Sonho (Crónicas do Solnado – 27.4.1984)

Entre dezembro de 1983 e março de 1985 escrevi mais de 30 crónicas que foram lidas e interpretadas pelo Raul Solnado, primeiro, no programa Fim de Semana, na RTP-1, depois no Programa da Manhã, da Rádio Comercial.

Dizia o poeta que “o sonho comanda a vida”.

O pior é que, depois, muitas vezes, é a vida que estraga o sonho.

É precisamente do sonho que vos venho falar hoje.

Segundo o dicionário, “o sonho é uma associação de imagens frequentemente desconexas e confusas que se formam no espírito de uma pessoa, enquanto dorme”.

Quer isto dizer que sonhar é relativamente barato e não necessita de muitos apetrechos: uma cama e uma almofada, se não formos muito exigentes.

No entanto, os sonhos podem ser inconvenientes.

Por exemplo, não fica nada bem a um polícia passar a noite a sonhar com ladrões…

Nem um espião deverá, em caso algum, sonhar alto…

Assim como não fica nada bem a um cangalheiro, ter sonhos cor-de-rosa.

O sono e o sonho parecem, então, estar intimamente ligados.

Diz-se até que o modo com a gente dorme, pode ter influência sobre os sonhos.

É, portanto, natural que um sujeito que tenha o sono pesado, sonhe com elefantes, tanques de guerra ou feijoadas…

Pelo contrário, uma pessoa com o sono leve terá tendência para sonhar com algodão, plumas ou copos com água mineral…

Por vezes, temos sonhos premonitórios… e recordo o caso daquele meu amigo que, certa noite, sonhou com o número da sorte grande… só que o número estava lá muito ao longe, e como ele é míope, não o conseguiu distinguir. Desde essa noite, passou a dormir sempre de óculos, mas só tem sonhado com matrículas de carros!

Também toda a gente saber que, quando acordamos, raramente nos lembramos dos sonhos.

É por essas e por outras que muitos homens nunca chegam a encontrar a mulher dos seus sonhos…

Mas se o sonho está muito ligado ao sono, bonito, bonito é sonhar acordado.

É graças a isso que a Humanidade tem dado grandes passos em frente e grandes trambolhões.

Qual de nós nunca sonhou acordado?

Pelo menos por enquanto, cada um pode sonhar com aquilo que lhe apetecer e ninguém tem nada com isso.

Só que sonhar é fácil, mas do modo como avida está, o que é difícil é adormecer.

Boa noite e façam o favor de sonhar e  ser felizes.

Eu tive um sonho

Eu tive um sonho: o Benfica ia à Madeira e ganhava 6-0 ao Marítimo.

A última vez que eu vi o Benfica dar uma cabazada foi há 3 anos, quando ganhou, na Luz, 7-0 ao Paços de Ferreira.

Goleadas fora, só no século passado. Foram 7-1 ao Olhanense, no ano em que nasceu o meu filho, há 35 anos e 9-0 ao Beira-Mar, em 1966.

Por isso, goleadas, hoje em dia, só em sonhos.

Então, o sonho era assim:

O primeiro golo era do Reyes, de penalti. Depois, na sequência de um canto, Katsouranis desviava ao primeiro poste e Suazo marcava, ao segundo. Também na sequência de um canto, Luisão encostava o pé na bola e fazia o terceiro. Mais tarde, de fora da área, Suazo rematava à Eusébio e marcava o quarto. Para acabar, Nuno Gomes marcava dois: o quinto, a passe de Balboa e o sexto, a passe de David Luiz.

Foi um sonho tão agradável que decidi não acordar, por enquanto…