“Don’t worry, he wont get far on foot”, de Gus Van Sant (2018)

John Callahan (1951-2010) foi um cartunista norte-americano, sarcástico, politicamente incorrecto, que, devido ao seu alcoolismo, sofreu um acidente de viação que o deixou tetraplégico aos 21 anos.

—Preso a uma cadeira de rodas, continuou a beber durante anos, até conseguir, graças ao clássico programa dos alcoólicos anónimos e í  ajuda de uma espécie de guru, deixar o álcool e começar a desenhar.

Os seus cartoons são sarcásticos e altamente provocadores; num deles, um pedinte de raça negra e cego, estende o chapéu, pedindo trocos, dizendo “sou cego e negro e não tenho jeito para a música, ajude-me!”

Joaquin Phoenix é um excelente actor e faz um tetraplégico convincente e Gus Van Sant dirige o filme de forma escorreita.

Sabe bem ver uma história bem contada, sem rodriguinhos, nem “modernices”.

Gostei!

E foi o nosso primeiro filme com bilhetes sénior!

Bigre – mélo burlesque

Assistimos ontem ao espectáculo de abertura do 35º Festival de Teatro de Almada.

“Bigre – mélo burlesque”, é um espectáculo da Compagnie Le Fils du Grand Réseau (Brest/França), da autoria de Pierre Guillois, com a ajuda de Agathe L’Huiller e Olivier Martin-Salvan.

Em 2017, este espectáculo ganhou o prémio Moliére para Melhor Comédia e foi votada como o melhor espectáculo no 34º Festival de Almada, razão pela qual tivemos direito a mais uma representação.

Foi ontem, no palco grande da Escola António da Costa e já não me ria tanto há muito tempo.

No palco, três águas furtadas contíguas. Na primeira, vive um adepto das novas tecnologias, obcecado pela limpeza, na segunda, um acumulador de tralha que dorme numa rede e estende roupa numa corda improvisada, que implica com o candeeiro, e na terceira, uma inquilina desastrada, dada a biscates.

Os três vão protagonizar uma série de gags, qual deles o mais cómico.

Descrevê-los é impossível.

Parece incrível como é possível, ao vivo, e em directo, conseguir todos aqueles “efeitos especiais”, graças a um excelente trabalho de bastidores, a uma banda sonora óptima e um jogo de luzes impecável – porque não há texto, vivendo a acção disso mesmo, da acção dos três protagonistas, cujos nomes são: Bruno Fleury, Eleonore Auzou-Connes e Jonathan Pinto-Rocha.

Cinco estrelas.

O youtube tem pedaços do espectáculo, que vale a pena espreitar…

https://ctalmada.pt/bigre-melo-burlesque/

A maravilhosa biodiversidade de Portugal

O semanário Sol, na sua edição de hoje, publica um artigo em que é sublinhada a biodiversidade do nosso país.

Diz o texto que, “de Norte a Sul foram descobertas, só nos últimos dez anos, 118 espécies, entre moscas, aranhas, escaravelhos, peixes, aves e fungos”.

E acrescenta que “Portugal faz parte daquilo a que os cientistas internacionais chamam de hotspot de biodiversidade mediterrânico, uma das 34 áreas com maior riqueza biológica do mundo”.

Este ano, por exemplo, “foi descoberta, na Serra de Monchique, no Algarve, uma nova espécie de mosca – a colaspidea algarvensis, com reflexos dourados.

É, de facto, um fenómeno assinalável, sobretudo sabendo-se que a maioria destas espécies só existe no nosso país.

Mas a jornalista esqueceu-se de outra espécie, tipicamente portuguesa, descoberta há poucos anos: a dos banqueirus corruptus.

Tudo começou com a descoberta de um exemplar de Jardinis Gonçalvus, continuou com o excelente Joanus Rendeirus e o mirabolante Oliveirae Costarum e culminou no exemplar-mor da espécie: Ricardus Salgadus.

É de facto maravilhosa, a nossa biodiversidade!…

 

Forbrydelsen, 3ª temporada

Forbrydelsen é uma série televisiva dinamarquesa, criada por Soren Sveistrup e que já vai na 4ª temporada.

forbrydelsenA 3ª temporada passou recentemente no AXN Black, gravei-a e tenho estado a ver, í  velocidade de um episódio por noite, para fazer render o peixe, porque a vontade é ver os episódios todos de seguida.

Nunca pensei que pudesse gostar de uma série policial dinamarquesa, depois de todas as séries norte-americanas que já papei.

A principal personagem é uma desconcertante Sarah Lund (interpretada por Sofie Grabol), inspectora da polícia de Copenhaga; desconcertante porque é a perfeita anti-heroína. Surge sempre com os cabelos desgrenhados, sem maquilhagem, de jeans e faz os dez episódios da temporada com duas ou três camisolas de lã. Tem uma vida particular destroçada, mora num apartamento minúsculo, desarrumado, desconfortável, escuro e quase sem mobília. Acho que nunca a vi rir.

As histórias de Forbrydelsen são complexas, envolvendo, para além de assassínios e/ou raptos e/ou violações, uma intrincada teia política com relações também complicadas com empresas e empresários.

Num momento em que o Cavaco se farta de apelar ao compromisso entre os principais partidos políticos, dando, como exemplo, a maior parte das democracias europeias, é curioso ver, neste série, como é que os três ou quatro principais partidos dinamarqueses se chantageiam, subornam, aldrabam, para conseguir alianças pré e post-eleitorais. E como são perigosas as relações entre alguns elementos desses partidos e os grandes empresários e como, por vezes, as suas acções roçam a criminalidade.

Para complicar tudo isto, as tensão sociais também são abordadas pela série, com inclusão, por exemplo, do fenómeno da imigração.

Sarah Lund move-se no meio desta teia complicada com aparente dificuldade; não se socorre de alta tecnologia, tipo CSI, para chegar onde quer. Vai andando, de pista em pista, socorrendo-se da sua intuição e de ser capaz de estar atenta a pequenos pormenores que passam despercebidos a outros.

Aconselho.

“Blue Jasmine”, de Woody Allen

A tradição ainda é o que era: nas minhas férias há sempre um novo filme de Woody Allen para ver.

blue jasmineDepois de um período menos bom (não gostei muito da “fase Barcelona” de Allen), o realizador parece que reencontrou a sua verve e os últimos filmes têm estado í  altura do seu status (Midnight in Paris, 2011 e To Rome With Love, 2012).

Este Blue Jasmine também é um bom filme.

Woody Allen mantém-se atrás das câmaras (disse que, se fosse o protagonista, o filme passaria a ser uma comédia) e Cate Blanchett domina todo o filme, fazendo o papel de uma mulher da alta sociedade de Nova Iorque, cujo marido (Alec Baldwin) dirige negócios especulativos, que permitem, ao casal, levar uma vida de fausto.

Entretanto, as fraudes são expostas, o marido é preso e, na prisão, suicida-se e Jasmine vai viver para San Francisco, para casa da sua irmã (Sally Hawkins), uma simples empregada de supermercado.

Jasmine não está habituada a viver numa casa tão modesta, tem que aturar o  bronco do namorado da irmã (Bobby Cannavale), vai ter de arranjar um emprego e tirar um curso de computadores.

Sempre í  beira de um ataque de pânico, recorrendo constantemente ao Xanax, Jasmine não consegue deixar de ser quem era.

Hora e meia bem passada.

“Forbrydelsen” e “Life”

Nos últimos tempos assisti a duas séries televisivas, policiais, que me deixaram ficam boas recordações.

forbrydelsenFalo da dinamarquesa Forbrydelsen e da norte-americana Life.

Forbrydelsen (que tem uma versão norte-americana, chamada The Killing), tem três temporadas. Vi as duas primeiras, de 2007 e 2009. Gostei mais da primeira.

A protagonista da série é uma detective, Sarah Lund (interpretada por Sophie Grabol), cuja vida pessoal é um caos, com um filho adolescente que a enfrenta, um namorado que acaba por se fartar com as suas ausências e uma mãe que não compreende a sua obsessão pelo trabalho.

Surpreendi-me como fiquei viciado numa série que é o oposto das séries norte-americanas.

A primeira temporada, sobretudo, tem um ritmo narrativo, digamos, nórdico… são 20 episódios para resolver um único caso! Está sempre frio, ou chuva, ou ambos, os cenários são lúgubres, os interiores são tristes e pouco decorados, quase ninguém se ri, o ambiente é sempre negro.

A segunda temporada não é tão bem conseguida, mas também merece ser vista.

lifeA outra série chama-se Life e teve duas temporadas, entre 2007 e 2009 e é pena que tenha acabado.

Aqui, o protagonista é o detective Charlie Crews (interpretado por Damian Lewis, o sargento Brody de Homeland).

Crews esteve preso 12 anos por um crime que não cometeu. Libertado, recebeu uma bela indemnização e regressou ao seu trabalho de detective em LA, disposto a descobrir quem o tramou. Tem umas ideias zen, gosta de fruta e de carros potentes e, no fim, mata o bandido e fica com a miúda.

Os meus filhos ofereceram-me as duas temporadas desta série há uns anos e estava ali na prateleira a apanhar pó. Em boa hora fui buscar os dvd, porque a série é bem divertida; ao contrário da série dinamarquesa, aqui os cenários são luxuosos, os dias são luminosos, há até um exagero na cor, um pouco ao estilo do CSI Miami. Cada episódio é um caso, sempre com assassínios bizarros, mas há sempre o fio condutor protagonizado por Crews, em busca de quem o tramou.

Duas boas sugestões para quem gosta de policiais.

“Ferrugem Americana”, de Phillipp Meyer (2009)

ferrugem americanaNuma das badanas do livro, pode ler-se: «Ferrugem Americana tem o carimbo de Grande Romance Americano em toda a parte. Pode dizer-se que foi beber a Ratos e Homens, Huckleberry Finn, Cormac McCarthy, Salinger e Kerouac.» (The Daily Telegraph).

E isto resume a atmosfera deste romance. Meyer conta-nos as histórias de meia-dúzia de personagens trágicas, perdidas na imensidão do continente americano, numa região, a Pensilvânia, devastada pela crise económica e pelo fecho de várias fábricas, pelo desemprego, pela desilusão. O contrário do american dream.

As personagens principais são Isaac e Poe, dois jovens adultos sem nada que fazer e sem perspectivas de futuro. A mãe de Isaac suicidou-se há pouco tempo, o pai, desloca-se numa cadeira de rodas, devido a um acidente de trabalho e a irmã, mais velha, saiu de casa, foi estudar para Yale e casou-se com um tipo rico. Poe foi jogador de futebol americano, mas agora não faz nada e vive numa roulote com a mãe, Grace.

Isaac decide partir para a Califórnia e Poe acompanha-o mas, logo na primeira noite, ao pernoitarem num armazém abandonado, são surpreendidos por três calmeirões, que os querem roubar. Da confusão que se gera, resulta a morte de um dos bandidos. É Isaac que o mata, mas é Poe que assume as culpas e vai para a prisão.

Na história entra, também, Harris, um xerife desiludido e solteirão, que dorme ocasionalmente com Grace.

A narrativa de American Rust vai avançando em capítulos curtos, cada um deles dedicado a cada uma das personagens.

E não há dúvida que é uma história tipicamente americana, que poderá dar um bom argumento cinematográfico.

PhilippmeyerPhillipp Meyer nasceu em Baltimore, em 1974, desistiu da escola aos 16 anos, trabalhou como mecânico de bicicletas e aos 20 anos, decidiu que queria ser escritor, candidatando-se í  Universidade de Cornell, onde se graduou em inglês.

Depois, trabalhou na bolsa, em Wall Street e como técnico de emergência médica. Em 2005, conseguiu um lugar na Universidade de Austin, onde escreveu Ferrugem Americana, o seu primeiro romance, que ganhou o prémio literário dos Los Angeles Times, em 2009.

Lançou agora o seu segundo livro, The Son, e vive entre Austin, Texas e Nova Iorque.

“Silver Linings Playbook”, de David O. Russell (2012)

Pat Solatano (Bradley Cooper) é um professor de História substituto. Certo dia chega a casa e apanha a mulher a trocar carícias com outro professor de História sénior, no duche.

silver liningsPat é bipolar e a visão daquela cena provoca-lhe uma crise de fúria. Espanca o amante da mulher e é internado numa instituição psiquiátrica.

Quando regressa a casa, ainda obcecado pela mulher, conhece Tiffany (Jennifer Lawrence), uma recente viúva de um polícia, que anda em fase ninfomaníaca.

Depois de avanços e recuos, Tiffany consegue convencer Pat a participarem num concurso de dança.

Lá em casa, Pat tem o apoio incondicional da mãe, figura apagada, e a contestação do pai (Robert De Niro), que sofre de doença obsessiva-compulsiva.

Em português, o filme chama-se “Guia para um Final Feliz”, portanto, sabemos que o filme vai ter um “happy ending”, ou um “silver lining”. E assim é.

O filme é um pouco “cromaço”, com cenas para puxar a lágrima e grande beijo final, com a câmara a rodar em volta dos protagonistas, mas é divertido e Jennifer Lawrence merece o óscar. E De Niro, claro, é um obsessivo compulsivo muito divertido e convincente.

Parece que os críticos, por cá, acharam o filme um pouco convencional e cheio de lugares-comuns.

Pior para eles – eu diverti-me!

“Life of Pi”, de Ang Lee (2012)

vida de piLi este livro de Yann Martel em 2003 e gostei.

Uma história que pode ser lida de várias maneiras: uma aventura extraordinária, um sonho maravilhoso, uma parábola da passagem para a idade adulta.

De qualquer modo, uma grande história – a história de um jovem, filho do dono de um Zoo na Índia, que emigra para o Canadá, com a família e com todos os animais do Zoo.

Acontece o naufrágio e o jovem sobrevive num salva-vidas, com uma zebra, uma hiena, um orangotango e o tigre Richard Parker.

Acho que a adaptação ao cinema é notável.

Ang Lee ganhou o óscar pela realização e o filme ganhou outro óscar pelos efeitos visuais que, de facto, são muito bons.

Duas horas de bom entretenimento.