“O Cemitério de Praga”, de Umberto Eco (2010)

Se me perguntassem qual é o tema deste romance de Umberto Eco teria alguma dificuldade em fazer um resumo correcto, tal é a diversidade de acontecimentos e de personagens que povoam estas 557 páginas.

O livro é apresentado sob a forma do diário de um tal Simone Simonini, notário e falsificador, e única personagem inventada das histórias verídicas que percorrem os últimos anos do século 18, que passam por Turim, Palermo e Paris e envolvem Garibaldi, a Comuna de Paris, o caso Dreyfus, a guerra entre católicos, maçons e judeus, as voltas e as reviravoltas da espionagem e contra-espionagem. E muitas outras coisas.

Tantas e tão variadas que, por vezes, é difícil acompanhar a narrativa, ainda por cima porque, por vezes, ela recorre a flashback. Confesso que, às tantas, já não sabia muito bem a quem Simonini se referia. Para complicar ainda tudo isto, Simonini assume uma dupla personalidade, sendo por vezes o abade Dalla Picolla…

Por todo o texto perpassa um ódio intenso aos hebreus, como neste naco:

«E quando eu já era suficientemente crescido para entender, recordava-me de qu o hebreu, além de vaidoso como um espanhol, ignorante como um croata, cúpido com um levantino, ingrato como um maltês, insolente como um cigano, imundo como um inglês, gorduroso como um calmuco, imperioso como um prussiano e maledicente com um astiense, é adúltero por cio irrefreável – depende da circuncisão, que os torna mais erécteis, com uma desproporção monstruosa entre o nanismo da corporatura e a capacidade cavernosa daquela sua excrescência semimutilada.»

Dos padres, Simonini também não gostava:

«Começas a tê-los à tua volta assim que nasces, quando te baptizam, voltas a encontrá-los na escola, se os teus pais foram tão beatos que te confiaram a eles, depois há a primeira comunhão, e a catequese, e o crisma; o padre está no dia do teu casamento a dizer-te o que deves fazer no quarto, e no dia seguinte a perguntar-te na confissão quantas vezes fizeste aquilo para poder excitar-se por detrás da grade. Falam-te com horror do sexo, mas todos os dias tu os vês sair de um leito incestuoso sem terem sequer lavado as mãos, e vão comer e beber o seu senhor, para depois o cagar e o mijar.

Repetem que o seu reino não é deste mundo, e metem as mãos em tudo aquilo que podem roubar. A civilização não chegará à perfeição enquanto a última pedra da última igreja não tiver caído sobre o último padre, e a Terra tiver sido libertada daquela escória».

Mas além odiar os judeus, desprezar os padres e não poder com os jesuítas, também não vai muito à bola com os alemães:

«Aos alemães conheci-os, e até trabalhei para eles: o mais baixo nível de humanidade concebível. Um alemão produz, em média, o dobro das fezes de um francês. Hiperatividade da função intestinal em prejuízo da cerebral, que demonstra a sua inferioridade fisiológica. Nos tempos das invasões bárbaras, as hordas germânicas cobriam o percurso com montões desrazoáveis de matéria fecal. Por outro lado, também nos século passados, um viajante francês percebia imediatamente se já tinha atravessado a fronteira alsaciana pela anormal dimensão dos excrementos abandonados ao longo das estradas. Mas se fosse só isso: é típica do alemão a bromidrose, ou seja, o odor repugnante do suor, e está provado que a urina de uma alemão contém vinte por cento de azoto, enquanto a das outras raças apenas quinze.»

E, de quando em vez, frases como esta: «uma mística é uma histérica que encontrou o seu confessor antes do seu médico».

Há autores que ficam colados a um determinado livro e será difícil que Umberto Eco se consiga descolar de “O Nome da Rosa” e, mesmo sem querer, acabamos por fazer comparações.

Mas é verdade que “O Cemitério de Praga” não me despertou tanto interesse.

4 thoughts on ““O Cemitério de Praga”, de Umberto Eco (2010)

    1. Se não valesse a pena não o tinha lido até ao fim, mas lá que é confuso, é… no entanto, vale pela descrição de uma época conturbada e pelo facto de tudo o que é narrado ter, de facto, acontecido.

  1. Olá Artur
    Comecei a ler e fiquei totalmente baralhado.Mas…
    Enquanto ia avançando,lá me fui desbaralhando.Porque aquilo começou a parecer-me a história confusa de um tipo que odeia toda a gente,principalmente certa gente.E que por dinheiro vai usando o seu talento de falsificador para destruir com prazer aqueles que mais odeia.Acho interessante que acabe por exercer o seu miserável serviço não só contra os judeus, mas tambem contra maçons,jesuitas,e tudo que seja ligeiramente progressista.A ponto de,sem querer, até ser usado pelo Hitler.Julgo que conheço vários fulanos assim.Até aqui em Portugal.

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