Brevíssima História do Comércio

O comércio foi inventado muito antes da escrita. Por isso mesmo, não existem documentos escritos sobre a invenção do comércio. De qualquer modo, a tradição oral, aquela que passa de boca em boca graças aos meios de ressuscitação em caso de afogamento, permite que tenhamos uma ideia, ainda que pálida, porque anémica, de como tudo começou. Ou talvez mia sou menos.

Foi para aí na Pré-História, no chamado período Triácico Inoxidável que o homem, então denominado troglodita, descobriu a pedra lascada, que era uma espécie de faca sem cabo, sem gume e sem faca, mas que servia para cortar. Consta que um troglodita perdulário fabricou quatro pedras lascadas, embora só necessitasse de uma.  Ficou aflito, sem saber o que fazer com as outras três.  De súbito, lembrou-se que o troglodita que vivia na caverna ao lado, tinha muito jeito para fabricar os mais diversos objectos, nomeadamente, corta-unhas, pisa-papéis e chapéus de chuva. Logicamente, ou talvez não, o nosso amigo troglodita, trocou as pedras lascadas que lhe sobravam por dois corta-unhas e um pisa-papéis muito bonito, daqueles que parece terem neve por dentro, quando se agitam, vocês sabem…

Estava inventado o comércio. Esta actividade especificamente humana foi-se desenvolvendo ao longo dos tempos e, alguns séculos depois, era frequente ver-se qualquer Kit Karson trocar colares, pulseiras ou na~eis peal amizade dos peles vermelhas.

No caso particular dos portugueses, a época dos descobrimentos foi áurea no que respeita ao comércio com outros povos. Sabe-se que, após a descoberta do caminho marítimo para a Índia, era frequente ver-se portugueses a trocarem bíblias, terços e figurinhas religiosas por canela, tíbias, perónios e mesmo pimenta.

Quanto ao comércio que desenvolvemos com os povos do continente africano, os negócios foram um pouco mais escuros, quer por mor da cor da pele dos africanos, quer porque habitualmente era noite e Edison ainda não tinha inventado a lâmpada.

Com o desenvolvimento do comércio, descobriu-se a exportação e a importação, que vieram revolucionar tudo ou, pelo menos, metade.

Como no caso da penicilina e do bicarbonato de potássio, a descoberta do export-import foi absolutamente fortuita. Conta-se que um inglês, de nome Colbert, ou Albert, ou mesmo Tony, possuindo café a mais em casa, decidiu atirá-lo pela porta fora. Por ironia do destino, o pacote de chá foi parar í s mãos de um canadiano imigrado, que passava por acaso. Estava feita a primeira exportação da História. Mas o referido cidadão francês teve mais sorte ainda quando o australiano, demonstrando uma honestidade insuperável (este texto está a ficar muito intelectual…) decidiu devolver o pacote de milho ao jugoslavo. Era uma importação.

Algum tempo depois, um francês, de nome Robespierre, teorizou o mercantilismo que, muito resumidamente, dizia que tudo pode ser comerciável, desde que existam palermas que comprem.

É este, ao fim e ao cabo da roca, a base de todo o comércio dos nossos dias. Desde que se tenha jeito, consegue-se vender pentes a carecas e enciclopédias a analfabetos.

  • in Pão comManteiga, programa da Rádio Comercial – 19 de julho 1981

O plurai dos animales

Aliás, o plurão dos animãos, melhor, o plurãe dos animães, ou ainda, o pruril dos animões

Um pouco de gramática nunca fez mal nenhum a ninguém. Por isso, chamamos a tenção do ouvinte inteligente, para o plural dos mamíferos.

Note que, se o plural de chacal é chacais, o plural de cavalo poderia ser cavais. Mas não é ““ é cavalos. Nesse caso, o plural de leão deveria ser leãos. Mas também não é ““ é leões. Logo, o plural de cão, poderia ser cões. Mas, mais uma vez, não é ““ é cães. Então, o plural de leão poderia ser leães ou leais. Mas é leões, como já vimos. Nesse caso, o plural de chacal deveria ser chacões, ou chacães, ou chacalos ““ mas é chacais. Vai daí, o plural de cão, deveria ser cais, ou cãos, ou mesmo calos.

E chegou a altura de entrarmos em linha de conta com a noção de conjunto, para tentar facilitar as coisas.

Saber-se que um conjunto de porcos é uma vara. Nesse caso, um conjunto de touros deveria ser uma tara. Mas não é ““ é uma manada. Então, um conjunto de camelos deveria ser uma camada, mas é uma cáfila. Então, um conjunto de lobos deveria ser uma lófila, mas é uma alcateia. Pelo que um conjunto de cães poderia ser uma caneia ““ mas é uma matilha. Donde se deduz que um conjunto de bestas deveria ser uma bestilha ““ mas é uma récua.

Como se vê, esta história do plural dos mamíferos tem muito que se lhe diga.

No entanto, no que respeita ao homem ““ que, como se sabe, também é um mamífero ““ as coisas são muito mais fáceis.

Assim, o plural de homem pode ser homens, tipos, gajos, fulanos ou mesmo filhos da mãe.

No mesmo sentido, um conjunto de homens pode ser um grupo, uma manda, uma cáfila, um bando, uma quadrilha, um pelotão, uma companhia, uma cambada, uma maralha, uma multidão, uma manifestação, um monte, uma molhada, um ajuntamento, uma concentração ou ainda uma mole imensa.

– in Pão com Manteiga, programa da Rácio Comercial, tema “Mamíferos”, 12/7/1981 e também PcM revista nº 5 ““ outubro 81

Expressamente lixo

Entre 1974 e 1977 fui jornalista. Com carteira profissional. Trabalhei na redacção do Telejornal da RTP. Naqueles tempos conturbados do post-25 de Abril, fui sub-chefe de redacção, responsável pela última edição do Telejornal, que ia para o ar já depois da meia-noite.

A 28 de Outubro de 1977, já com o curso de Medicina terminado, deixei a profissão. Organizaram-me um jantar de despedida, no restaurante “O Jacinto“. Presentes cerca de 50 jornalistas da RTP (Hélder de Sousa, Cesário Borga, José Eduardo Moniz, Adriano Cerqueira, Mário Cardoso, Avelino Rodrigues, Nuno Vasco, Bessa Tavares, Pedro Luís de Castro, Sarsfield Cabral, Carlos Albuquerque e muitos outros.

Fiz um discurso, claro.

Do alto dos meus 24 aninhos, zurzi nos jornalistas, como correias de transmissão do Poder.

O discurso terminava com esta frase:

“Espero que um dia destes, os jornalistas constituam uma espécie em vias de extinção. Paulatinamente, serão substituídos pelos mensageiros da correspondência colectiva”.

De certo modo, estava a antecipar as redes sociais, e não podia adivinhar que elas poderiam ser tão más ou piores que os jornalistas…

Tudo isto vem a propósito do título de primeira página do Expresso de ontem.

Os tipos da página Os Truques da Imprensa Portuguesa têm desmontado, com eficácia, coisas semelhantes, mas elas não param!

—Portanto, segundo o título do Expresso, António Costa deu 1200 milhões de euros ao PCP e ao Bloco de Esquerda!

Mas onde é que isto já chegou?!

Os partidos da chamada geringonça já negoceiam milhões entre eles?

Logo no subtítulo, ficamos a saber que desses 1200 milhões, metade vai para os pensionistas que, como toda a gente sabe, são todos do PC ou do Bloco…

Vejamos então o que diz a notícia, no interior do jornal:

“As cedências do Governo aos partidos de esquerda vão custar cerca de 1200 milhões entra 2016 e 2019. Este valor corresponde ao acréscimo de despesa (ou diminuição da receita) acumulado durante os quatro anos de legislatura perante o que estava originalmente previsto pelo PS. É um montante que corresponde a cerca de 0,5% do PIB mas que, na prática, acaba por não ter grande impacto orçamental já que está diluído por vários anos e, além disso, o crescimento económico tem batido as expectativas iniciais.”

Se um tipo ler só o título, fica indignado com o facto do Costa andar agora a dar milhões aos parceiros da geringonça e depois, afinal:

  1. O dinheiro é para os portugueses, independentemente de quem votam;
  2. Os 1200 milhões são distribuídos ao longo de quatro anos
  3. O impacto desse montante no PIB é desprezível

Sendo assim, qual é a grande manchete do Expresso de ontem?

Porra nenhuma!

Conversas em Família nunca mais! 25 de Abril sempre!

E é por isso que, para mim, o 25 de Abril será sempre recordado!

Ora tomem lá alguns excertos da Conversa em Família, do Presidente do Conselho, Marcello Caetano, de 4 de Julho de 1972 (recordo que esta Conversa era transmitida pela RTP, canal único de televisão; o sr. Presidente estava sentado num cadeirão, ao lado de uma lareira e falava-nos em tom professoral e condescendente, como qualquer ditador bom, por oposição ao ditador mau, o que tinha caído da cadeira):

Desde que o Senhor Almirante Américo Thomaz se presta ao sacrifício de continuar a exercer a Presidência da República, onde, dom tanta dignidade e devoção, tem servido os supremos interesses do País, só temos de agradecer a Deus o não sermos forçados a difíceis opções.”

Sobre a guerra colonial:

“Guerra colonial?
O sentido da frase é só um: chamou-se assim í s campanhas outrora sustentadas por uma potência para submeter um território ao seu domínio, combatendo a rebelião das populações ou anexando países em estado primitivo.
Ora é fácil de ver que nada disso se verifica no Ultramar português.
Os territórios das províncias ultramarinas estão em paz e ninguém neles contesta a sua integração na Nação portuguesa.
Percorre-se a Guiné, anda-se pela vastidão da terra angolana, desloca-se quem quer que seja de lés a lés de Moçambique e não encontra populações revoltadas.
A vida decorre, por toda a parte, tranquila e normal, num ambiente de trabalho e de entendimento exemplares.
…e se a paz está perturbada, isso deve-se í s guerrilhas que sem o apoio político, financeiro e militar de potências estrangeiras, teriam desaparecido há muito”.

E Marcello sabia como se deviam construir as sociedades africanas:

“As sociedades africanas têm que ser construídas fraternalmente pelos brancos e pelos pretos, fornecendo uns a sua experiência e tecnologia, e dando os outros os elementos válidos da sua cultura.”

As Conversas em Família foram alguns dos momentos mais tristes de uma ditadura saloia, pobre, isolada e envergonhada.

A coisar na net há 16 anos

Fez no passado dia 1 de Novembro 16 anos que meti o Coiso na net.

Como qualquer Coiso que se preze, também este passou por várias fases. Há uns anos que estacionou em WordPress, mas mantém-se activo.

Para recordar algumas dessas fases, é só seguir este link.

Mariquices com gin

Conheci o Mário-Henrique Leiria em 1973. Com ele colaborei no suplemento Fim de Semana, do jornal República e na revista humorística Pé de Cabra, com ele inventámos O Coiso, o semanário com maior penetração em Portugal… pelo menos, durante as 13 semanas em que durou…

Tudo isto para dizer que foi o Mário-Henrique que me ensinou a beber gin tónico.

Como se sabe, por essa altura, MHL publicou Contos do Gin Tónico e os Novos Contos do Gin Tónico.

Eu devorei esses dois livrinhos e bebi-os, por assim dizer.

Durante anos, bebi um gin tónico antes de uma ou das duas refeições principais.

Foi um vício que durou anos.

Dois dedos de gin, uma rodela de limão, três cubos de gelo e água tónica Schweppes.

bosfordO gin, durante muitos anos, foi o proletário Bosford, que o dinheiro não abundava.

Acrescente-se que as marcas de gin também não eram muitas… ainda cheguei a iniciar uma colecção de garrafas de gin (vazias, claro), mas acabei por desistir porque não devia passar das dez ou doze marcas diferentes.

Com calor ou frio, de inverno ou de verão, não dispensava o meu gin antes da refeição. Costumava dizer que era imune í s gripalhadas graças ao quinino da água tónica…

Em ocasiões especiais, lá ia uma garrafita do Gordon’s…

Com o tempo, o whisky ocupou o lugar do gin e, hoje em dia, é raro beber um gin.

E é agora que o gin está na moda, com bares que lhe são dedicados e outras mariquices, como esta, publicada no Notícias Magazine da semana passada, e que se intitula Como preparar um gin perfeito, e que segue 8 passos, a saber:

“1 – Com o descascador de legumes, corte uma tira do vidrado da casca de limão, bem fina, sem a polpa branca

2 – Dobre a tira da casca do limão ao meio, no sentido longitudinal, apontando para o interior do copo, para que este fique impregnado do aroma do limão

3 – Em seguida passe a casca pelo rebordo do copo

4 – Encha o copo de gelo até meio e rode-o várias vezes, para assim refrescar toda a superfície do mesmo

5 – Com a ajuda do coador, escorra a água resultante da operação anterior e encha o copo com gelo, mesmo até ao topo

6 – Coloque o seu gin preferido, na proporção de 1/3 de gin para 2/3 de água tónica

7 – Por fim, adicione a água tónica. E porque «o mais importante é preservar a bolha», verta a água tónica cuidadosamente. Usando o cabo da colher, deixe a água escorrer lentamente para o interior do copo

8 – E porque o gin tem uma densidade diferente da água, para misturar, dê uma volta com a colher, mas apenas uma volta.”

Fim de citação.

Quer dizer: quando, finalmente, um gajo vai beber o gin, já está tão cansado, que prefere despejar uma mini!…

Esta lenga-lenga gourmet faz-me lembrar os gozos do Voví´ Gasosa, um dos pseudónimos do MHL.

Recordo este O Coizinheiro – Papas com sarrabulho, publicado no nº 4 de O Coiso (28/3/1975):

“Ingredientes

2 Papas, gordos

12 extremistas de esquerda, normais

Sal, suficiente

Pimenta, também

2 folhas de papel branco, grandes

1 travessa de açorda de sável, quente

2 garrafas de vinho branco, fresco

1 garrafa de gin

Como preparar

Pegam-se no Papas, sacodem-se bem e reservam-se.

Numa das folhas de papel branco (grande) escreve-se em caixa alta O DOUTOR CUNHAL VAI SER REI DE PORTUGAL (brincadeira, claro). Põe-se a folha í  janela.

Na rua, os doze extremistas começam aos pulos. Bom sinal.

Abre-se a primeira garrafa de vinho branco e imediatamente se escreve, na segunda folha de papel branco (grande), também em caixa alta, MAO TSÉ-TUNG ESTí GAGí (brincadeira, é evidente). Põe-se a folha í  janela.

Na rua, os doze iniciam o sarrabulho. Tudo a correr pelo melhor.

Exactamente nesse momento (para evitar esturro), sacodem-se de novo os dois Papas reservados e, pela janela, lançam-se os mesmos, com bastante sal e pimenta.

O sarrabulho atinge o ponto excelente.

Quando se começarem a ouvir as estaladas, é sinal que o cozinhado está na conta. Abre-se a segunda garrafa de branco.

O sarrabulho resultou totalmente.

Os convivas sentam-se então í  mesa e comem a açorda de sável, com o branco fresco.

No fim, bebem a garrafa de gin. Toda”.

E nada de mariquices!

Ray Manzarek – mais uma porta que se fecha

A primeira canção dos Doors de que me lembro: Hello, I Love You.

ray manzarekCurta e eficaz. Destaque para o vozeirão de Jim Morrison e para as teclas de Ray Manzarek, que morreu ontem, vítima de cancro biliar, aos 74 anos.

Morrison e Manzarek formaram os Doors, em Chicago, em 1965, juntamente com Jonh Densmore (bateria) e Robby Krieger (guitarra).

Nos anos 60, em Portugal, ouvia-se António Calvário, Artur Garcia, Simone de Oliveira, Gianni Morandi, Sylvie Vartan, Adamo.

Ouvir, na rádio, uma canção dos Beatles, era quase uma cena clandestina.

A pouco e pouco, a pop britânica foi ganhando espaço e, í s tantas, já era banal ouvirem-se as coisas mais soft: Herman’s Hermits, Bee Gees, Hollies; ou os americanos mais inofensivos: Beach Boys, Turtles.

Mais raro era escutar os Rolling Stones (Let’s Spend the Night Together foi considerado obsceno!) e os Doors.

Destes, o Light My Fire era o tema mais conhecido, embora fosse mais fácil ouvi-la na versão do José Feliciano, do que na dos Doors – e nunca foi a minha preferida.

Sempre gostei mais do já citado Hello, I Love You, e de Strange Days, Riders of The Storm, Love Me Two Times, para não falar no fundamental The End, sobretudo acompanhado das imagens de Apocalipse Now!, de Coppola.

Nos anos 60, as bandas (dizia-se, os conjuntos…) raramente tinham teclas nas suas formações. Lembro-me dos Animals, Spencer Davis Group, Procol Harum, Moody Blues – mas as teclas de Manzarek eram diferentes e, na música dos Doors, tinham muito mais importância que as guitarras.

Com a morte de Jim Morrison, os Doors morreram também, embora Manzarek tenha continuado a sua vida como músico.

Mas, como se sabe, o que já foi, não volta a ser.

25 de Abril sempre!

* «Esse homem extraordinário que é o Presidente Marcello Caetano, sempre presente no coração e na alma de todos os portugueses que compreendem o esforço gigantesco desenvolvido pelo Chefe do Governo a favor da elevação social do povo português e do engrandecimento de Portugal»

– Afonso Marchueta, governador civil de Lisboa, 27 agosto 1973

* «No campo social também há a reacção, como no campo fisiológico; se é justo reagir contra e febre e a doença, porque não reagiremos contra a revolução e todas as moléstias do corpo social? Com justiça, pois, nós somos, nossos princípios são, reaccionários»

– José Pequito Rebelo, jornal “O Debate”, janeiro 1972

* «Na hora presente em que Goa criada por Albuquerque vive num cativeiro, sob o peso da abominável tirania indiana, exclamemos com aquele veterano de longas barbas, coberto de cicatrizes, batendo no túmulo com o seu bordão: “Levanta-te, capitão, que se perde o que ganhaste!”»

– Editorial do jornal “Heraldo”, janeiro 1972

* «Esta triste realidade significa que o ofício de governar se está a tornar cada vez mais difícil e árduo, exigindo, além de inteligência, de tacto, de sabedoria e de persistência, sobretudo de muita e inflexível firmeza contra a degradação, a indisciplina, os desmandos e os acto de puro banditismo. (…) Trabalhar no sentido de pí´r termo ao retrocesso moral, veneno subtil que está provocando a poluição das almas, para mim a mais grave e perigosa poluição dos tempos actuais».

– Amério Thomaz, presidente da República, janeiro 1973

5 anos sem fumar!

Faz hoje 5 anos que deixámos de fumar! Fumámos durante 39 anos e agora, custa-me a perceber como fui capaz de fumar durante tantos anos!

Para quem ainda fuma, aqui fica a prova provada de que é possível, desejável, vantajoso e formidável, estupendo, fantástico e abracadabrante deixar de fumar!

Tudo melhora: o olfacto, o paladar, a resistência física, a libido, a respiração, a saúde em geral, o apetite, as finanças, a limpeza da casa e do carro, diminui a possibilidade estatística de teres um acidente cardiovascular e/ou um cancro, os beijos têm mais sabor, as viagens de avião são mais fáceis de suportar, não precisas de fazer figuras tristes nos aeroportos, a correr lá para fora, para poderes fumar um cigarrinho, terminas a refeição calmamente e saboreias o café nas calmas, sem a preocupação de ter que acender o cigarro, diminui a possibilidade de incêndio na habitação, podes brincar com os teus netos, sem medo de os queimares com o cigarro ou de os intoxicares com o fumo, deixas de fazer figuras idiotas a tentar acender cigarros quando está vento e, sobretudo, deixas de fazer aquelas boquinhas parvas a tentar fazer argolas com o fumo, acabam-se os dedos amarelos, acabam os cinzeiros pirosos a servir de biblots em tudo o que é mesa de apoio, armário ou prateleira, já não precisas de fumar um cigarro depois do orgasmo e podes ocupar as mãos e a boca com coisas mais interessantes, as caminhadas são mais fáceis, já não entras em pânico se o elevador estiver avariado e tiveres que subir 6 andares a pé, deixas de ter o teclado do computador cheio de cinza e vais sentir-te bem, muito bem – e, sobretudo, sentir-te-ás livre!

Ray Bradbury – morreu o autor de Fahrenheit 451

No passado dia 5, morreu Ray Bradbury. Tinha 91 anos e foi um dos mais influentes autores de ficção científica.

—Ficou famoso, sobretudo, por Fahrenheit 451, novela publicada no ano em que eu nasci, 1953.

Muito antes de ler o livro, li a adaptação cinematográfica que François Truffaut fez de Fahrenheit 451. O filme foi estreado em Portugal em dezembro de 1967 e já não me lembro se o vi no Estúdio 444 ou no Quarteto.

Lembro-me, no entanto, que o filme me impressionou, não só pela  Julie Christie, que impressionava muito boa gente nos anos 60, mas sobretudo pela história: uma sociedade onde os livros são proibidos; quem é apanhado com livros é severamente castigado e os livros são destruídos por uma brigada especial de bombeiros, que os queimam í  temperatura de 451 graus Fahenheit. Por isso, os defensores dos livros decidem decorar as grandes obras; cada militante é um livro. Encontram-se clandestinamente para recordarem, uns aos outros, as grandes obras, que assim se manterão, através da tradição oral.

E não terá sido através da tradição oral que as grandes obras nasceram?

Bradbury foi ainda autor de muitas short stories de ficção científica, muitas delas adaptadas ao cinema ouÂ í  televisão.

De Bradbury, para além de Fahrenheit 451, li ainda Muito Depois da Meia-Noite (Long After Midnight, 1974) e A íšltima Cidade de Marte (I Sing The Body Electric, 1948-1969), duas colectâneas de contos publicadas na colecção Argonauta, da qual fui fã na década de 80, e também o romance A Morte é um Acto Solitário (Death is a Lonely Business, 1985).

Entretanto, afastei-me da ficção científica e acho que já não tenho muita pachorra para esse estilo de histórias; ou então, escasseiam autores como Bradbury, Asimov, Philip K. Dick ou Robert Heinlein.