“Amores Perros” – de Alejandro Gonzalez Ií±árritu

amorcao.jpgTrês histórias que se encontram num cruzamento, ou melhor dizendo, que se chocam num choque de automóveis: a do jovem que ganha umas massas com os combates entre cães, a da manequim, que tem um caniche, e que rouba o marido í  outra e a do vadio, ex-guerrilheiro, sempre rodeado de vira-latas, e que se transformou num assassino a soldo.

Três histórias que nos mostram três formas de amor entre humanos, e entre humanos e cães

Gostei mais da história do homem “maduro”, que engata a manequim boazona, acabando por abandonar a mulher. Pouco depois de se ter mudado para a casa nova, juntamente com a manequim, o caniche desta cai num buraco do soalho e, logo a seguir, ela sofre o violento acidente de viação, que é o ponto de encontro das três histórias.

O ritmo é bom, as histórias são interessantes, os actores são bons, a produção é profissional (só nome da produtora artística diz tudo: Brigitte Broche).

Com filmes destes, Hollywood fica com as orelhas a arder.

Puta da camioneta!

Ontem, enviei este mail para a Câmara de Almada:

“Caro Sr. vereador:
Muito bonitos, os espaços envolventes do MST, aqui, em Cacilhas, na avenida 25 de Abril.
Passeios amplos, rebaixados onde devem sê-lo, adaptados aos cidadãos com deficiência ou aos carrinhos com bebés.

Mas de que servem esses passeios se, invariavelmente, estão atravancados com carros?
Em anexo, segue uma foto de uma camioneta que, TODOS os fins-de-semana, está estacionada í  porta do prédio onde resido.
O que é preciso fazer para acabar com isto?!

Cumprimentos”

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Como não me responderam, hoje reenviei o mail. E tenciono reenviá-lo todos os dias, até que alguém me responda.

“Cultura – tudo o que é preciso saber” – de Dietrich Schwanitz

cultura.jpgGraças a um poder de síntese formidável, Schwanitz consegue, em cerca de 500 páginas, ensinar-nos tudo o que convém saber, para se ter uma Cultura, digamos, razoável.

O livro começa com a História europeia, continua com a Literatura, fazendo-nos um resumo de uma dúzia de obras fundamentais, passa pela História da Arte, pela História da Música, fala, depois, dos grandes filósofos, terminando com algumas considerações finais, as quais incluem o “que convém não saber”, porque ser culto também implica saber o que não se deve saber…

O tom do livro alterna entre o humor fino e frases inextricáveis, de difícil compreensão. É, portanto, impossível dizer qual é o tom geral desta obra, que seria muito mais fácil de ler se o autor estivesse sempre bem disposto. Segundo parece, Schwanitz morreu o ano passado, vítima de ataque cardíaco e não me custa pensar que, enquanto estava a escrever este livro, deve ter tido alguns maus momentos.

Mas quando estava bem disposto, a sua produção é um fartar de rir.

Para começar, o autor fala-nos nas obras fundamentais da cultura ocidental, como a Ilíada, a Odisseia e, claro, a Bíblia. No que respeita a esta última, depois de nos contar, muito resumidamente como Deus criou Adão e Eva e o Paraíso, comenta:

«foi assim que se deu o acontecimento que viria a ser conhecido como pecado original, com todas as suas consequências: a descoberta do sexo e da vergonha, a invenção da parra e da moral, a expulsão do jardim, a condenação a um trabalho remunerado regular e o estreitamento da bacia devido í  postura vertical com o acréscimo de um nascimento correspondentemente prematuro e, já agora, doloroso, um prolongado período de dependência total da criança, prazos educacionais prolongados e uma sobrecarga generalizada para a mulher, devido ao seu papel de liderança por ocasião do pecado original».

Para além de alguns momentos de humor, como este, o livro está cheio de aforismos muito acertados. Como este, a propósito da revolução americana: «as revoluções não eclodem quando as pessoas passam pior mas sim na altura em que pensam que pouco as separa de estarem melhor».

Schwanitz parece não nutrir grande simpatia pela psicanálise. A propósito dos psicanalistas, diz: «a psicanálise (…) criava os problemas cuja solução apregoava. Isso tornava o mercado insaciável. Quanto mais a psicanálise se divulgava, maior era a necessidade de reforços. Era como uma bebida que faz sede: uma espécie de necessidade que se reproduz a si própria, breve, uma droga».

Esta citação mostra que o autor não é imparcial. De facto, ao explicar-nos o que é importante para a nossa cultura, Schwanitz toma partido e dá-nos a sua opinião.

É também o caso desta citação, a propósito da Universidade e das novas “…ciências”: «cada vez mais especialidades envergaram o traje da ciência e estabeleceram-se nas universidades apesar de, na realidade, não passarem de práticas academicamente nobilitadas: é o caso do jornalismo, das artes teatrais, da investigação sobre o ensino das línguas, da direcção artística, da politologia e de diversas disciplinas psicológicas situadas algures entre o xamanismo e a banha da cobra».

O livro poderia ser ainda mais interessante se o autor não estivesse tão preocupado em escrever para alemães e se o texto não fosse, por vezes, tão complexo (a menos que haja, de vez em quando, algumas coisas que se perdem com a tradução).

Prison Break – 2

prisonbreak2.jpgOs manos Scofield conseguiram fugir da prisão mas os seus problemas só agora começaram. A Companhia – um conglomerado de multinacionais muito más, que dominam tudo e todos, incluindo a Presidente da República – não vai descansar enquanto não os apanhar. No seu encalço, coloca um agente do FBI com graves problemas psicopatológicos e um asiático-americano sem super-ego, capaz de matar toda a gente com um sorriso nos lábios.

Como sempre, Paul Scofield mantém aquele ar de menino que precisa urgentemente de uns beijinhos e de umas festinhas e não perde a calma em circunstância alguma. No fundo, parece tão psicopata como todos os outros.

Esta segunda série mantém os mesmos níveis de dependência, terminando cada episódio com algo que nos obriga a ter que ver o episódio seguinte, sob pena de não dormirmos descansados.

No entanto, começa com algo de pouco credível: o excelente T-Bag, consegue colocar a sua mão decepada numa geleira, que rouba a campistas e obriga um veterinário a re-implantar-lhe a mão. Vão dar banho ao cão!

Depois, ao longo desta fuga maluca, os manos Scofield mantêm uma máquina zero impecável, o que lhes confere aquele ar modernaço, sport-chic, mas nós não percebemos como arranjam eles tempo para ir ao barbeiro.

No último episódio desta 2ª série, o Big Chief da Companhia, que, afinal, é general e usa bata branca, parece que é uma espécie de cientista, que estará a testar o Paul Scofield. Se assim é, fica provado que os argumentistas ficaram sem ideias para esta série e escusam de fazer greves que, de mim, não levam aumento de ordenado.

Aguardemos…

Kadhafi aconselha: metralha com moderação

A cimeira Europa-ífrica, que decorre este fim-de-semana, em Lisboa, é uma autêntica colecção de cromos e, de entre eles, destaca-se o líder líbio, Muammar Kadhafi.

Kadhafi gosta de viajar com a tenda atrás. Não confia na segurança dos hotéis e prefere fazer ó-ó na tenda que transporta consigo. Este fim-de-semana, o homem mandou instalar a tenda no Forte de S. Julião da Barra mas, como a tenda não tem ar condicionado, parece que Kadhafi tem rapado um barbeiro dos antigos.

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Entretanto, fez publicar na imprensa, um anúncio de página inteira que é um verdadeiro monumento í s alucinações provocadas pelo deserto.

O anúncio começa com a frase «bem-vindos ao site oficial de Muammar Al Gathafi» e continua com a afirmação «a Convenção de Otava de 1997 deve ser revista».

Essa Convenção é sobre minas terrestres e Al Gathafi está de acordo com algumas partes do texto. Está de acordo, por exemplo, com a decisão de «retirar todas as minas anti-pessoal e anti-tanque e outras por explodir em cerca de 60 países» e está de acordo com «o tratamento e a reabilitação das vítimas».

No entanto, o líder líbio não está de acordo com:

«1. A total proibição do fabrico e utilização de minas terrestres

2. A destruição da reserva de minas terrestres»

Não sei porquê, mas parece-me que existe aqui uma contradição: por um lado, Kadhafi aceita que se destruam as minas ainda por rebentar, mas é contra a proibição do fabrico de novas minas!

E porquê?

O texto do anúncio é elucidativo: «os países fortes, que são capazes de violentar a terra dos outros para os destruir com as suas armas estratégicas mortais, nunca pensaram nas necessidades dos fracos que não têm armas ofensivas; que não têm outra coisa a não ser armas defensivas como minas.»

Por outras palavras: Kadhafi é contra as minas que não chegaram a explodir, nos países em que já não há guerra – mas é a favor de que as minas continuem a explodir nos países que ainda estão em guerra.

Enfim, o sol do deserto é forte e o aquecimento do encéfalo produz coisas deste género…

 

Mas o Público de hoje traz outro anúncio de página inteira, ainda mais curioso.

O anúncio chama a atenção para o site de Kadhafi, em www.algathafi.org.

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E tem esta frase engraçadíssima: «o perigo das armas metralhadoras contra os seres humanos baseia-se no seu uso exagerado».

É como o álcool, que se deve consumir com moderação – também as metralhadoras devem ser usadas com conta, peso e medida.

Metralha os teus inimigos, mas com moderação. Mata-os só um bocadinho, acerta-lhes só com meia dúzia de balas da tua arma metralhadora, não os fures todos de um lado ao outro, segue a palavra de Kadhafi.

Mas o líder líbio diz outras coisas que não parecem fazer sentido (lost in translation?…), como, por exemplo: «a análise intelectual é o código dos acontecimentos»; ou ainda: «pela piedade humana há necessidade de apoiar o meu apelo para anular as armas metralhadoras exceptuando as outras armas convencionais».

Por favor, Kadhafi, sai da torreira do sol, homem!

 

O socialismo e a merda

Ontem, o presidente Hugo Chavez espantou os jornalistas, ao dizer que a vitória da Oposição, no referendo que ele propí´s, tinha sido “una vitória de mierda”!

Truculento, Chavez classificava de merdósica, a vitória da Oposição, considerando a percentagem obtida (pouco mais de 50% dos votos).

No entanto, Chavez limitou-se a seguir a tradição dos políticos truculentos. Há-de haver por aí malta que ainda se lembra de Pinheiro de Azevedo, o almirante sem medo?

Para quem não se lembra, ou não sabe, eu recordo, ou informo: Pinheiro de Azevedo foi primeiro-ministro do 6º Governo Provisório, após o 25 de Abril de 1974. O país estava uma bagunça ingovernável. Nas ruas, os sindicatos, dominados pelo PCP, davam a ideia de que o Poder era deles. As pessoas não sabiam muito bem o que queriam para o país: uma democracia formal, í  moda do resto da Europa, uma democracia popular, í  moda sabe-se lá de quem (do Chavez, por exemplo?), um regime tipo-cubano, uma ditadura pura e dura, como os países da chamada Cortina de Ferro?

Certo dia, os trabalhadores da construção civil, com betoneiras e tudo, resolveram sitiar a Assembleia da República, com deputados e governo lá dentro.

Depois de muitas horas de negociações, os operários deixaram sair os deputados do PCP e mantiveram o cerco aos restantes “representantes da burguesia”. A páginas tantas, o primeiro-ministro, almirante Pinheiro de Azevedo, conhecido por não ter papas na língua, veio a uma varanda do edifício da Assembleia e, enfrentando os milhares de manifestantes, berrou: «Bardamerda para o socialismo!»

Azevedo tinha razão. Quem queria o socialismo com betoneiras a sitiar a Assembleia dos representantes da Nação, bem podia mandar esse socialismo í  merda?

O caso de Hugo Chávez é um pouco diferente e cheira mais a mau perder. Se a Oposição ganhou o referendo com pouco mais de 50% dos votos e foi “uma vitória de merda” – como classificar a derrota de Chávez?

Pontapés na língua

organizao.jpgNão é de agora. Há muito tempo que detecto erros ortográficos nos jornais, nomeadamente, no Público – erros incompreensíveis, até porque, hoje em dia, toda esta gente deve escrever com um software de correcção.

Há uns dias, era a palavra “obececado”, em letras bem grandes. Tive esse recorte em cima da secretária vários dias, mas acabei por deitá-lo para o lixo, já sem paciência para escrever.

Mas esta não passa.

Então, a Associação Cultural de Aradas e a Livraria de Santo António “organizão”?

É que este não é um erro de teclado. No que respeita a “obececado”, até admito que, ao teclar, o jornalista pudesse ter colocado um “e” a mais e não ter reparado que o corrector chamava a atenção para o erro.

No entanto, no caso de “organizão”, quem escreveu este pequeno texto deve estar mesmo convencido(a) que é assim que se escreve.

O texto saiu na Pública de 25 de Novembro.

Notícias desta choldra

Que país parvo é Portugal. Parvo no sentido latino do termo, isto é, pequeno. Pequeno no sentido de inferior.

Nos últimos dias, duas notícias têm merecido parangonas nos jornais e aberturas de telejornais: a explosão num prédio, em Setúbal e o facto de uma funcionária pública de Vitorino de Piães não ter sido reformada pela junta médica.

Vamos lá escalpelizar isto.

Comecemos por Setúbal: uma aparente fuga de gás num andar de um prédio, em Setúbal, provocou uma forte explosão, que destruiu os três últimos andares do edifício e causou grandes danos em todos os restantes andares e nos edifícios vizinhos.

E depois?

Depois, dias a fio, as televisões transmitiram, em directo, afirmações dos condóminos, da governadora civil, da presidente da Câmara, dos donos das lojas, de tipos da Protecção Civil, de todos e de cada um. Até vimos, em directo, um engenheiro do LNEC a explicar, com um esquema, como iria ser reforçada a estrutura do prédio, de modo a evitar um eventual desmoronamento.

Tenho muito respeito por Setúbal, que até é a capital do distrito onde vivo, posso sentir alguma solidariedade para com os habitantes do prédio, que ficaram com as suas casas destruídas e os seus haveres em fanicos – mas daí até considerar este episódio digno de directos nos telejornais, vai uma distância enorme.

Segunda notícia: uma funcionária da Junta de Freguesia de Vitorino de Piães, em Ponte de Lima, foi a uma junta médica, após três anos de baixa, e foi considerada apta para o trabalho. Os jornalistas consideraram que isto merecia ser notícia. Vimos, então, a anafada senhora, com o colar cervical da praxe, deitadinha na cama ou sentadinha no sofá, dizendo que sofre de uma doença degenerativa da coluna e que não pode sequer deslocar-se sozinha.

O espalhafato foi tanto, que o ministro das Finanças que, de doenças degenerativas da coluna percebe nada, veio a público dizer que a funcionária iria continuar de baixa e que seria submetida a nova junta médica.

A nova junta médica foi ontem e os meus colegas devem ter sido confrontados com um cenário que eu bem conheço: alterações degenerativas da coluna cervical e lombar, instabilidade da charneira lombo-sagrada, uma ou outra cervicartrose,  uncodiscratroses e, ao que parece, sequelas de uma eventual cirurgia a hérnia discal que, segundo os jornais, não terá corrido muito bem. Ora bem, tudo isto (menos a cirurgia) tenho eu e mais uns quantos milhões de portugueses. Arrisco-me a dizer que, depois dos 40 anos (a funcionária tem 43), toda a gente tem alterações degenerativas na coluna. Quanto a mim, só na coluna cervical, tenho três hérnias. Doença degenerativa da coluna não é o mesmo que, por exemplo, doença degenerativa do Sistema Nervoso Central – e se os jornalistas não sabem isto, perguntem a quem sabe.

A junta médica considerou a funcionária apta para o trabalho.

Como é natural…

Diz o DN: “recorde-se que até o ministro das Finanças tinha dito «ser óbvio que a situação tem de ser reanalisada e reapreciada»”

O que quer isto dizer? Que é óbvio que a senhora está incapaz para trabalhar? Agora é o ministro das Finanças ou os jornalistas que decidem estas coisas?

Como tem sido hábito os juízes, graças í s providências cautelares, decidirem a reabertura dos SAP, a repetição dos exames ou o pagamento de horas extraordinárias nas aulas de substituição, pode ser que, a partir de agora, sejam os jornalistas a decidir quem está incapaz para a sua profissão por doença invalidante.

E hoje, a cereja sobre o bolo: os elementos da Junta de Freguesia de Vitorino de Piães ameaçaram demitir-se se a situação da funcionária não for revista.

A isto chama-se democracia popular – ou não?

Não.

A isto chama-se choldra… e já no tempo do Eça assim era…