í“ Núncio, mostra lá a lista!

O assunto desta semana foi a lista VIP do fisco.

Para quem andou distraído com as declarações do Ricardo Salgado, os habeas corpus do Sócrates ou optimismo do Cavaco, recordo que os Sindicatos bufaram que existe uma lista de contribuintes VIP; se os funcionários do fisco consultarem os dados fiscais dos tipos que fazem parte dessa lista, toca uma campainha algures, e são apanhados.

Supõe-se que, dessa lista, fariam parte o presidente, o primeiro-ministro e outras figuras de topo.

Segundo os Sindicatos, o secretário de Estado Paulo Núncio seria o responsável pela lista.

Núncio desmentiu.

Passos Coelho disse que mantinha a sua confiança no secretário de Estado.

A ministra das Finanças, superiora hierárquica de Núncio, não se pronuncia porque anda toda contentinha porque tem os cofres cheios!

O director-geral da Autoridade Tributária demite-se e diz que ele é que tem a culpa de tudo mas a Oposição exige a demissão de Núncio.

No Parlamento, Núncio diz que não se demite, não sabia de nada e é “visceralmente contra” a lista.

Estamos, portanto, ao nível das vísceras.

Mas como é que Núncio pode estar contra uma coisa que, pelos vistos, não existe?

E, se existisse, sinceramente, qual era o problema?

Agora, que sabemos, graças í  Maria Luís, que temos os cofres cheios de dinheiro, nada mais interessa!

Núncio: se fosse a ti, pegava na lista e pespegava com ela nos jornais todos amanhã de manhã.

Depois, pegava na Maria Luís e nos cofres cheios de dinheiro, e pirava-me para um paraíso fiscal qualquer.

Mandavas o Ricardo Salgado, o Henrique Granadeiro e o Zeinal Bava irem ter contigo, pagavas a um comando para vir libertar o Sócrates e fundavas uma República Portuguesa no exílio.

O Varoufakis ia-se roer de inveja!…

62 anos

 

E, de repente, estás com 62 anos!

Pela frente, na melhor das hipóteses, só viverás mais um terço do tempo que já viveste.

Tens que aproveitar o tempo, pá!…

Já passou a instrução primária na Escola do Mestre André, os nascimento do teu irmão Paulo e da tua irmã Bela, o périplo pelos liceus, o Camões, o D. João de Castro e o Passos Manuel,  o curso de Medicina no Hospital de Santa Maria, a Mila, tua companheira de sempre, que continua a teu lado, o teu filho Pedro, a tua filha Marta, a morte da tua mãe, os textos para o jornal República, o jornalismo na RTP e no Jornal de Notícias, as colaborações na Gazeta da Semana, no Pé de Cabra, no Bisnau, no Coiso, os textos para a rádio no Pão Com Manteiga, Programa da Manhã, Contra-Ataque, Uma Vez por Semana, os Intocáveis, as crónicas do Solnado, os programas de tv, a Quinta do Dois, o 1,2,3, a Zona Mais, o Lá em Casa tudo Bem, a morte do teu pai, a Saúde Pública em Moimenta da Beira e em Armamar, o Serviço Médico í  Periferia, em Mourão, o odioso Serviço Militar Obrigatório, em Évora, o exame de entrada na especialidade, os três anos em Psiquiatria, no Miguel Bombarda, os 30 anos de Medicina Geral e Familiar no Monte de Caparica, o teu primeiro neto, Alexandre, de vida breve, o teu neto Tiago, as tuas netas Joana, Ema e, há pouco, a Clara.

Fizeste móveis, pintaste paredes e tectos, encadernaste livros, montaste torneiras, estucaste paredes, semeaste alfaces e batatas e feijão verde, leste centenas de livros, aprendeste a tocar guitarra, ouviste milhões de músicas, viste milhares de filmes, fizeste fotografias quase todos os dias.

Continuas a trabalhar mais de 40 horas por semana, todos os dias a consultar mais de 20 pessoas, fazes cerca de 40 km de bicicleta todas as semanas e só não fazes mais porque a crise impediu que te reformasses este ano!

Publicaste três livros de histórias pouco clínicas, fizeste dois filhos e plantastes muitas árvores no teu quintal do Algueirão, sempre com a tua companheira, já puseste o pé em mais de 40 países nos cinco continentes, viajaste de carro, avião, comboio, barco, piroga, teleférico, helicóptero, mota, autocarro, avioneta, 4×4, cavalo, carroça, deste uma volta ao mundo, comeste cascavel no far-west, crocodilo no Quénia e salmão, enquanto vias o sol í  meia-noite.

Tiveste a possibilidade de ver os teus filhos crescerem e transformarem-se em cidadãos inteiros, um designer e uma psicóloga, viste-os formarem as suas próprias famílias e terem os seus filhos, que são os teus netos ““ o teu ADN vai continuar por aí quando te fores embora.

Podes morrer em paz ““ mas ainda não, porra!

Parabéns, pá

 

Cavaco forever!

Finalmente, Cavaco Silva fez-nos o favor de traçar o perfil do seu sucessor (confirmar aqui).

Ficamos assim a saber que, quem quiser suceder a Cavaco como presidente dos portugueses:

a) Não deve ter e muito menos emitir opiniões pessoais sobre:

– Falcatruas, desfalques, roubos ou qualquer outro fenómeno relacionado com bancos como o BPN, BPP, BES ou qualquer outro, nacional ou estrangeiro, pequeno ou grande;

– Prisão de anteriores primeiros-ministros, secretários de Estado, subsecretários ou mesmo directores-gerais;

– Burlas com vistos gold, silver ou mesmo latão;

– Fugas ao fisco ou a Segurança Social perpetradas por actuais ou antigos primeiros-ministros;

– Luvas obtidas com negócios que envolvam submarinos, blindados, tanques de guerra ou mesmo tanques de lavar roupa;

b) Por outro lado, o futuro presidente deve ter larga experiência em política externa e, tal como Cavaco:

– Exercer intensa actividade diplomática na guerra da Ucrânia;

– Trabalhar para a reunificação das Coreias;

– Continuar o esforço para o combate ao terrorismo, nomeadamente no que respeita ao Estado Islâmico;

– Mediar os conflitos no Mali, Sara Ocidental, Eritreia e Iémen;

– Manter na ordem o eixo franco-germano.

Em resumo: quem melhor que o próprio Cavaco pode suceder-lhe?

Sendo assim, é urgente propor um referendo nacional que permita mudar a Constituição, permitindo que Cavaco tenha um terceiro mandato!

Um primeiro-ministro que bebe laranjada

Vi hoje, num telejornal: Passos Coelho, num almoço qualquer, a beber laranjada, daquela ranhosa, tipo marca branca do Minipreço.

Ora, o que se pode esperar de um primeiro-ministro que bebe laranjada ao almoço?

Mas também não é razão para o crucificarmos só porque ele não “tinha noção” que era preciso contribuir para a Segurança Social.

Afinal, os funcionários da TAP não têm direito a viagens í  borla?

E os funcionários dos transportes públicos por acaso pagam bilhete?

Sendo assim, Passos Coelho, que inventa os impostos, devia estar isento de os pagar.

Lógico.

Ao fim e ao cabo, Passos faz o que qualquer português tenta fazer: fugir aos impostos.

Quem nunca recusou factura para não pagar IVA, por exemplo, que atire a primeira pedra ao primeiro-ministro.

Aliás, em qualquer caso, atirem a pedra.

Muitas.

Afinal, Passos Coelho não é perfeito!

Foi um balde de água fria!

Afinal, o nosso primeiro-ministro não é perfeito!

Vive em Massamá, viaja em executiva, não favorece os amigos e não enriquece com a política, mas não é perfeito.

E porquê?

Porque não sabia que tinha que descontar para a Segurança Social e porque estacionou mal o carro algumas vezes.

Parece que também se esqueceu de qualquer coisa relacionada com o IRS, além de ter pedido exclusividade como deputado quando, afinal, trabalhava para a Tecnoforma.

Em resumo: o homem tem defeitos!

Mas como ele muito bem disse, não se aproveitou do cargo para favorecer amigalhaços, como fez o Outro.

Claro que o Outro esperneou e lá dos confins da terra da Florbela Espanca, enviou uma cartinha, onde diz que “o primeiro-ministro está próximo da miséria moral”.

í“ Sócrates, que falta de imaginação!

Então com os cortes, a crise, o défice e a dívida, querias que o Coelho tivesse uma moral rica?

Pois se o homem garantiu que não enriqueceu!

Títulos

22/2

* “Primeira governadora bissexual quer acabar com corrupção”

E é preciso ser bissexual para isso?

* “Imprensa alemã diz que Maria Luís pediu dureza a Schauble”

Dureza, ao ministro das Finanças alemão?…
Nem com Viagra!…

23/2

* “Rabejador de ouro é dos forcados de Vila Franca”

Rabejador de ouro?
Não me lixem!…

* Nani chorou depois de marcar um golo.

Está explicado porque permite que lhe continuem a chamar Nani…

* “Ex-espião pediu levantamento de segredo de Estado”

Claro que este gajo só podia ser português (e foi para espião porque não sabia fazer mais nada…)

26/2

* “Comerciantes apoiam venda de remédios em bares e quiosques”

– Olhe, por favor, um whisky duplo e um Ben-u-Ron, por favor.
– Para mim, um gin tónico e dois Kompensan…

* “Belmiro e Soares dos Santos juntos í  procura de jovens talentosos”

… merceeiros libidinosos…

“O Sentido do Fim”, de Julian Barnes (2011)

barnesVencedor do Man Booker de 2011, Julian Barnes tem uma escrita sóbria e perfeita.

The Sense of an Ending, escrito na ressaca da morte da sua companheira, a agente literária Pat Kavanagh, conta-nos a história de Tony Webster que, já reformado, tem conhecimento do suicídio de um amigo da juventude e que este lhe teria deixado, em testamento, um diário.

Para o obter, Webster tem que entrar em contacto com uma antiga namorada e todo esse processo o faz recordar momentos do passado.

Nascido em 1946, Barnes, falando pela voz do personagem, diz coisas que me são muito familiares, nomeadamente no que diz respeito aos grupinhos de rapazes do Liceu e í s suas conquistas amorosas mais ou menos frustradas.

A propósito do ultrapassado conceito de “andar” com uma rapariga:

“…erasentido do fim isto que costumava acontecer: conhecíamos uma rapariga, sentíamo-nos atraídos por ela, tentávamos cativá-la, convidávamo-la para um ou dois eventos sociais – o pub, por exemplo – depois convidávamo-la para sair a sós, convidávamo-la de novo e, após um beijo de boas noites de intensidade variável passávamos, por assim dizer, “a andar” com ela. Só quando estávamos pratica e publicamente comprometidos, é que descobríamos a política sexual dela. E por vezes isso significava que o corpo dela era tão estrito e reservado como uma zona de pesca exclusiva.”

E isto era mesmo assim porque, como também diz o protagonista do livro, estávamos nos anos 60, sim senhor, mas esses anos não foram iguais em toda a parte, nem para toda a gente.

Sentindo-se já um pouco decadente, Tony Webster também projecta o seu futuro, desta maneira:

“Ser velho, estar no hospital e ter enfermeiras que nunca vi a chamarem-me Anthony, ou pior, Tony. Deixa-me espetar-te isto no braço, Tony. Toma mais papa, Tony. Evacuaste, Tony? Claro que, quando isso acontecer, a excessiva familiaridade do pessoal de enfermagem deverá estar no fim da minha lista de preocupações; mas ainda assim.”

O tempo, a passagem do tempo, é um dos cernes deste livro, e Barnes resume isso muito bem neste período:

“Mas o tempo… o tempo primeiro fixa-nos e depois confunde-nos. Pensávamos que estávamos a ser adultos quando estávamos só a ser prudentes. Imaginávamos que estávamos a ser responsáveis, mas estávamos só a ser cobardes. Aquilo a que chamávamos realismo acabava por ser uma maneira de evitar as coisas e não de as enfrentar. Tempo… deem-nos tempo suficiente e as nossas decisões mais fundamentadas parecerão instáveis e as nossas certezas, bizarras.”

Com tradução de Helena Cardoso e edição Quetzal, eis um livro que recomendo vivamente.

Outras obras de Julian Barnes Arthur & George (2005) e Amor & Etc (2000)