“O Cisne Negro”, de Nassim Nicholas Taleb

—“Antes da descoberta da Austrália, as pessoas do Velho Mundo estavam convencidas de que todos os cisnes eram brancos.”

Assim começa este livro que não podia ser mais actual, agora que estamos a sofrer as consequências de um acontecimento “inesperado”: a crise no mercado imobiliário norte-americano, os empréstimos não pagos, o tal sub-prime ou coisa que o valha.

Os economistas não previram esta crise, assim como não previram crise nenhuma porque, segundo a opinião de Taleb, só têm curvas de Gausse na cabeça e a realidade nada tem a ver com a curva em forma de sino.

Confesso que a leitura deste livro nem sempre foi fácil. Taleb navega em águas que não são as minhas. Mas captei o essencial: o inesperado, a incerteza, fazem parte da vida e não podemos prever nada se basearmos as nossas previsões apenas nas certezas – há que contar, também, com a incerteza.

Algumas ideias interessantes:

“A distinção entre escritor e padeiro, especulador e médico, burlão e prostituta, constitui uma forma útil de analisar o mundo das actividades, separando as profissões em que se podem adicionar zeros í  remuneração sem grande trabalho, daquelas em que é necessário aumentar o trabalho e despender mais tempo”.

Esta, então, faz-me lembrar qualquer coisa recente:

“O banco da Reserva Federal protegeu-os í  nossa custa, com o dinheiro dos nossos impostos: quando os banqueiros «conservadores» têm lucro, ficam eles com os benefícios; quando têm prejuízo, pagamos nós.”

Citando John Stuart Mill:

“Nunca foi minha intenção dizer que os conservadores são, de um modo geral, estúpidos. O que quis dizer foi que os estúpidos geralmente são conservadores”.

Sobre os especialistas:

“O problema dos especialisas, é que não sabem o que não sabem”.

Taleb não gosta de economistas em geral, de estatísticos e, sobretudo, de jornalistas, os fazedores de médias. E diz:

“Preocupo-me menos com os riscos propagandeados e sensacionalistas, mais com os riscos ocultos que representam um maior perigo. Preocupo-me menos com o terrorismo do que com a diabetes”.

A maior parte do livro passa-o Taleb a zurzir na curva de Gausse que, segundo ele, infectou todas as áreas. A da saúde, por exemplo. Veja-se o que se passa com a famosa “epidemia da gripe” actual, cujo pico já deveria ter ocorrido na véspera do Ano Novo, segundo a tal curva de Gausse e que – digo eu – nem sequer existe. Ou então, a existir, terá vários picos, uma vez que a difusão do vírus tem a ver com o contacto entre as pessoas, que será maior nos dias de trabalho, nos transportes públicos, nos escritórios, nas escolas, do que nos fins-de-semana, em que muita gente fica em casa. Ou não. O modo como se comporta o vírus da gripe não pode ser mostrado por uma curva de Gausse.

Restam, portanto, os fractais e, por isso, Taleb dedica o livro a Benoit Mandelbrot. Confesso que não percebi muito bem o que são fractais e penso que isso também não é muito importante para o meu dia-a-dia. Percebi, no entanto, que existe uma alternativa ao pensamento “gaussiano” e que essa alternativa é capaz de prever “melhor” a incerteza.

“Beatles – A História Secreta”, de Geoffrey Giuliano

—Na contracapa deste livro, lê-se: “a leitura deste livro mudará para sempre a maneira como vemos e ouvimos os Beatles”.

Não muda coisa nenhuma!

O livro é uma aglomerado de pequenos pormenores sem importância nenhuma, descrições de crises de mau humor de John Lennon, como McCartney se entregava í s drogas, como Ringo era um tipo porreiro, embora alcoólico e como Harrison era o mais simpático deles todos, muito Hare Krishna, etc e tal.

Não há história secreta nenhuma – apenas episódios soltos que talvez não tenham sido conhecidos porque, no tempo dos Beatles (1962-1970), os meios de comunicação social não eram tão agressivos e intrusivos como são hoje. Mesmo assim, os Beatles foram obrigados a viver uma vida inteira praticamente como reclusos, sobretudo durante aqueles oito anos de maior exposição.

Enfim, acabei por ler o livro todo por inércia, mas confesso que perdi o meu tempo…

“Arthur & George”, de Julian Barnes

—Deste escritor britânico, já li “Inglaterra, Inglaterra” (1998) e “Amor & Etc” (2000). Nenhum deles me entusiasmou muito. O mesmo aconteceu com este “Arthur & George”, finalista do Booker Prize de 2005.

O Arthur deste livro não outro senão o famoso oftalmologista Arthur Conan Doyle que, já depois de ser famoso como autor dos romances de Sherlock Holmes, se interessa pelo caso de George Edalji, um solicitador indiano, falsamente acusado de estropiar cavalos e preso por isso.

Durante anos, Arthur tinha humilhado a polícia britânica, através de Sherlock Holmes e, agora, tinha a oportunidade de se armar, ele próprio em detective e de provar que George está inocente e que tudo não passou de incompetência da polícia. Ao mesmo tempo que esta história se vai desenrolando, vamos sabendo mais coisas sobre Conan Doyle: que a sua esposa Touie tem tuberculose e está acamada há anos, que Doyle está apaixonado por outra mulher, Jean, mas esperam 10 anos, até que Touie morra, para consumarem esse amor, que Doyle era um adepto fervoroso do espiritismo e que era contra o voto das mulheres, etc, etc. O livro acaba, assim, por ser uma espécie de biografia do outro Conan Doyle, para além de Sherlock Holmes.

Repito: não me entusiasmou muito…

“Património”, de Philip Roth

—Em 1991, Roth publicou este comovente livro que narra os últimos tempos da vida do pai do escritor. Como está explícito no subtítulo, esta é “uma história verdadeira” e Roth “limita-se” a descrever como foi a vida do seu pai, desde que ficou sozinho, após a morte súbita da mulher (e mãe de Roth) e depois de lhe ter sido diagnosticado um tumor cerebral, que lhe foi limitando a autonomia.

Embora provenha de uma família religiosa judaica, Roth escreve com um ateu. A vida é assim mesmo, a morte também; não há compensações ou castigos, conforme nos portamos melhor, aos olhos de um deus que, achamos nós, os ateus, não existe. Portanto, a vida, a doença, a sobrevivência, a luta diária e a morte, são tudo coisas que acontecem a todos os seres vivos, judeus, católicos, muçulmanos, ateus.

O livro não é, como poderia ser, uma ladainha tristonha ou uma verborreia encomiástica. É um texto simples, no qual transparece a admiração de Roth pelo seu pai, o seu amor genuíno, adulto, maduro. Um excelente testemunho que o pai de Roth gostaria de ler, penso eu…

“Uma Questão de Beleza”, de Zadie Smith

—O terceiro romance de Zadie Smith, tal como os dois anteriores, é torrencial. São 500 páginas. E, como aconteceu com “Dentes Brancos” e “O Homem dos Autógrafos”, fico com a sensação que não era preciso escrever tanto. Em todos os romances desta jovem escritora britânica, há muitas páginas que parecem desnecessárias.

A acção de “On Beauty” decorre na Nova Inglaterra, em redor da vida universitária. Howard Belsey é branco e casado com Kiki, uma enfermeira negra e obesa; têm três filhos: um bem comportado Jerome, quase a acabar a universidade, uma reivindicativa Zora, caloira na universidade e Levi, que só pensa em rap e estilos de vida alternativos.

O ódio de estimação de Howard é Monty Kipps, um conservador reaccionário. Entre os dois, há mais do que ódios raciais. Apesar desse antagonismo, Howard não resiste aos encantos de Victoria, a filha mais nova de Monty. Esta relação extra-conjugal mina o casamento de Howard e a sua relação com os seus próprios filhos, pondo em causa, também, o seu lugar na universidade, onde ele dá aulas de interpretação de arte, sendo especialista em Rembrandt

Zadie Smith (que é mais nova que a minha filha!) escreve um romance sobre o amor e a sexualidade de tipos da minha idade. No entanto, repito o que já disse em relação aos outros romances da sua autoria: falta-lhe ainda qualquer coisa (será que lhe falta mais alguns anos de vida?…)

“Um Pequeno Inconveniente”, de Mark Haddon

—Haddon escreveu o excelente livro “O Estranho Caso do Cão Morto”, que era uma história narrada por uma criança autista. Daí, a curiosidade em ler este novo livro que, também ele, tem como principal personagem uma pessoa com dificuldades na relação com a realidade.

Trata-se de George, um vulgar chefe de família recém-reformado. A sua família é, também ela, uma vulgar família dos nossos dias: a mulher, Jean, cinquentona, redescobriu as delícias da vida sexual post-menopáusica com um ex-colega de trabalho de George; a filha mais velha, Kate, tem um filho pequeno, Jacob, vidrado em homens-aranhas e outros super-heróis e está prestes a casar-se, pela segunda vez, com um tal Ray; o filho mais novo, Jamie, é homossexual e a família ainda não aceitou bem esse facto. Depois, há uma série de pequenos personagens menores, que dão cor í  história.

E a história, no fundo, resume-se a isto: nas vésperas do segundo casamento da filha, George descobre uma mancha na pele da coxa e decide que tem cancro. A partir desse momento, qualquer racionalização é impossível. Para piorar tudo, apanha a sua mulher a ser comida pelo ex-colega de trabalho, na sua própria cama!

A história está muito bem contada, numa escrita escorreita e fácil, sem grandes devaneios filosóficos, mas com uma grande dose de realismo.

Um bom livro para se ler em viagem.

“Mr. Vertigo”, de Paul Auster

—Livro editado em 1994, foi agora reeditado em Portugal. Auster está na moda e ainda bem, para que todos os seus livros esgotados fiquem disponíveis.

Como é habitual “Mr. Vertigo” é mais uma história bem contada. O livro é escrito na primeira pessoa. Mr. Vertigo conta a sua própria história, desde os 9 anos, altura em que foi acolhido (quase raptado) por um judeu húngaro, o Mestre Yehudin, que o ensinou a voar.

Claro que a história é uma alegoria da vida e da América. Qualquer um de nós «pode voar», desde que tenha força de vontade e que trabalhe para isso e, na América, todos os sonhos são possíveis.

Ao mesmo tempo que vai contando as peripécias de Walter Rawley, o Rapaz Prodígio, como aprendeu ele a voar, como, mais tarde, teve que abandonar essa arte para não ser castrado, como se virou no mundo dos negócios escuros de Chicago, como se reformou e viveu feliz para sempre, cuidando de uma espécie de mãe adoptiva, que acabou por ser, também, sua amante, Auster conta, também, um pouco da história da América, a Recessão, a Segunda Guerra Mundial, os anos 70 e 80.

O livro está cheio de frases feitas, de expressões idiomáticas e, embora não conheça o texto original, parece-me competente, a tradução de José Vieira de Lima.

“Crónicas de Uma Pequena Ilha”, de Bill Bryson

cronicaspequenailha.jpg“Notes From a Small Island” foi publicado em 1995 e os ingleses não devem ter ficado muito satisfeitos com o título que Bryson escolheu; no entanto, comparando com a Austrália, a Inglaterra não passa de uma pequena ilha.

Como é habitual, a leitura destas crónicas de Bryson é muito divertida e escolhi alguns nacos, quase ao acaso.

Sobre a passividade e a paciência dos ingleses:

“Sempre achei lamentável – de um ponto de vista global – que uma experiência tão importante, no que diz respeito í  organização de uma sociedade, fosse calhar ao povo russo quando afinal o povo britânico teria lidado com ela muito melhor. Tudo aquilo que é necessário para levar a cabo um sistema socialista rigoroso é algo que, afinal, faz parte do instinto do povo britânico. Para começar, gostam de passar por privações. São bons a trabalhar em união face a uma situação adversa, em benefício de um bem comum como é evidente. São capazes de se manter em filas durante tempo indeterminado, de forma paciente, e aceitar com resignação impar uma necessidade de racionamento, restrições leves e uma súbita e preocupante escassez de bens essenciais, como só alguém que já alguma vez esteve num supermercado í  procura de pão, numa tarde de sábado, poderá compreender. Sentem-se í  vontade face a burocracias sem rosto e, como a Sra. Tatcher provou, são tolerantes para com as ditaduras. Possuem um dom especial para dizerem piadas acerca da autoridade, sem a desafiarem de facto, e ficam deveras satisfeitos com a derrocada dos ricos e dos poderosos. A partir dos 25 anos, a maioria dos britânicos veste-se como os alemães da parte leste. Em resumo, as circunstâncias são todas a favor.”

Sobre o grande amor dos britânicos pelos animais: 

“Não existe nada que me faça sentir mais inadaptado na Grã-Bretanha do que a atitude dos seus habitantes para com os animais, í  excepção da crença inabalável que possuem em relação í s previsões climatéricas e o gosto geral por piadas que envolvam a palavra «bottom». Sabiam que a National Society for the Prevention of Cruelty to Children foi fundada 60 anos depois da Royal Society for Prevention of Cruelty to Animals, e como uma derivação desta? E sabiam que, em 1994, a Grã-Bretanha votou a favor de uma directiva da União Europeia que requeria a fixação de períodos de descanso para os animais de carga, mas contra a que estabelecia períodos de descanso para trabalhadores das fábricas?”

Sobre a imprevisibilidade do clima, na Inglaterra: 

“Tenho um pequeno recorte, já um bocado velho, que trago comigo e do qual me sirvo, í s vezes, para me divertir. Foi tirado de um boletim meteorológico que vinha no Western Daily Mail e diz: «previsão: tempo seco e quente, mas mais fresco e com alguma chuva».”

Sobre a cultura geral dos ingleses:

“Ao fim e ao cabo, é um país onde a grande final de um programa como Mastermind é frequentemente ganha por motoristas de táxis e guarda-freios. Nunca cheguei í  conclusão se isto é impressionante ou assustador – se é um país onde os maquinistas conhecem Tintoretto e Leibniz, ou um país onde as pessoas que conhecem Tintoretto e Leibniz acabam como maquinistas.”

São quase 350 páginas de devaneios de um americano, passeando por Inglaterra, tomando nota das idiossincrasias dessa pequena grande ilha, sempre com muito humor. E ficamos a saber que, afinal, não é só em Portugal que os patos-bravos dão cabo das cidades, construindo monstros de vários andares e descaracterizando as cidades do interior.

“Este País Não É Para Velhos”, de Cormac McCarthy

estepais.jpgDecidi ler o livro antes de ver o filme. Quando vejo o filme primeiro, fico com pouca vontade de ler o livro. Regra geral.

Gostei muito do outro livro que li de McCarthy, “A Estrada”. Considerei-o, mesmo, um dos melhores livros dos últimos tempos. Por isso, fiquei um pouco desiludido com este “No Country For Old Men”, publicado em 2005.

É um livro árido, com uma história muito simples, violência a rodos e um xerife que gosta de filosofar. Há páginas inteiras de diálogos, aparentemente desnecessários, fazendo lembrar os diálogos de “Pulp Fiction”

Exemplo:

“Arrombas cofres, é?
Se eu arrombo cofres?
Isso.
Como é que essa ideia te passou pela cabeça?
Não sei. És um arrombador de cofres ou não?
Não.
Bom, alguma coisa tens de ser. Certo?
Toda a gente é alguma coisa.
Alguma vez estiveste na Califórnia?
Sim. Já estive na Califórnia. Tenho um irmão a viver lá.
E ele gosta daquilo?
Não sei. Vive lá.
Mas tu não eras capaz de lá viver, pois não?
Não.
Achas que é para lá que eu devo ir?”

E assim sucessivamente. Gosto destes diálogos mas, í s tantas, farta um bocado. Outra técnica que McCarthy usa e abusa, neste livro, é a da utilização da conjunção copulativa.

Exemplo:

“Pí´s a mão em concha e varreu o troco de cima do balcão para a palma da outra mão e guardou as moedas no bolso e deu meia volta e dirigiu-se para a porta.”

Até parece que McCarthy estava já a pensar no argumento para um filme…

“Extremamente Alto e Incrivelmente Perto”, de Jonathan Safran Foer

extremamente.jpgOskar Schell tem 9 anos e é inventor: todas as noites, antes de adormecer, inventa as coisas mais mirabolantes, como ambulâncias com tecto transparente para podermos ver quem vai lá dentro; também anda a ensaiar uma obra de Shakespear; para além disso, faz jóias, toca tamborim, fala francês e é pacifista.

Oskar perdeu o pai, que morreu no ataque terrorista de 11 de Setembro. O miúdo chegou a casa e tinha várias mensagens do pai no atendedor de chamadas. O pai garantia que estava tudo bem. Até que deixou de telefonar. Oskar ainda não aceitou a morte do pai. Por isso, custa-lhe adormecer e passa a noite, deitado, a inventar coisas.

Oskar tem um aví´ que deixou de falar há décadas. Em vez de falar, escreve num caderno. Mas Oskar só o vai conhecer quase no fim da história. Primeiro, terá que calcorrear Nova Iorque, em busca de pessoas com apelido Black e que poderão saber mais alguma coisa sobre a morte do seu pai.

“Extremely Loud and Incredibly Close” é um dos melhores livros que li nos últimos tempos. Comovente e brilhante. Cheio de ideias novas, mesmo na apresentação da narrativa (fotos que ilustram o texto, números em vez de letras, páginas em branco, outras com uma única palavra). O autor é um puto nascido em 1977 e este é já o seu segundo romance. Estou cheio de vontade de ler o primeiro, intitulado “Está tudo iluminado”.