“Como É Possível Ser Português?”, de Michel BJ Cartier

Nascido em 1939, em França, Cartier vive em Portugal há anos o que o fez aventurar-se a escrever esta espécie de dicionário, directamente em português.

—Não faria mal nenhum, não fosse o caso de, aqui e ali, não se perceber o que ele quer dizer. Além disso, não houve grande cuidado na revisão do texto, já que Cartier repete a mesma coisa várias vezes, em partes diferentes do livro. Por exemplo, sobre o herói de BD Tintin, esclarece que o nome do seu autor Hergé, é um pseudónimo de Georges Remi, pelo menos, em dois trechos do livro. Também refere, em três ocasiões diferentes, que a palavra “azar” provém do árabe az-zahr, que significa dado. E estes são apenas dois de muitos exemplos de repetições desnecessárias e que poderiam ter desaparecido se o texto tivesse sido revisto.

Como estrangeiro que é, Cartier sacou bem alguns vícios da nossa língua coloquial e quase que consegue ter alguma graça.

Exemplo, com a palavra “andar”:

«Deslocar-se a pé. Em outras palavras, indica e traduz a locomoção. Mas é também sinónimo de piso (Eu moro no 5º andar). e mesmo de apartamento (Visite o nosso andar modelo). Não confundir com “andor” (apesar do facto de que o mesmo não pode andar sozinho). Se alguém pode perfeitamente andar a correr, a recíproca não existe (e porque não?). Usa-se também peremptoriamente associado com “tocar” na expressão definitiva, sinónima de “E pronto!” ou “Vamos embora!”: Toca a andar! (pronunciada: tocandar). Encontra-se também em expressões curiosas e automáticas feitas principalmente pelo telefone, tais como: “Onde é que tu andas?”, ou: “O que é que tu andas a fazer?” Os pais podem também chamar a atenção do filho ou da filha, exigindo: “Anda cá!”»

Se o autor se tivesse cingido í  análise destas palavras ou frases da nossa linguagem do dia-a-dia, talvez tivesse conseguido fazer um livrinho coerente e simpático, fazendo lembrar um brilhante Elucidário de Conhecimentos Quase Inúteis (1985), de Roby Amorim, pequena publicação onde eram explicadas as origens dde algumas expressões correntes, como “ir para o maneta”.

Mas Cartier mistura muita coisa, pequenas informações linguísticas, datas históricas, citações de filósofos e escritores franceses e até referências í  actualidade política (uma das entradas, por exemplo, é TGV…)

E por vezes, parece que se perde no português, que perde o fio í  meada. Um exemplo: a propósito da palavra “dias”, espanta-se por usarmos “segunda, terça, quarta, quinta, sexta”, enquanto os ingleses e os franceses têm um nome para cada dia da semana. Mas, depois, acrescenta: «Infelizmente, os Portugueses não são os únicos originais neste aspecto: também os Gregos (apesar dos inumeráveis deuses da Antiguidade) “traduzem” os quatro primeiros dias da semana, contando por números ordinais (no feminino, como em Português), depois do Sábado (Savvato que é neutro) e do Domingo (Kuriaki, também feminino); Sexta-feira, também no feminino, se diz Paraskevi. Onde é que se encontra e exclusividade ou originalidade portuguesa? Mas, de todo o jeito e em poucas palavras: Deus seja louvado!»

Perceberam? Eu não.

E há muitos trechos destes no livro, o que é pena, porque o resultado final acaba por ser um pouco entediante.

Acrescentaria: o autor pergunta “Como é possível ser português?” e eu pergunto: “como é possível uma editora publicar um livro destes?”

Mala… quê?!

Passos Coelho inventou um novo substantivo – malabarices!

Foi na discussão do Orçamento e a propósito de cativações. Disse ele: «nós não fazemos malabarices com cativações».

Disse uma deputada do Bloco, que seria uma junção de malabarismos com aldrabices, o que me parece lógico.

Mas tudo resultou da discussão í  volta de uma almofada, que Seguro diz existir no Orçamento, e Passos garante não existir.

Problemas de cama, portanto…

—

Otelo poupa no Orçamento

Ficaram todos muito chocados quando o Otelo disse que lhe bastariam 800 homens para derrubar o governo.

O homem estava a ser poupado, caramba!

Só para despentear o ministro da Defesa, Aguiar Branco e calar o Miguel Relvas serão precisos dois exércitos!

O Otelo estava a querer poupar dinheiro aos contribuintes.

Obrigado Otelo – e não te esqueças de tomar as gotas, pá!

“Castle” – 3ª temporada

—Richard Castle (Nathan Fillion) é um escritor de livros policiais de grande êxito popular que começa a colaborar com a polícia, depois de alguns casos de homicídio se parecerem muito com os argumentos dos seus livros.

Fica adstrito a uma equipa de detectives chefiada por Kate Beckett (Stana Katic), que acaba por inspirar a Castle a personagem de Niki Heat, nova heroína dos seus romances.

Esta é a base para a série Castle, da ABC, estreada em 2009, e criada pelo argumentista Andrew W. Marlowe (nome de detective…).

Um dos atractivos da série é a tensão erótica entre Castle e Beckett, que faz lembrar, um pouco, a que existia entre Bruce Willis e Cybill Shepherd, na série Moonlighting.

Apesar de ser um grande canastrão, ou talvez por isso mesmo, Castle acaba sempre por dar uma sugestão que leva í  descoberta do assassino.

É uma série ligeira, sem grandes pretensões e que dispõe bem, sem aleijar a inteligência.

Eureka! Tantas erecções!

Não é permitida a publicidade a medicamentos, nomeadamente í queles que combatem a disfunção eréctil, como o Viagra, o Cialis e o Levitra.

Mas nada impede que um jornal como o Diário de Notícias, publique um anúncio de página inteira a um spray chamado Eureka (eu repito: chamado Eureka), que, uma vez esguichado sobre o pénis, proporciona um «erecção sólida, firme, sem demora, sempre que quiser», como consta do longo texto publicitário.

Em parte alguma do texto se refere a composição química da mistela que faz acordar um morto («o seu pénis fica imediatamente erecto, mesmo que não tenha uma erecção há anos!»), mas isso pouco importa.

O que interessa são os testemunhos de homens que já pulverizaram a pila com Eureka.

Diz um, com 73 anos: “o spray é realmente um produto extraordinário…  Além de discreto, permite-me ter uma grande e linda erecção, sempre que quero! Tenho 73 anos e posso dizer que faço amor até 3 vezes por dia!

Reparem que o velhote diz que tem uma “grande e linda erecção“! Que ternura!…

Faltaria ouvir a esposa, que deverá dizer algo do género: ” Xiça! O sacana do velho não me larga! Sempre atrás de mim com aquela coisa pendurada! Tem a mania que tem 20 anos, o jarreta!”

Outro homem, afirma ter tido sempre problemas com as erecções e agora, depois de experimentar Eureka, é sempre a aviar, e diz: “Pois é certo que irei obter uma erecção a qualquer hora do dia ou da noite… Ainda melhor, tenho a certeza que o meu pénis ganhou mais alguns centímetros”.

Vai-te gabando, vai. Se continuas a usar Eureka de cada vez que quiseres mandar uma pinocada, qualquer dia tropeças no prepúcio, pá!

Finalmente, um terceiro homem que, para além de não o conseguir levantar, também tinha ejaculação precoce, garante: “Eu e a minha esposa usamos Eureka para grande prazer mútuo. Agora podemos fazer amor durante horas!”

Lá se vai o sexo tântrico!

O maravilhoso spray dá tesão, resolve a ejaculação precoce, permite orgias demoradas e até anima as mulheres. De facto, segundo o texto publicitário: «pulverize Eureka nas partes íntimas da sua parceira para lhe estimular uma sensação deliciosa e torná-la muito mais animada“.

Se começarem a cruzar-se nas ruas, nos centros comerciais, nos cafés com mulheres de olhar glorioso, já sabem que, na noite anterior, o respectivo companheiro lhes pulverizou a passarinha com Eureka!

Espero bem que o ministro da Saúde tome, finalmente, uma medida acertada, passe a considerar o Eureka um verdadeiro medicamento e o comparticipe a 100%.

Pode ser que, assim, a malta aguente a crise com um sorriso nos lábios…

Coisas Antigas – Dulcídia, uma mulher preocupada com o futuro

Quando Dulcídia nasceu, todos foram unânimes: tinha os olhos da mãe, a boca do pai, o nariz da avó e as mãos de um tio que vivia na Austrália.

O nascimento de Dulcídia significou, portanto, a mutilação de quatro membros da sua família. E este facto marcou Dulcídia para sempre. Marcou-a, mais precisamente, numa nádega, pelo que só se via quando estava de costas. Por isso, Dulcídia nunca se punha de costas, para que não se lhe notasse a marca.

“É registada?” – perguntavam os amigos mais íntimos, aqueles tão íntimos que tinham o privilégio de ver a marca.

Mas a marca de Dulcídia não era registada. E apesar de muito imitada, nunca conseguira ser igualada. Era uma marca única!

Mas Dulcídia era uma rapariga com azar. Como a mãe era míope e ela tinha os olhos da mãe, foi obrigada a usar óculos. Como o pai sofria de cárie dentária e ela tinha a boca do pai, andava sempre com dores de dentes. Como a avó tinha sinusite, Dulcídia tinha sempre o nariz a pingar. E como o tio da Austrália roía as unhas, Dulcídia não as podia pintar.

Enfim, azares de Dulcídia, compensados pelo seu magnetismo pessoa, capaz de atrair qualquer um.

Mas Dulcídia temia o futuro: míope, com cárie, sinusite e sempre a roer as unhas, como poderia ela arranjar um emprego decente e monetariamente compensador?

É que Dulcídia começava a entrar na casa dos trinta, deixando para trás os tempos despreocupados da adolescência e as quatro pensões de invalidez que recebia não chegavam para a sustentar. Dulcídia era uma mulher de muito alimento.

Por isso, começou a andar cabisbaixa, ensimesmada, deprimida e outras coisas semelhantes.

Os amigos tentavam confortá-la.

Dizia um: «deixa lá, Dulcídia!… Míopes há muitos… um até conheço um zarolho que é míope, vê lá tu!…»

Mas Dulcídia não via lá muito bem, como já foi dito.

E dizia outro amigo: «não te preocupes!… Arranca os dentes e usa placa!”

Mas Dulcídia não ia í  bola com placas porque não gostava de futebol.

E outro amigo dizia ainda: «não te rales!… tu tens sinusite, e eu sofro de rinite, faringite, pirite e calcopirite! Um mal nunca vem só!»

Mas com o mal dos outros, podia Dulcídia bem. Com o que ela não podia era com os seus males, os seus defeitos, que a impediam de encontrar um emprego compatível com os seus inegáveis dotes intelecto-corporais.

Por tudo isso, Dulcídia temia o futuro.

Mas um dia, já depois das 4 horas, o futuro chegou e afinal era bom!

Graças í  miopia, fez anúncios para lentes de contactos. Com a ajuda das cáries, anunciou pastas dentífricas ricas em fluor. A sinusite permitiu-lhe fazer spots de pingos para desintupir o nariz e pílulas para as dores de cabeça. E a sua mania de roer as unhas serviu na perfeição para o conhecido anúncio de pastilhas elásticas: «não roa as unhas, mastigue Elastex – a pastilha que nunca esquece!».

E mais uma vez ficou provado que a função faz o órgão e a publicidade faz o resto!

– in Pão Comanteiga, Rádio Comercial, 29.5.1983 (Tema: o Futuro)

Coisas antigas – O futuro geopolítico

A Grã-Bretanha adoptará definitivamente o fleumatismo maoista, fará um aliança com Singapura do Norte, a Malásia e Dodge City, declarando guerra í  Frente Lesoto-Botswana. Entretanto, os Estado Unidos – que mudarão o seu nome para Estados Unidos da América e Sucursais S.A.R.L. – decidirão acabar com eleições livres. Passarão a ser semi-livres, o que quer dizer que o cidadão terá a liberdade de votar em quem quiser, desde que seja um determinado candidato, escolhido por computador.

Tudo isto provocará largas repercussões na União das Variadíssimas Repúblicas Soviéticas E.P. que, por retaliação, invadirão o Nepal. Só para chatear, as cinco Alemanhas e as duas Bélgicas, juntar-se-ão ao Rochedo de Gibraltar (superpotência que integrará Espanha, Marrocos, Argélia e Setúbal) e, todos juntos, invadirão também o Nepal.

A confusão aumentará consideravelmente quando a Aliança Luso-Greco-Turca (únicos sobreviventes da antiga CEE), decidir arrasar todos os países começados por M, invadindo, logo de seguida, o Nepal.

Por tudo isto, o Nepal passará a ser a região do globo com maior densidade populacional e o resto do mundo não passará de um deserto chato…

in Pão Comanteiga, Rádio Comercial, 29.5.1983 (Tema: Futuro)

Medo do animal feroz

Lembram-se do que aconteceu depois de António Guterres e Durão Barroso terem deixado de ser primeiro-ministros?

Nada.

Guterres foi para aquela coisa dos refugiados e Barroso, no fundo, também, já que a Europa não passa de um enorme campo de refugiados.

E por cá, pouco ou nada se fala deles.

Vemos Guterres ao lado de Angelina Jolie, algures na Somália e Barroso, ao lado de Angela Merkel, algures na Europa e é tudo.

Vantagem para Guterres, sem dúvida.

A Angelina bate a Angela em todas áreas.

E quanto a Sócrates?

Muito mais odiado que Guterres e Barroso, retirou-se pela esquerda baixa.

Diz-se que foi para Paris, estudar filosofia (e diz-se com ar de gozo, como se aquele tipo, que nem engenheiro é, tivesse categoria para estudar fosse o que fosse, muito menos filosofia – o mister do outro Sócrates, o original!…).

Mas a sombra de Sócrates continua a pairar sobre as páginas dos jornais.

O semanário Sol, um dos que mais bateu em Sócrates, demorou semanas a retirá-lo da primeira página.

E esta semana, subitamente, voltou-se a falar do homem.

Que o homem tinha telefonado a alguns deputados do PS, para que eles votassem contra o Orçamento. Que tinha jantado com apoiantes no Porto. Que anda por aí.

Que medo!

O medo é tão grande que até o chefe da JSD decidiu mesmo entregar ao Procudador-Geral da República, uma série de documentos que supostamente provam que Sócrates é responsável pela dívida soberana, pelo que deve ser julgado.

Claro que este inteligente jovem (chama-se Duarte Marques, tomem nota porque ainda pode chegar a primeiro-ministro…) sabe que esta sua iniciativa não passa de uma patetice populista porque, se a responsabilização criminal de Sócrates fosse para a frente, teríamos que abrir processos a muita gente, a começar pelo Cavaco!…

Portanto, estamos nisto: o PSD e o CDS têm a maioria absoluta, têm um líder da Oposição que é um cinzentão tão triste que até tem Seguro no apelido e, mesmo assim, não se sentem a salvo e temem o regresso do animal feroz.

Por que será?

Aceitam-se sugestões.

 

Il vero amore de Berlusconi

A crise prejudica todos.

Vejam lá que o primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi, foi obrigado a adiar a edição do seu terceiro disco, intitulado “Il Vero Amore”.

Gravado em parceria com o músico napolitano Mariano Apicella, o disco, que já devia estar aí, a subir nos tops, só sairá, talvez, lá para o fim do mês.

Percebe-se, agora, por que razão Berlusconi pediu a supervisão do FMI.

Ainda o vamos ver fazer um dueto com a Christine Lagarde…

“O Evangelho de Fogo” (2008), de Michel Faber

—Michel Faber é um escritor nascido na Holanda, criado na Austrália e residente na Escócia.

Autor de sete romances, dele, só tinha lido “Debaixo da Pele” (2000), e achei-o surpreendente, uma história original e inquietante.

Mas este “O Evangelho de Fogo” é uma desilusão.

Conta a história de Theo Griepenkerl, um modesto académico que, por mero acaso, descobre, numa museu iraquiano, uns manuscritos que são, afinal, o quinto evangelho – ainda por cima, escrito por uma testemunha ocular, alguém que, de facto, conviveu com Cristo.

Trata-se de uma excelente ideia mas, na minha opinião, Faber não conseguiu (ou não quis) desenvolvê-la completamente.