“The Secret Life of Words”, de Isabel Coixet

vidasecretadaspalavras.jpgQue boa surpresa, este pequeno grande filme, produzido por Almodovar.

Sarah Polley interpreta o papel de uma operária surda (Hannah), com traços obsessivos, que é instada pelo patrão a tirar umas férias; há quatro anos que não o fazia e os seus colegas já a olhavam de lado.

Contrariada, Hanna acaba por aceder e, logo no início das férias, propõe-se como enfermeira de um queimado que, numa plataforma petrolífera, no mar do Norte, aguarda evacuação.

Grande parte do filme desenrola-se, assim, no espaço confinado da plataforma e é aí que Hanna acaba por desenvolver uma relação, dia a dia mais estreita, com Josef, o doente queimado, transitoriamente cego (Tim Robbins).

O facto de Hanna ser surda e Josef estar cego pela exposição ao fogo, faz com que a enfermeira acabe por se aventurar a contar a sua história, relacionada com os horrores da guerra na ex-Jugoslávia.

Um filme sussurrado, triste e belo.

Aconselho vivamente.

“O Pianista”, de Roman Polanski

pianista.jpgTodo o realizador de cinema judeu que se preze, faz o seu filme sobre o holocausto. O de Polanski ganhou 3 óscares em 2002, incluindo o de melhor actor e melhor realizador, e ainda a palma de ouro de Cannes.

A grande diferença entre mais este filme passado no gueto de Varsóvia, durante a ocupação nazi, e muitos outros, com o mesmo tema e o mesmo cenário, reside na interpretação de Adrien Brody, que é, de facto, notável. O homem vai mirrando, ao longo do filme, ficando cada vez mais magro, com olhar mais louco e vazio, degradando-se física e psicologicamente.

O filme conta-nos a história do pianista Wladyslaw Szpilman, de como ele conseguiu sobreviver í  humilhação, í  fome, ao arbítrio nazi, quer no interior do gueto de Varsóvia, quer, depois, com a ajuda de alguns gentios anti-nazis, fechado em apartamentos da capital polaca, praticamente sem comida e sem contacto com mais nenhum ser humano.

É difícil acrescentar seja o que for a este tema, já tão estafado. Daí a importância do trabalho do actor. Só por ele vale a pena ver este filme.

Lost – 2ª série

lost2.jpgHá duas maneiras de ver Lost.

Primeira: aceitar as regras do jogo que os criadores da série nos propõe, não questionar a Dharma Iniciative, não pí´r em causa a teoria da centralidade e de que todos estamos ligados de algum modo, adoptar o lema “here we are, entertain us”

Se assim for, Lost é uma excelente série, viciante, com um bom ritmo, bons actores, voltas e reviravoltas suficientes para nos fazerem ansiar sempre pelo episódio seguinte.

Segunda: estar í  espera de que Lost seja uma série racional, que nos dê explicações aceitáveis para o que acontece na ilha e que essas explicações sejam, também elas, racionais.

Neste caso, Lost é uma aldrabice pegada e já não há pachorra para tantas alucinações que, se calhar, não são, porque a Virgem Maria existe mesmo, bem como o cavalinho no meio da selva e mais o avião cheio de droga que, afinal, era o mesmo que levava, a bordo, o maninho do Mr. Eko e não me lixem mais essas coincidências todas que, se calhar, não são coincidências, são o destino, etc, etc.

Decidi adoptar a primeira maneira de ver Lost e, por enquanto, estou a gostar.

“Six Feet Under” – 5ª série

setepalmos5.jpgAssim terminou uma das melhores séries de televisão desta nova vaga que tem inundado o mercado nos últimos anos. E terminou bem, antes que a fórmula se esgotasse.

Durante 5 anos fomos seguindo as vidas da família Fisher e do seu negócio muito particular de “funeral directors”. Nate não chega a ver a sua filha Willa, que Brenda dá í  luz antes do tempo, porque tem um novo AVC, pouco depois de ter dado uma facada no matrimónio com Maggie, filha de George, o bipolar que casou com Ruth, mãe de Nate.

Só este pedaço dava para uma série completa. Mas ainda há David, cuja relação com Keith se vai desenvolvendo, ao ponto de ambos adoptarem dois irmãos negros, rebeldes e sempre desprezados. E há Claire, que vai amadurecendo, ultrapassando a sua relação quase doentia com Bill, irmão de Brenda, outro bipolar e acaba por aceitar um emprego em New York, depois de se relacionar com Ted, um conservador republicano, o oposto de si própria.

E Ruth, que não desiste de encontrar alguém que tome o lugar do Sr. Fisher, morto logo no primeiro episódio. Depois de renegar George, por não estar para aturar mais um maluco, ainda tenta voltar a um antigo namorado, mas é nesse mesmo dia que o seu filho morre, sem que ela esteja presente.

E Brenda, cujos pais, ambos psicoterapeutas, a marcaram de forma indelével, ao ponto de ela continuar a fantasiar uma relação incestuosa com o irmão.

E poderia continuar a dar exemplos, já que a riqueza desta série é imensa; para além disso, os actores são excelentes, a realização competente e a fotografia muito acima da média.

Terei saudades desta série.

“Fracture”, de Gregory Hoblit

ruptura.jpgBom filme de suspense que nos conta a história de um engenheiro aeronáutico que, ao descobrir que a mulher tem um amante, decide matá-la, pondo em prática um plano quase perfeito.

Depois de preso, prescinde de advogado, assumindo a sua própria defesa. Por sua vez, o Ministério Público tem, como advogado de acusação, um jovem ambicioso, nas vésperas de se mudar para uma grande firma de advogados e que encara este último caso como favas contadas.

O assassino é interpretado por Anthony Hopkins, que, cada vez mais, faz dele próprio, isto é, de Hannibal Lecter, com pequenas alterações.

A história é contada de modo escorreito e, para além do excelente Hopkins, também Ryan Gosling faz um advogado muito convincente.

No final, confirma-se que não há crimes perfeitos. Mas quase…

Acrescente-se que, mais uma vez, o tradutor achou que “Fractura” era um péssimo título e resolveu chamar ao filme, “Ruptura”. Claro!

Pernas completas?

Anúncio publicado no Jornal da Região – Almada.

pernascompletas1.jpg

1500 euros cada perna, será caro?

Claro que temos que levar em consideração o facto de se tratar de pernas completas, o que quer dizer que, se um tipo só precisar da perna abaixo do joelho, talvez façam um desconto.

Além disso, há sempre a possibilidade de pagar em 6 mensalidades e certamente que os Bancos, que emprestam dinheiro para carros, computadores e viagens, também hão-de emprestar para pernas completas.

Acabou-se o desespero dos amputados.

“Romance & Cigarettes”, de John Turturro

romancecigarros.jpgTurturro (realizador) e os irmãos Coen (produtores executivos), deviam estar com uma grande pedra quando fizeram este estranho filme musical. Isso mesmo, musical.

James “Soprano” Galdolfini é Nick Murder, um operário da construção civil que fuma que nem uma chaminé. Dependente da nicotina, Nick Murder “is murdered by the nicotine”. É casado com uma dona de casa e costureira (Susan Sarandon) e tem três filhas, uma delas adoptada (Aida Turturro) e um pouco atrasada.

Nick engana a mulher com uma prostituta ou vendedora de lingerie erótica (não cheguei a perceber), interpretada por Kate Winslet, que diz mais palavrões por segundo do que o próprio Steve Buscemi, que entra em apenas três cenas, para dizer “fuck” quinhentas vezes.

E o toque final é dado por Christopher Walken, que canta e dança uma deliciosa “Delilah”, com a voz de Tom Jones em fundo.

Boa, também, é a interpretação que Sarandon faz de “Piece of my heart”, de Janis Joplin, acompanhada de um coro de igreja.

E é assim mesmo: em ambiente suburbano decadente, um grupo de americanos românticos canta e dança grandes canções de amor, ao mesmo tempo que se insultam mutuamente.

Filme estranho, entre o divertido e o claramente piroso.

Por que carga de água Turturro e os Coen fizeram um filme destes?

Porque podem.

Cadáveres esquisitos

bodies.jpg“O Corpo Humano como nunca o viu” – é o subtítulo da exposição “Bodies”, patente no Palácio dos Condes do Restelo, na Rua da Escola Politécnica.

Graças a uma técnica que envolve preservação por polimerização, e graças a uma série de chineses que (supõe-se) doaram os seus corpos í  Ciência, podemos ver como somos por dentro.

Para quem tirou o curso de Medicina e apenas teve direito a um bocadinho de cadáver, nas aulas de Anatomia, esta exposição é uma revelação. Ali, bem í  vista, estão estruturas, que só conhecia dos livros do Rouviére: nervos, tendões, músculos, articulações, vísceras.

Muito didáctica, bem documentada, a exposição permite-nos perceber a complexidade do corpo humano e como todas estas estruturas se complementam.

Li alguns comentários menos entusiasmados, criticando o lado “espectacular” da exposição. De facto, não era preciso colocar um cadáver na posição de “O Pensador”, de Rodin, para chamar a atenção para o cérebro – mas a Ciência também pode ser espectacular e, talvez assim, chegue a mais pessoas.

“The Queen”, de Stephen Frears

rainha.jpgO filme é, sobretudo, um show de Helen Mirren, que faz uma rainha muito convincente.

Mas tem mais coisas que valem a pena: a ascensão de Tony Blair (“por favor, trate-me por Tony”), na sua posição quase esquizofrénica de querer, simultaneamente, a “modernidade” e a continuidade daquela família real; o espanto da chamada rainha-mãe e do marido da rainha, perante as manifestações de apoio a Diana, após a sua morte, incapazes de perceber o que se estava a passar; o próprio fenómeno mediático que foi a morte de Diana que, de certo modo, inaugurou uma nova espécie de notícia – a notícia que, embora tenha um facto real como base (a morte da princesa de Gales), é potenciada pela comunicação social, até se transformar em algo autónomo que, no final, já pouco tem com a notícia em si (veja-se o caso do desaparecimento da miúda inglesa, no Algarve).

Filme escorreito e sóbrio, como é habitual nos trabalhos de Frears.

“The Devil Wears Prada”, de David Frankel

diabovesteprada.jpgSe o diabo veste Prada, será que deus veste Boutique da Alcofa?

É esta a grande questão de mais um filme tipo gata borralheira. A menina-que-não-quer-saber-da-moda-para-nada, mas que quer ser uma grande jornalista (Anne Hathaway), arranja emprego como assistente da directora de uma grande revista de moda, a Sra. D. Miranda (Meryl Streep).

A Sra. D. Miranda quase nunca olha ninguém nos olhos, nunca levanta a voz, dá ordens e não tolera que a ponham em causa.

A gata borralheira, a pouco e pouco, aprende a vestir-se com estilo, arranja o cabelo e até fica com a cintura mais fininha: está a subir na vida e na consideração da D. Miranda. Até vai com ela para Paris e para a cama com um D. Juan nova-iorquino. Mas perde o namorado e a dignidade.

Então, desiste do emprego, volta a vestir-se como antigamente e reconquista o namorado.

A D. Miranda escreve-lhe uma carta de recomendação e a gata borralheira arranja emprego como jornalista no New York Mirror.

Se não estivéssemos de férias, o dvd bem podia ter ficado na prateleira do videoclube.