Vamos acabar com 2016, antes que ele acabe connosco!
Todos os anos morrem milhões de pessoas.
Pensem nisto durante alguns segundos: milhões!
Por exemplo: vítimas de acidentes de viação, em Portugal, nos primeiros 6 meses do ano ““ 240!
Claro que a Síria bate todos os recordes, ultrapassando, de longe, os que morreram afogados, no Mediterrâneo.
Quedas de aviões, atentados terroristas, vítimas de sismos ou cheias, mortos em combate, epidemias, incêndios.
Mas no que respeita í música, este ano foi mesmo muito mau, carago!
David Bowie, Prince, Leonard Coen, George Michael, Greg Lake e Keith Emerson (dos Emerson, Lake and Palmer), Rick Parfitt (dos Status Quo), Pierre Boulez, Maurice White (dos Eart, Wind and Fire), George Martin (o quinto Beatle), Gato Barbieri, Peter Burns (Dead or Alive), Glen Frey (dos Eagles).
Não nos bastava o Brexit ou o Trump!
Salvam-nos o Costa, com aquele ar de Buda-Sempre-Feliz e o Marcelo, í beira de conseguir o principal objectivo da sua presidência: tirar uma “…marselfie” com cada um dos portugueses.
Por mim, estás despachado, Marcelito!
Armas de arremesso
Boa notícia?
Vestir um fato de Domingues
Sou do tempo em que se considerava que vestir uma roupinha nova e elegante, era vestir fato de domingo.
Vestia-se fato de domingo para ir í missa ou para ir ao médico, por exemplo.
Sou também do tempo em que se dizia que as pessoas que falavam com palavras difíceis, usavam palavras de 7 mil e 500 (escudos?… acho que sim…).
Vem isto a propósito das afirmações de António Domingues, ex-Presidente da Caixa Geral de Depósitos que, depois das trapalhadas em que esteve envolvido, decidiu explicar-se em comunicado.
Diz ele que foi vítima de um:
“turbilhão mediático politicamente instrumentalizado e frequentemente a resvalar para a demagogia populista”
Ora quem diz isto, poderia também dizer:
“foguetão electro-estático realmente formalizado e justamente a descambar para a alergia realista”
Ou, melhor ainda:
“cagalhão majestático intrinsecamente idealizado e bruscamente a escorregar para a aerofagia moralista”.
Fidelidade
Preocupações
Donaldo Trampa
“Um Copo de Cólera”, de Raduan Nassar (1978)
Raduan Nassar (Pindorama, 1935) é um escritor brasileiro que este ano ganhou o Prémio Camões, o que fez com que as editoras se lembrassem dele.
A Companhia das Letras editou este Um Copo de Cólera, um texto que Nassar terá escrito em 15 dias, por volta de 1970, mas que só veio a público em 1978.
Trata-se de um conto, pequena novela, minúsculo romance, de qualquer modo, um texto escrito de supetão, como um grito ou um manifesto, sobretudo o capítulo mais longo, denominado, correctamente, O Esporro.
Depois de uma noite tórrida de amor e sexo, um casal zanga-se e lança-se num “bate-boca” violento.
Vale pelo ritmo, pelas palavras, pelo domínio da língua, embora seja um texto típico dos anos 70-80 do século passado, quase sem pontuação, como era, então, moda (recordo O Outono do Patriarca, do Gabriel Garcia Marquez, publicado em 1975).
Preciso ler mais coisas de Nassar para formar uma opinião.
“Numa Casca de Noz”, de Ian McEwan (2016)
No ano em que celebra o 400º aniversário da morte de Shakespeare, Ian McEwan decidiu homenagear o bardo escrevendo uma pequena variação a Hamlet.
Trudy está grávida, fim de tempo, e planeia envenenar o marido e pai da criança, de conluio com Claude, irmão do marido.
A originalidade do Nutshell (Gradiva, tradução de Ana Falcão Bastos), é que toda a história é narrada pelo feto que, í medida que vai contando as peripécias da trama, vai fazendo comentários ao incómodo que lhe provoca as relações sexuais, sobretudo quando a sua mãe é penetrada por Claude, que é um bocado bruto e algo estúpido, contrastando com seu pai, editor, livreiro e poeta; o feto descreve-nos também as sensações que tem quando a sua mãe bebe uns copos a mais, ou quando ela está ansiosa, ou sonolenta ou excitada.
Prestes a nascer, o feto divaga, por exemplo, sobre o facto de nascer no Reino Unido:
“Vou herdar uma situação de modernidade (higiene, férias, anestésicos, candeeiros de leitura, laranjas no Inverno) e habitar um canto privilegiado do planeta – a Europa Ocidental bem alimentada e livre de pestes. A velha Europa, esclerótica, relativamente generosa, atormentada pelos seus fantasmas, vulnerável aos opressores, insegura, destino de eleição de milhões de infelizes. A minha vizinhança imediata não vai ser a próspera Noruega – a minha primeira opção devido ao seu gigantesco fundo soberano e í s suas generosas prestações sociais; nem a segunda, a Itália, devido í cozinha regional e ao declínio abençoado pelo sol; nem sequer a terceira, a França, pelo seu pinot noir e auto-estima confiante. Em vez disso, vou herdar um reino não tão unido quanto isso, governado por uma estimada rainha idosa, onde um príncipe-empresário, famoso pelas suas boas obras, pelos elixires que usa (essência de couve-flor para purificar o sangue) e pela sua ingerência inconstitucional, aguarda com impaciência a coroa. Será essa a minha pátria, e terá de servir. Podia ter visto a luz do dia na Coreia do Norte, onde a sucessão é igualmente incontestada, mas onde há escassez de liberdade e de alimentos”.
São tiradas destas, da autoria de um feto em fim de tempo, que tornam o livro diferente, já que a história em si, não tem nada de especial.
Curioso.
Outras obras deste autor: A Balada de Adam Henry, Mel, Na Praia de Chesil, Cães Pretos, Entre Lençóis, Jardim de Cimento, Solar.