“Kinsey”, de Bill Condon

kinsey.jpgAlfred Kinsey (1894-1956), foi um zoólogo norte-americano que, a determinada altura da sua vida, decidiu aplicar as suas técnicas de estudo dos insectos, no estudo dos comportamentos sexuais dos norte-americanos. Assim como coleccionava milhares de insectos, estudando as suas diferenças e as suas particularidades, começou a entrevistar milhares de norte-americanos, tentando saber quais eram os seus hábitos sexuais.

Em 1948, publicou Sexual Behaviour in the Human Male e, cinco anos depois, um volume idêntico, dedicado í s mulheres.

Claro que Kinsey não descobriu a pólvora mas, numa América puritana, onde não se falava de sexo, onde o sexo oral era proibido em muitos Estados (acho que, em alguns Estados, essa lei ainda não foi revogada, embora já ninguém lhe ligue), onde nem sequer passava pela cabeça das pessoas que uma mulher “decente” pudesse ter prazer sexual, Kinsey teve a coragem de demonstrar que, afinal, a vida sexual dos americanos era tudo menos “politicamente correcta”.

É espantoso que Kinsey tenha chamado a atenção para muitas coisas que, hoje em dia, ainda são tabus para muito boa gente: a importância do clítoris, o constrangimento sexual pelas regras sociais, a bissexualidade, a homossexualidade, etc.

O filme, realizado por um tal Condon (“condom” significa preservativo…), é competente e dá-nos pistas para perceber melhor a personalidade de Kinsey (Liam Neeson): um pai autoritário e puritano até í  náusea, a sua própria inexperiência sexual até conhecer a sua mulher (Laura Linney), as suas dúvidas quanto í s suas preferências sexuais, a sua obsessão pelo trabalho, a dificuldade em distinguir entre o que é “normal” e o que é “patológico”, no que respeita í  sexualidade.

Um filme interessante, num momento em que se discutem, em diversas publicações, muitas das coisas que Kinsey já tinha publicado há mais de 50 anos e que foram praticamente ignoradas.

Os ilegais do Ginjal

Passear í  beira-rio, no Ginjal, é um privilégio, repito.

Nestes primeiros dias de Outono, com aquela luz especial a derramar-se sobre o casario de Lisboa, caminhar ao longo do Tejo, por volta das 6 da tarde, faz-me sentir muito bem.

São cerca de 5 km, ida e volta, passando pelos restaurantes desactivados do Ginjal, as fábricas de conservas de peixe abandonadas, o Atira-te ao Rio e o Ponto de Encontro, o elevador da Boca do Vento (avariado), e continuando por ali fora, mesmo até ao fim do cais.

A paisagem é sempre a mesma, mas sempre diferente, conforme a hora do dia, a estação do ano, a intensidade da luz: muda o céu, muda a cor do Tejo. Na outra margem, também Lisboa parece uma cidade diferente, de cada vez que percorremos aquele caminho.

Os habitantes do Ginjal devem ser meia dúzia de idosos, que resistem em casas a prometer derrocada para breve.

Mas a população do Ginjal aumentou recentemente. Famílias de emigrantes ilegais (romenos?), instalaram-se nas ruínas de uma das fábricas de conservas.

Aqui mesmo.

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Por entre montes de lixo. O cheiro é nauseabundo. Ao cheiro do lixo acumulado, junta-se, agora, o aroma peculiar de urina e fezes humanas.

A Câmara e a Junta de Freguesia já têm conhecimento do que se passa. Um jornal local disse, até, que alguns destes emigrantes se entretêm a assaltar os passeantes. Nunca vi tal coisa. No entanto, não deixa de ser anacrónico. O tempo vai passando e a densidade populacional deste local vai aumentando.

Custa a crer que se consiga viver no meio de tanto lixo, sem um tecto digno desse nome. Como será quando começar o Inverno?

Mas há compensações.

É isto que estes emigrantes ilegais vêem, todas as manhãs, quando acordam!

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Ferenc – o aprendiz de democrata

O primeiro-ministro húngaro foi apanhado a dizer que o governo tinha que mentir ao povo, de manhã í  noite, para justificar as medidas de austeridade económica, impostas para que o país possa aderir í  União Euroipeia. Uma inconfidência que alguém gravou e passou í  comunicação social.

Os húngaros vieram para a rua, exigiram a demissão do governo, deitaram fogo a carros, apedrejaram a polícia e provocaram o caos em Budapeste. Dizem que tudo foi orquestrado pela a extrema-direita, mas o que é certo é que mesmo os apoiantes do primeiro-ministro ficaram muito desiludidos com a performance de Ferenc Gyurcsany.

Não se mente assim ao povo.

Aliás, não se diz, em voz alta, que se mente assim ao povo.

A Hungria ainda é uma jovem democracia. Ainda tem muito que aprender.

Portugal podia dar-lhe uma ajuda, não?…

“O Hussardo”, de Arturo Pérez-Reverte

hussardo.jpgPí¨rez-Reverte é um escritor espanhol com algum interesse. Os seus livros “O Cemitério dos Barcos Sem Nome” (2000) e “A Rainha do Sul” (2002), são romances de aventuras bem conseguidos, cheios de peripécias, ao estilo de Alexandre Dumas. “A Tábua de Flandres” (1990), no entanto, não me pareceu tão interessante.

Muito menos este “O Hussardo”. Publicado em 1983, foi o primeiro romance de Pérez-Reverte. A edição que li é de 2004 e é uma revisão, feita pelo próprio autor e, como ele diz, numa nota introdutória, “aliviado de alguns advérbios e adjectivos desnecessários”.

Mesmo assim, pareceu-me um romance aborrecido. São páginas e páginas de descrições dos uniformes garbosos dos hussardos de Napoleão, das glórias que eles aguardam ao combater os andrajosos espanhóis e, depois, uma longa e fastidiosa descrição de uma batalha, que acaba em sangue, lama e morte.

O autor quer-nos mostrar como os jovens hussardos eram iludidos com a honra e a glória de pertencerem a um regimento tão garboso, servindo a França e o Imperador; depois, a realidade das batalhas era bem diferente, degradante e tenebrosa.

Não valia a pena escrever um livro por isto.

“Sideways”, de Alexander Payne

sideways.jpgVencedor de dois globos de ouro e candidato a cinco í“scares, este filme do mesmo realizador de “About Schmidt” (com Jack Nicholson) é bem esgalhado e proporciona duas horas bem passadas.

Dois amigos decidem fazer uma viagem enóloga pelas vinhas da Califórnia. Miles (Paul Giamatti), é um professor de liceu, autor de um romance que ninguém está interessado em publicar, e tenta recuperar de um divórcio turbulento. Jack (Thomas Haden Church) é um actor medíocre que se vai casar no final dessa semana, depois de uma longa carreira de solteirão.

As peripécias que os dois amigos vão vivendo, ao longo da semana, a visão da vida, sempre pessimista, de Miles e sempre optimista de Jack, o encontro com duas amigas, que Jack convence Miles a engatar, tudo isto tendo como pano de fundo as provas de diversos vinhos californianos – provas que, por vezes, se transformam em grandes bebedeiras, são os ingredientes do filme.

Realizado ao estilo de road movie, “Sideways” foi uma agradável surpresa.

Gordon ou Magron?

Vinha aí um furacão, ia atingir os Açores e foi uma festa na comunicação social. Chamava-se Gordon e ia arrasar árvores, arrancar telhas, esbarrondar casebres, estilhaçar vidraças, afundar barcos. Haveria vários motivos de reportagem: mulheres a chorar, homens lamentando-se, todos pedindo subsídios ao governo.

Os telejornais entraram num frenesim de directos.

Em directo do Faial, em directo do Pico, em directo da Terceira.

Em todos eles, um repórter nervoso, relatava banalidades. Ao fundo, um oceano plácido, lambia os Açores calmamente.

A Protecção Civil fez o que lhe competia: mandou amarrar embarcações, fechar escolas, arregimentar funcionários, que passaram a noite em claro, í  espera da catástrofe.

Mas o tal Gordon, assim que se apercebeu que tinha errado o caminho e que ia passar por território nacional, rapidamente se transformou numa tempestade de trazer por casa.

Foi um flop.

Até os furacões nos ignoram, caraças!

Equipamentos alternativos

Ontem í  noite, ao fazer zaping ao acaso, reparei que, na Sport TV, estava a dar um jogo de futebol entre uma equipa de amarelo e outra de grená.

Como o aparelho estava com o pio cortado, demorei algum tempo até conseguir perceber quem estava a jogar.

Pois eram o Braga e o Leiria!

Desde quando é que o Braga abandonou o seu equipamento igual ao do Arsenal de Londres (camisola vermelha, com mangas e colarinho brancos) e passou a jogar de amarelo? E desde quando é que o União de Leiria deixou de equipar de branco e optou pelo grená?

Aliás, no outro dia, vi o Sporting jogar com camisolas cor de fezes de bebé e o Benfica, quando jogou contra o Copenhaga (que equipava de branco) vestia-se de laranja!

Eu sou do tempo em que um clube só mudava de equipamento quando as camisolas se podiam confundir com as do adversário. Por exemplo, o Benfica, quando recebia o Braga, fazia o favor de jogar de branco, para não haver confusões.

Agora, é o que se vê!

Não há dúvida: no futebol, deixou de haver amor í  camisola!

A União Nacional a caminho

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Marques Mendes anda muito contentinho porque conseguiu convencer Sócrates a assinar o Pacto da Justiça.

Agora, quer convencê-lo a assinar um Pacto da Segurança Social.

Parece-me correcto.

Já poucas coisas distinguem o PS do PSD.

Portanto, toca mas é a assinar pactos sobre tudo e mais alguma coisa, dissolver o PSD e criar, finalmente a União Nacional.

Depois, é só ilegalizar os restantes partidos.

“Sol” – um jornal novo, mas…

Saiu o novo semanário dirigido por José António Saraiva. Chama-se Sol e está a ser levado ao colo pela comunicação social em geral, com referências em todos os telejornais, entrevistas ao director, publicidade agressiva.

Sou um dependente de jornais. Aliás, sou a única pessoa que eu conheço que compra jornais todos os dias desde, pelo menos, há cerca de 30 anos. E sublinho que conheço muitas pessoas.

Já li o primeiro número do Sol e digo, está bem, saúdo o nascimento de um novo semanário que compita com o Expresso, mas

Mas“, aliás, devia ser o nome do novo semanário.

Era um bom título.

A conjunção adversativa “mas” define o espírito português.

“A vida corre-me bem, mas podia ser melhor”, “o tempo está bom, mas aposto que vai chover amanhã”, “a comida está boa, mas falta-lhe um pouco de sal”, “o colesterol baixou, mas os triglicéridos estão altos”, “o puto teve boas notas, mas ainda não sabe que curso vai seguir”…

Há sempre um mas

E o Sol publica, logo na primeira página, um Manifesto cheio de mas.

Vinte e seis mas!

Diz que é “apartidário mas não apolítico, isento mas não indiferente, rigoroso mas não burocrático, sereno mas não amorfo, ponderado mas não indeciso, responsável mas não previsível”, etc, etc.

Parece que, afinal, os adjectivos, em português, têm pouco significado.

Não é suficiente, por exemplo, dizer que o jornal é claro – é preciso acrescentar: mas não superficial”.

Não é suficiente afirmar que o jornal é directo – cumpre sublinhar: mas não simplista”.

Afinal, dizer que o Sol é um jornal “irreverente” obriga í  frase seguinte: mas não inconsciente”.

Não me agrada muito um jornal com tantos mas.

Mas, afinal, que tipo de jornal é este?

Desfolhei as suas 96 páginas e quase nada me surpreendeu: as mesmas notícias sobre a paupérrima politiquice nacional, uma sondagem irrelevante sobre quem foi o melhor presidente da república, um aspecto gráfico de gosto muito duvidoso, uma tentativa de agradar a gregos e a troianos, com assuntos muito sérios e trivialidades de revista cor-de-rosa, um espaço preenchido por Margarida Rebelo Pinto (o que raio terá esta senhora para nos dizer?), uma página verdadeiramente decepcionante de Marcelo Rebelo de Sousa, escrita como se fosse um blogue (que me interessa a mim o que o Marcelo faz, dia a dia?) – e a primeira página, então, é mesmo pobre. Como título-choque, os responsáveis do Sol escolheram o título: “Isaltino tem casa apreendida”. Quem é o Isaltino? Que me interessa a mim que um obscuro presidente da Câmara de um concelho minúsculo como Oeiras, tenha uma casa apreendida? É isto que os responsáveis do jornal consideram como notícia que mereça a primeira página do primeiro número de um novo semanário que se pretende “surpreendente mas não sensacionalista”.

Depois de ter ouvido, na RTP, Marcelo Rebelo de Sousa dizer, no seu comentário semanal, dizer que o objectivo do Semanário era levar Cavaco a primeiro-ministro e ter ouvido, hoje, no Telejornal, o tal Isaltino, dizer que o Sol tem como objectivo levar Marques Mendes a primeiro-ministro, começo a desconfiar do nobre intuito de A.J. Saraiva de fundar um jornal que seja uma alternativa ao Expresso. Aliás, no seu primeiro editorial, Saraiva ataca a decisão do governo de fechar maternidades, dizendo que foi um erro porque o interior vai ficar ainda mais desertificado. Nem uma palavra para o facto de essas maternidades, de facto, não terem as condições mínimas de segurança, nem uma palavra para o facto de não fazer sentido existirem maternidades a distarem 30 ou 50 km, ambas com pouco pessoal, ambas mal equipadas e que é muito mais seguro ter apenas uma maternidade bem equipada e com pessoal suficiente. Saraiva não tem autoridade para dar opiniões sobre uma coisa que desconhece em absoluto!

Será que Saraiva sabe que, se a maternidade não estiver devidamente equipada, aumenta o risco de morte neo-natal e de complicações graves para a mãe? Que é mais seguro transportar a grávida para um centro devidamente equipado, mesmo que este fique a 50 km do local de residência da futura mãe? Ou será que Saraiva pensa, como muitos portugueses, que deve existir uma maternidade em cada aldeia que, como não há obstetras em número suficiente (nem nunca haverá), poderá ter, ao serviço, uma senhora curiosa, que ajuda ao parto, como também ajuda nos abortos?

Basta que Saraiva imagine uma grávida que viva na Fonte da Telha e que comece com dores de parto a meio de uma manhã de domingo, em Agosto. Será que ele sabe quanto tempo é que essa grávida demorará a chegar ao Hospital Garcia de Orta, em Almada, tendo que percorrer a estrada até í  Costa da Caparica, cheia de veraneantes, com carros parados nas bermas, tudo entupido. Essa grávida, demorará mais tempo a chegar a Almada do que uma grávida de Elvas demorará a chegar a Badajoz, para parir o seu bebé. A solução será construir uma maternidade na Fonte da Telha?

Em resumo, para primeiro número, o Sol desiludiu-me. Claro que, como é a primeira vez, pode ser que a coisa melhor. A nossa primeira queca é, habitualmente, um fracasso e, depois, a gente vai melhorando. O problema é que os fundadores deste jornal são já homens batidos. Tinham obrigação de fazer melhor.

Enfim… um novo semanário que, de certo modo, não me entusiasmou… mas, para a semana, pode ser que seja melhor…

Sopranos – 5ª série (2004)

sopranos_5.jpgEsta talvez seja a série mais dramática dos Sopranos.

Velhos membros da Máfia são libertados, após longos anos de prisão. Entre eles, Tony Blundetto (Steve Buscemi), primo e companheiro de infância de Tony Soprano. Foi preso quando contrabandeava cassetes Betamax. Tony Soprano devia estar com ele, nesse momento, mas teve um dos seus ataques de pânico, depois de uma discussão com a mãe e safou-se da prisão.

Por esse motivo, Soprano sente-se culpabilizado pela morte do primo e, após a sua libertação, faz tudo para o apoiar – não porque goste genuinamente dele, não porque tenha, por ele, um verdadeiro afecto. No fundo, Soprano só se preocupa com ele próprio – mas as aparências, as regras da família, a honra, tudo isso se baralha na sua cabeça de psicopata.

O mesmo se passa na cabeça das restantes personagens desta série brilhante: Christopher não hesita em denunciar a sua namorada de tantos anos, quando descobre que ela colabora com o FBI; Carmela acaba por desistir da separação, a troco de um terreno para construir uma casa, que Tony lhe compra.

No final da série, Adriana e Tony B. são sacrificados, em nome da manutenção da Família.

A série Sopranos continua a ser, aparentemente, um retrato da Máfia norte-americana – mas também, um retrato de muitas famílias que por aí há, disfuncionais, onde os afectos são substituídos por regras sociais: o pai ama o filho mas, se for necessário, é capaz de o matar (mesmo que simbolicamente) para manter a ordem estabelecida.