf, presidente da Libéria; Leymah Gbwoee, activista liberiana pelos direitos das mulheres; e Tawakkul Karman, opositora í  ditadura do Iémen.

Os Prémios Nobel são sempre objecto de polémica, sobretudo os da literatura e da paz porque são coisas mais terra-a-terra. Pí´r em causa o Nobel da Química, atribuído a um cientista que descobriu os “não-cristais”, não nos passa pela cabeça, porque não fazemos a mais pequena ideia do que são “não-cristais”.

Agora, conceder o Nobel da Literatura a um poeta sueco que só o Vasco Graça Moura sabe quem é, em vez de premiar Bob Dylan (?), ou mesmo, Lobo Antunes!…

E quanto ao Nobel da Paz, basta recordar que ele já foi atribuído a Anwsar Sadat e Menachem Begin, Henry Kissinger, Barak Obama, Ximenes Belo e Ramos Horta, Shimon Peres e Arafat e até a um obscuro sindicalista católico e polaco, de grandes bigodes, chamado Lech Walesa – basta recordar estes nomes para desconfiar da isenção do comité que escolhe os laureados. Claro que a escolha tem uma forte componente política.

Este ano, escolheram três mulheres e só podem ser aplaudidos por isso.

Destaco a presidente da Libéria, Ellen Sirleaf.

Deve ser preciso muitos tomates para ser mulher e presidente de um país como a Libéria.

Nota: o Prémio Nobel da Paz é atribuído pela Academia Norueguesa (enquanto os outros são da responsabilidade da Academia Sueca). A decisão é tomada aqui e o prémio é entregue aqui.

Os semáforos de Bissau

O Diário de Notícias publica hoje, na página 25, um texto de Mussá Baldé, jornalista da Lusa, intitulado: «Todos querem ver os primeiros semáforos da capital guineense”.

O texto é tão fantástico, que merece ser transcrito quase na íntegra.

Começa assim:

«Bissau recebeu os seus primeiros semáforos, mas em vez de se tornarem instrumentos para melhorar o trânsito automóvel, na realidade, causam curiosidade e confusão no tráfego.»

Portanto, na principal avenida de Bissau, foram colocados semáforos, a título experimental. Os habitantes da Guiné-Bissau nunca tinham visto semáforos na sua vida. Assim, segundo Baldé:

«O problema é decifrar a informação que é dada por cada cor, pois, í s vezes, acende o vermelho e lá estão alguns condutores a acelerar para passar, justamente na altura em que os peões, que também desconhecem a ordem dada pelas luzes, tentam atravessar a avenida.»

Trata-se de uma situação potencialmente perigosa. Haverá atropelamentos?

Parece que não. Tudo é vivido com a alegria. Voltemos a Baldé:

«As gargalhadas, tanto dos condutores como dos transeuntes, têm sido regra para acalmar essas hilariantes situações frequentes nos cruzamentos onde existem os semáforos».

E parece que nem as autoridades conseguem perceber o que as cores dos semáforos significam.

«Estava a luz vermelha acesa no semáforo e manda-me avançar um agente do trânsito. Não obedeci porque ele estava errado, contou Alfa Djaló, um taxista que trabalha na avenida Combatente da Liberdade da Pátria».

Baldé explica-nos que a confusão dos agentes de autoridade não se limita aos semáforos, «também é notada na sinalização, pois agora, a estrada que liga o mercado do Bandim ao aeroporto da capital guineense, ao longo de uma extensão de oito quilómetros, possui sinais e travessias para os peões. “Noutro dia por pouco não atropelei uma velhota que estava a atravessar a avenida. Dizia ela que os jovens que ali se encontravam nos postes dos semáforos, mandaram-na passar, dizendo que o semáforo, que estava verde, era para os peões atravessarem”, relatou um jornalista da Rádio Nacional.»

E Mussá Baldé termina esta notícia extraordinária com esta frase lapidar:

«Já se fala em Bisssau que algumas pessoas do interior viajam para a capital do país de propósito para verem os primeiros semáforos do país.»

Quinhentos anos de colonialismo português fez da Guiné-Bissau este caso de sucesso!