“A Louca da Casa”, de Rosa Montero (2023)

Rosa Montero (Madrid, 1951) explica, no final do livro, que esta é uma reedição, já que A Louca da Casa foi editado, pela primeira vez, em 2003. Terá sido o primeiro título de uma trilogia que a autora apelida de artefactos literários, uma vez que não são bem um ensaio, muito menos um romance, mas têm ingredientes de ambos.

Os outros dois títulos da trilogia são: A Ridícula Ideia de Não Voltar a Ver-te, publicado em 2013, e O Perigo de Estar no Meu Perfeito Juízo (2022). Curiosamente, cada título está separado do seguinte por cerca de dez anos.

Neste A Louca da Casa, Rosa Montero fala sobre a imaginação e como ela domina o acto de escrever romances, de tal modo, que a autora conta alguns episódios da sua vida e conta-os em diversas versões. O leitor fica sem saber qual dessas versões será a verdadeira, se é que alguma delas é.

Rosa Montero pouco mais velha que eu é, e isto que ela diz sobre o envelhecimento, é bem verdade:

“O envelhecimento é um processo orgânico lamentável que tem apenas duas coisas boas (a primeira é que, se nos esforçarmos, aprendemos algumas coisas; e a segunda, é ser a melhor prova de que ainda não morremos) e muitas outras péssimas, como, por exemplo, os neurónios destruírem-se às mãos cheias, as células se deteriorarem e se oxidarem, a gravidade puxar o corpo em direcção à terra-campa enfraquecendo os músculos e dependurando as carnes. Pois bem, a todos esses pesares, e a outros que não cito, é possível que também se some um fastio acabrunhante da realidade, a perda progressiva da nossa capacidade de fantasia, o anquilosar da imaginação.”

A propósito das técnicas que os romancistas usam para escrever as suas obras, Montero cita diversos outros autores. Destaco esta citação de Mark Twain:

“O livro relata uma história ainda mais inquietante sobre Mark Twain, que, em adulto, contou a um jornalista que tinha tido um irmão gémeo, Bill, com quem se parecia tanto que ninguém conseguia distingui-los, ao ponto de terem de colocar-lhes cordelinhos coloridos nos pulsos para saber quem era quem. Pois bem, um dia deixaram-nos sozinhos na banheira e um deles afogou-se. E, como os cordões se tinham soltado, «nunca se soube qual dos dois tinha morrido, Bill ou eu», explicou Twain placidamente ao jornalista”.

Também Rosa Montero fala, neste livro, da sua irmã gémea Martina, e ficamos na dúvida se ela não estará a seguir o exemplo de Mark Twain, inventando uma história que, afinal, pode ser verdadeira.

Mais um bom livro desta escritora castelhana.

Ver ainda: Instruções Para Salvar o Mundo; A Boa Sorte

“O Perigo de Estar no Meu Perfeito Juízo”, de Rosa Montero (2023)

Montero pensa que a criatividade e a loucura talvez não andem de mãos dadas, mas têm apenas uma parede finíssima a separá-las.

Nascida em 1951, esta escritora espanhola, de quem já li A Boa Sorte, A Ridícula Ideia de Não Voltar a Ver-te e Instruções Para Salvar o Mundo, dá-nos inúmeros exemplos de escritores, uns famosos, outros menos, que lutaram contra a loucura ou que a deixaram tomar conta de si próprios e que a aproveitaram para criar as suas obras.

Com efeito, são inúmeros os exemplos. Rosa Montero gosta, especialmente, de Sylvia Plath (1932-1963), Virginia Woolf (1882-1941) e Emmanuel Carrère (1957). Plath suicidou-e com a cabeça dentro do fogão da cozinha, Woolf suicidou-se metendo-se no mar, vestindo um sobretudo cheio de pedregulhos, e Carrère, embora não se tenha suicidado, sofre de uma perturbação bipolar.

Mas há muitos outros exemplos de criadores suicidas, alcoólicos ou loucos – e Montero compara-se com eles, em certa medida, embora nunca assuma nenhuma doença mental ou vício de substâncias aditivas.

A sua tese é que a criatividade está ligada a mentes diferentes das mentes das pessoas, digamos, comuns, banais.

Tem razão, certamente, mas não penso que seja absolutamente necessário dar as mãos à loucura para ser criativo – e poderia elencar uma lista de nomes de autores que criaram grandes obras sem estarem a entrar e sair de instituições psiquiátricas. Apesar disso, recomendo.

“A Ridícula Ideia de Não Voltar a Ver-te”, de Rosa Montero (2013)

Desta escritora espanhola, só tinha lido Instruções para Salvar o Mundo (2008), livro que muito apreciei.

a ridicula ideiaDevorei agora este livrinho de cerca de 150 páginas e há muito tempo que não lia nada que me enchesse tanto as medidas.

A partir de um pequeno diário escrito por Madame Curie, após a morte violenta e súbita de Pierre Curie, Rosa Montero fala sobre a sua própria experiência de perda, já que o seu companheiro de décadas, Pablo, morrera recentemente, vítima de cancro.

Rosa Montero usou a escrita deste livro como terapia para o vazio que o desaparecimento de Pablo lhe deixou e socorre-se do exemplo de Maria Curie, uma mulher aparentemente austera e fria mas que, naquele pequeno diário, se revela uma mulher carinhosa e sensual.

Pelo caminho, Rosa Montero fala da dificuldade que as mulheres ainda têm para se afirmarem num mundo de homens, conta pequenos episódios relacionados com a sua profissão de escritora, fala-nos de amizade, de amor, de sexo, da vida e da morte.

Recomendo vivamente!

 

“Instruções para salvar o mundo”, de Rosa Montero

Rosa Montero nasceu em Madrid, em 1951, e é autora de diversos romances. Este curioso “Instruções para salvar o mundo” é a primeira obra da sua autoria que eu leio e agradou-me.

A acção decorre nos subúrbios da capital espanhola e conta-nos a história de três personagens, cujas vidas se cruzam: o taxista Matías, que acabou de perder a sua companheira, vítima de cancro, o médico Daniel, um falhado que terá diagnosticado mal a mulher de Matías e Fatma, uma prostituta africana.

Montero tem uma escrita escorreita e narra esta história com agilidade, embora recorrendo, por vezes, a comparações um pouco forçadas.

Apesar da vida de Matías, Daniel e Fatma ser triste, banal e aparentemente sem esperança, o que é certo é que dois deles conseguem dar-lhe a volta. Todos temos uma segunda oportunidade, pelos vistos. «É que a Humanidade divide-se entre aqueles que sabem amar e aqueles que não sabem», como escreve Montero, no final do livro.