“A Barata”, de Ian McEwan (2019)

Lê-se de uma penada (tem pouco mais de 100 páginas e o livro tem formato pequeno) e é uma brincadeira com alguma graça.

Ian McEwan não gosta do Brexit, acha que é uma ideia estúpida e decidiu contribuir, à sua maneira, para a discussão.

Socorreu-se de Kafka e da sua Metamorfose e usou-a ao contrário: uma barata deambula por Londres e entra no 10 de Downing Street. Quando acorda, é o primeiro ministro do Reino Unido. Demora um pouco a habituar-se a ter apenas quatro membros e a ter uma língua dentro da boca, mas depressa se adapta e começa logo a ter ideias.

Quando chega ao Conselho de Ministros desse dia, descobre que todos os ministros, menos o dos Negócios Estrangeiros, são baratas que sofreram a metamorfose. E põe em marcha o seu plano: instituir o regressismo.

Se o brexit é uma estupidez e vai ser implementado, porque não o regressismo, que consiste em inverter o fluxo do dinheiro: os trabalhadores pagam para trabalhar e recebem dinheiro quando vão às compras.

Claro que este primeiro ministro-barata é Boris Johnson, assim como Archie Tupper, o presidente norte-americano, é Donald Trump – mas isso nunca é referido, obviamente.

Custa só 11 euros e ajuda a passar uma parte da tarde divertida

(Editora Gradiva, tradução de Maria do Carmo Figueira)

Bifexit

Em Junho de 2016, os britânicos votaram a favor da saída da União Europeia.

A esse movimento original – já que foi a primeira nação a querer sair da UE – decidiram chamar Brexit. Os anglo-saxónicos sempre tiveram jeito para dar nomes às coisas.

Estamos em março de 2019, quase três anos depois do referendo, e os ingleses não conseguem sair da União Europeia.

Em vez de Brexit temos Britstuck.

Os ingleses sempre deram ares de emproados, com a sua monarquia, a sua moeda própria, as suas séries da BBC. Nunca gostaram muito de misturas com os europeus do continente e, na verdade, nunca se sentiram como fazendo parte da Europa.

A Grã-Bretanha sempre teve a mania das grandezas, até pelo nome. Enquanto o palerma do Trump “wants to make America great again”, a Britain sempre foi Great, ao contrário da Bretanha francesa que, por oposição, tem que ser pequena.

No entanto, tirando o Churchill, a Diana e os Beatles, poucos mais nomes sabemos de cor. Todos os outros, são irlandeses (Samuel Beckett, Oscar Wilde, James Joyce, Bernard Shaw…)

Aqui, em Portugal, era costume apelidarmos os ingleses de “bifes”, talvez porque preferissem carne, em vez de peixe – o que não deixa de ser curioso, já que, vivendo numa ilha, seria natural que gostassem mais de peixe.

Mas essa particularidade já demonstrava uma certa bizarria no comportamento – consubstanciada agora com esta dificuldade em sair de um sítio onde nunca quiseram estar.

A pobre da Theresa May já se submeteu a três votações naquele parlamento que nem lugar tem para todos os deputados, e quye é liderado por um tipo que grita “ORDER!” e usa gravatas ridícdulas, e perdeu sempre.

Conseguiu, agora, que a UE prolongasse o prazo da saída por mais um mês, mas o resultado vai ser o mesmo: os deputados britânicos querem sai da Europa, mas não querem sair da Europa.

É pena os Monty Python já estarem reformados… quantos  sketchs fariam eles à conta deste Bifexit!…

Para inglês ver…

A União Europeia sempre foi para inglês ver.

Puritanos, os ingleses da Old England sempre desprezaram os que viviam à grande e à francesa.

Aderiram à CEE por puro spleen, porque não tinham mais nada para fazer.

Sempre desdenharam.

Diz-se que quem desdenha, quer comprar, mas os ingleses queriam, sobretudo, vender.

Agora, querem regressar ao velho British Empire, como se ainda mandassem na Índia e na África do Sul e continuasse a ser rule Britannia, Britannia rules the waves.

Faz lembrar o Angola é nossa

Claro que Marcelo Rebelo de Sousa, o Presidente de todos os Presidentes, já emitiu a sua opinião.

No final do jogo contra a Hungria, Marcelo estabeleceu novas regras: no final dos jogos da selecção, os jornalistas têm que ouvir o seleccionador, um jogador de campo e o Presidente da República.

Marcelo tem sempre um opinião a emitir.

O que é que isto tem a ver com o Brexit?

Tudo!

Com a saída do Reino Unido, as quatro equipas nacionais britânicas vão passar a participar nos campeonatos da Commonwealth e deixamos de nos preocupar com a Inglaterra, o País de Gales e a Irlanda do Norte.

Resta a Escócia, que votou a favor do Remain e que merece todo o nosso amor.

I love scotch, if you know what I mean...

marcelo brexit

Vantagens de ser polícia em Inglaterra

O secretário de Estado do Interior britânico, Nick Herbert esclareceu: se, para o bom andamento de uma investigação, um polícia infiltrado tiver que dar uma queca, assim seja!

Ultimamente, tem havido, no Reino Unido, alguma polémica à volta da interpretação a dar à lei sobre os poderes e limitações das investigações, a qual permite aos agentes infiltrados, infiltrarem-se ainda mais e terem relações sexuais como parte do trabalho.

Assim sendo, os investigadores infiltrados serão a segunda profissão a ganhar dinheiro para darem quecas!

Toda esta polémica foi desencadeada por um tal Mark Kennedy, um polícia undercover que teve relações sexuais com duas activistas ambientais, durante uma investigação…

Logo duas activistas, Mark?

Não terá sido excesso de zelo, pá?

Acrescente-se que a lei é conhecida como Regulation of Investigatory Powers Act 2000 – também conhecida como RIPA.

É caso para citar o outro e exclamar: RIPA na rapaqueca!

A ausência de Salman bin Hamad al-Khalifa

O DN informa que o príncipe herdeiro do Bahrein, não estará presente no casamento real de William e Kate.

Salman, para os amigos, esclareceu que, devido à agitação social que se vive no seu país, prefere não se deslocar a Inglaterra para assistir à cerimónia.

E?…

E nada!

A comunicação social portuguesa enche páginas e tempos de antena com este casamento, como se ele representasse mais do que isso mesmo – um casamento.

Labregos!

“Crónicas de Uma Pequena Ilha”, de Bill Bryson

cronicaspequenailha.jpg“Notes From a Small Island” foi publicado em 1995 e os ingleses não devem ter ficado muito satisfeitos com o título que Bryson escolheu; no entanto, comparando com a Austrália, a Inglaterra não passa de uma pequena ilha.

Como é habitual, a leitura destas crónicas de Bryson é muito divertida e escolhi alguns nacos, quase ao acaso.

Sobre a passividade e a paciência dos ingleses:

“Sempre achei lamentável – de um ponto de vista global – que uma experiência tão importante, no que diz respeito à organização de uma sociedade, fosse calhar ao povo russo quando afinal o povo britânico teria lidado com ela muito melhor. Tudo aquilo que é necessário para levar a cabo um sistema socialista rigoroso é algo que, afinal, faz parte do instinto do povo britânico. Para começar, gostam de passar por privações. São bons a trabalhar em união face a uma situação adversa, em benefício de um bem comum como é evidente. São capazes de se manter em filas durante tempo indeterminado, de forma paciente, e aceitar com resignação impar uma necessidade de racionamento, restrições leves e uma súbita e preocupante escassez de bens essenciais, como só alguém que já alguma vez esteve num supermercado à procura de pão, numa tarde de sábado, poderá compreender. Sentem-se à vontade face a burocracias sem rosto e, como a Sra. Tatcher provou, são tolerantes para com as ditaduras. Possuem um dom especial para dizerem piadas acerca da autoridade, sem a desafiarem de facto, e ficam deveras satisfeitos com a derrocada dos ricos e dos poderosos. A partir dos 25 anos, a maioria dos britânicos veste-se como os alemães da parte leste. Em resumo, as circunstâncias são todas a favor.”

Sobre o grande amor dos britânicos pelos animais: 

“Não existe nada que me faça sentir mais inadaptado na Grã-Bretanha do que a atitude dos seus habitantes para com os animais, à excepção da crença inabalável que possuem em relação às previsões climatéricas e o gosto geral por piadas que envolvam a palavra «bottom». Sabiam que a National Society for the Prevention of Cruelty to Children foi fundada 60 anos depois da Royal Society for Prevention of Cruelty to Animals, e como uma derivação desta? E sabiam que, em 1994, a Grã-Bretanha votou a favor de uma directiva da União Europeia que requeria a fixação de períodos de descanso para os animais de carga, mas contra a que estabelecia períodos de descanso para trabalhadores das fábricas?”

Sobre a imprevisibilidade do clima, na Inglaterra: 

“Tenho um pequeno recorte, já um bocado velho, que trago comigo e do qual me sirvo, às vezes, para me divertir. Foi tirado de um boletim meteorológico que vinha no Western Daily Mail e diz: «previsão: tempo seco e quente, mas mais fresco e com alguma chuva».”

Sobre a cultura geral dos ingleses:

“Ao fim e ao cabo, é um país onde a grande final de um programa como Mastermind é frequentemente ganha por motoristas de táxis e guarda-freios. Nunca cheguei à conclusão se isto é impressionante ou assustador – se é um país onde os maquinistas conhecem Tintoretto e Leibniz, ou um país onde as pessoas que conhecem Tintoretto e Leibniz acabam como maquinistas.”

São quase 350 páginas de devaneios de um americano, passeando por Inglaterra, tomando nota das idiossincrasias dessa pequena grande ilha, sempre com muito humor. E ficamos a saber que, afinal, não é só em Portugal que os patos-bravos dão cabo das cidades, construindo monstros de vários andares e descaracterizando as cidades do interior.