“Ronda das Mil Belas em Frol”, de Mário de Carvalho (2016)

Entre Janeiro e Maio de 1986, fiz parte da equipa do programa de rádio Uma Vez por Semana, da responsabilidade do José Duarte.

Uma Vez por Semana – o seu programa sexual, foi algo de único na rádio portuguesa; parte da equipa do Pão Com Manteiga decidiu dedicar-se í  sexualidade, uma vez por semana, entre as 11 da noite e a uma da manhã e, í  meia-noite, convidávamos os ouvintes a experimentarem uma das posições para o acto.

Em resumo: um fartar de rir.

Da equipa fazia parte o Mário de Carvalho que, já nessa altura, era um daquele marotos que parecem que não partem um prato.

rondaVinte anos depois, Mário de Carvalho publica este Ronda das Mil Belas em Frol, um conjunto de pequenos textos malandrecos que me fazem lembrar os textos que ele escreveu para aquele programa radiofónico da extinta Rádio Comercial.

Mário de Carvalho conhece a nossa língua como ninguém e usa-a – digo mesmo que abusa dela.

Poderia citar inúmeros exemplos, mas deixo aqui estes:

“Era minha incumbência garantir o fulcro daquele intenso circuito de mó. Ia o eixo sendo inclinado num vértice complacente, conforme solicitado por tal arco ou pelo contrário, em inversões bruscas, para as quais eu, o fulcro, contava pouco. Irrompia do meio de mim, ombros no chão, um cone projectado, abrindo em leque até que desse”.

Ele há maneira mais elegante de descrever uma foda?

Há – e Mário de Carvalho é perito nisso.

Outro exemplo, este relacionado com uma senhora muito concentrada em si própria:

A senhora serpeava, estorcia-se, molezas a dar a dar, relance torvo, mas todos os revolteios e sonoridades eram concentrados em si própria.”

A riqueza da nossa língua, a abundância de sinónimos e de imagens, espraiam-se nestas pequenas histórias de macho latino, a quem não escapam casadas, solteiras, jovens ou balzaquianas.

Eis como é descrita a principal atracção das senhoras:

“Não há mais elegante delineio da Natureza que aquela abençoada fenda, sulcada em macios conchegos, figurando duas mãos que rezam, unidas ao alto, entrada de catedral, gasalho de mistério”.

Lê-se em três tempos.

Vasco Putrefacto Valente

O azedo e reaccionário Vasco Pulido Valente não gosta de ninguém.

Detesta-se a si próprio.

Percebe-se isso pelo facto de, em todas as suas crónicas, ao longo de todos estes anos, não ser capaz de elogiar porra nenhuma.

Tudo o que aconteceu e acontece em Portugal é uma merda, o país é um lamaçal, os nossos políticos são todos uns cabrões, incluindo ele próprio, que também foi deputado e secretário de Estado.

Qualquer pequena conquista que o país faça é logo menosprezada por este intelectual pacóvio, porque é uma espécie de saloiice não perceber que, no meio de tanta porcaria, alguma coisa merece aplauso.

No fundo VPV é um snob saloio – não no sentido tradicional dos habitantes dos arredores de Lisboa, mas no sentido pejorativo atribuído aos saloios que não se actualizam, que continuam a viver no passado.

Vem tudo isto a propósito da última crónica do VPP, que não li, mas que vem citada no pasquim Sol, sobre a eleição de Guterres, e que diz isto:

“Agora que já acabou ou, pelo menos, se atenuou a campanha patriótica para a canonização de Guterres, talvez se possa olhar para ele com alguma tranquilidade e medida. Por acaso conheço a criatura. É um homem fraco, influenciável, indeciso e superficial. A crónica amnésia deste país fez desaparecer numa semana de glória o péssimo governo que dirigiu.”

Apetece dizer que, no que respeita a Pulido Valente, também conheço a criatura. Escreve crónicas medíocres há décadas, que agora saem naquela coisa chamada Observador, publica livros de História que ninguém lê e é um homem fraco, ao ponto de se ter casado duas vezes com a mesma mulher.

E invejoso, pelos visto…

Vamos apoiar o SNS!

O Governo anunciou que o aumento dos impostos sobre o tabaco e o álcool e o novo imposto sobre bebidas açucaradas vai reverter para o Serviço Nacional de Saúde.

Assim sendo, a Direcção Geral da Saúde deve incentivar o consumo de álcool, refrigerantes e tabaco, para que as dívidas do SNS possam diminuir.

í€ atenção do Dr. Francisco George, aqui ficam duas sugestões para cartazes que poderão figurar numa campanha desse género.

coca-cola

fumando

Matar vai ser mais caro

A chamada geringonça decidiu adoptar a política de Vítor Gaspar e continuar o brutal aumento de impostos.

Quem tenha uma bruta vivenda, seja doido por Coca-Cola e goste de caçar, está mesmo tramado.

A partir de Janeiro, vai pagar um extra sobre o IMI da vivendaça com valor patrimonial acima de 600 mil euros, a enormidade de 16 euros por cada hectolitro de Coca-Cola que beba e a brutalidade de 0,02 euros por cada bala com chumbo que dispare!

Quer dizer, que mesmo aqueles maridos que decidem matar as esposas terão que pensar duas vezes, antes de optarem pela caçadeira em vez da navalha.

Por outro lado, os paizinhos terão que aumentar a semanada dos filhos adolescentes, já que uma garrafa de litro de Coca-Cola passará a custar mais 16 cêntimos do que actualmente!

Uma vergonha!

Compreende-se a indignação da Assunção Cristas – ela tem quatro filhos, caramba!

Quanto í  taxa que se sobrepõe ao IMI para imóveis de luxo, fiquem descansados os milhões de portugueses que têm apartamentos nas zonas nobres das grandes cidades ou moradias apalhaçadas – só pagam acima de 600 mil euros! Safa!

Para além da chamada fat tax, a geringonça podia ter ido mais longe e taxar outras coisas que também fazem mal í  saúde.

Exemplos? Bandarilhas e cavaleiros tauromáquicos, debates televisivos sobre futebol e calinadas de jornalistas no português, para citar apenas três exemplos.

O imposto que se impõe!

Finalmente, um imposto verdadeiramente democrático.

Segundo um inquérito recente do INE, cerca de 4,5 milhões de portugueses têm excesso de peso, sendo que 1,4 milhões são já obesos.

Quer isto dizer que quase metade dos portugas anda a comer e beber demais, prejudicando os restantes.

Chegou, portanto, a altura de começar a taxar a gordura!

Por que carga de água eu, que peso 70 quilos, tenho que pagar o mesmo imposto que um gordo que pesa 140 quilos – pois se até ocupo menos espaço, porra!

Neste particular, o obeso secretário de Estado dos Imposto, Rocha Andrade, é um exemplo para todos nós.

Força, Rocha, meu grande peida-gadoxa!

rocha-andrade-imposto

“História Secreta”, de Donna Tartt (1992)

De Donna Tartt já tinha lido o aclamado O Pintassilgo, editado há três anos.

historia-secretaEste História Secreta foi o primeiro romance que Tartt publicou e trata-se de uma história estranha, sobretudo devido aos personagens.

A história, que se pretende secreta, é narrada por Richard, um estudante de ascendência modesta, que consegue uma bolsa para estudar na Universidade de Hampden. Aí, conhece e junta-se a um grupo de estudantes provenientes de famílias abastadas que estudam sob a influência de um carismático professor de Estudos Clássicos.

Esse grupo de alunos é tudo menos banal: são quatro rapazes e uma rapariga que vivem num mundo í  parte, quase num universo paralelo, muito influenciados pela cultura grega e pelos princípios de honra, obediência, compaixão, lealdade e sacrifício.

Para além das aulas muito pouco ortodoxas com o tal professor, o grupo apenas se interessa por outra coisa: álcool. Penso que os protagonistas passam mais metade do livro bêbados ou a caminho. Também fumam muito e, uma vez por outra, tomam drogas.

Embora nunca seja referido em que época se passa esta história, percebe-se que será mais ou menos nos anos 90 do século passado; no entanto, embora se fale uma ou duas vezes em computadores portáteis, os estudantes fazem os seus trabalhos em máquinas de escrever.

As experiências mais ou menos esotéricas que o grupo leva a cabo, no sentido de se aproximarem o mais possível do hábitos da cultura helénica, acabam por levar a uma morte acidental, facto que altera completamente a vida destes jovens.

Um romance estranho, que nos capta a atenção, mesmo quando, aparentemente, não se passa nada.

“Todos os Contos”, de Clarice Lispector (2015)

todos-os-contosClarice Lispector nasceu na Ucrânia em 1920, mas emigrou para o Brasil com apenas 2 anos. casada com um diplomata, viveu em diversos países, mas sempre se considerou brasileira; faleceu no Rio de Janeiro, com 57 anos, vítima de cancro do ovário.

Considerada uma das mais importantes escritoras brasileiras do século XX, é autora de vários romances, livros infantis e muitos contos.

Este livro reúne todos os contos de Lispector, desde os primeiros, publicados em 1942, até a dois inacabados, que nunca tinham sido publicados.

Alguns destes contos são, na verdade, textos muito pessoais, em tom confessional; sobretudo os últimos, falam muito na morte.

Como se diz na introdução, os contos vão revelando o envelhecimento da autora, desde os verdes 20 anos até í  idade madura e as histórias neles contidas reflectem isso mesmo.

Para ler aos poucos (são mais de 500 páginas e dezenas de contos…).

O homem que não nasceu duas vezes

O problema de ter boa memória é que, por vezes, lembro-me de coisas que já devia ter esquecido.

Lembro-me, por exemplo, de Cavaco Silva ter ficado muito indignado quando um candidato í  Presidência (Defensor de Moura, quem se lembra dele?) o acusou de favorecer as Câmaras do PSD.

Em resposta, Cavaco disse a célebre frase:

Para serem mais honestos do que eu, têm que nascer duas vezes“.

Ora, hoje, a primeira página do Público titula:

Cavaco pagou durante 15 anos metade do IMI que deveria ter pago“.

E acrescenta:

“A casa de Albufeira do ex-PR foi reavaliada pelas Finanças em 2015. Valor patrimonial quase duplicou face ao da caderneta predial em 2009. Os dados fornecidos per Cavaco não eram verdadeiros”.

Por este andar, Cavaco vai ter que nascer quatro vezes para ser mais honesto que ele próprio!

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O Homem que não volta com a palavra atrás!

Este homem não volta com a palavra atrás!

Este homem nunca dá o dito por não dito!

Passos Coelho disse:

“O arquiteto José António Saraiva convidou-me para me associar ao livro que ia fazer e respondi que sim, mesmo antes de conhecer a obra e aceitei fazê-lo. Não sou de voltar com a palavra atrás nem de dar o dito por não dito. Estarei a fazer a apresentação dessa obra”, afirmou aos jornalistas durante uma visita a Proença-a-Nova, na aldeia de xisto da Figueira.

E afinal, hoje soube-se que, depois de ler o livro, Passos borregou.

Diz o Público:

Em comunicado enviado í  agência Lusa, a editora Gradiva afirma que o ex-primeiro-ministro Pedro Passos Coelho “pediu ao autor, por motivos pessoais, para o desobrigar de estar presente na sessão de lançamento do livro”, que estava agendada para dia 26.

Estás desobrigado, Passos – tu, que nunca dás o dito por não dito, tu, que nunca voltas com a palavra atrás.

Para a próxima, lê o livro antes de aceitares o convite!

Devias saber que não podemos confiar em jornalistas reaccionários…

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