O facto do cardeal de Lisboa ter aconselhado continência aos recém-casados despertou-me a curiosidade no que respeita ao significado dessa palavra.
Continência significa, então, privação (voluntária ou forçada) dos prazeres sexuais, mas também, cortesia militar.
Não deixa de ser curioso que a mesma palavra possa ter este duplo sentido: por um lado, privares-te de um prazer sexual e, por outro, ser cortês militarmente falando…
O que nos leva ao verbo foder.
A palavra foder é considerada uma obscenidade, mas não temos alternativa.
Se, em vez do verbo cagar (outra obscenidade), podemos dizer evacuar e se, em vez de mijar, podemos dizer urinar, em vez de foder, dizemos ter relações, o que é pouco adequado.
E é sempre no plural, não sei se já repararam.
Posso dizer, por exemplo, “tenho uma relação com o meu cão”, mas nunca “tenho relações com o meu cão”.
Isso seria zoofilia.
Portanto, ninguém diz “ontem tive uma relação com a minha mulher”, mas sim “ontem tive relações com a minha mulher”.
Mesmo que só tenha sido uma vez.
Claro que se disser “fodi a minha mulher” ou “comi a minha mulher”, é uma ordinarice.
Em suma, foder não tem termo alternativo – e comer, embora se conjugue da mesma maneira, também não se deve usar neste contexto.
No entanto, há tempos verbais que dão mais categoria ao verbo foder.
Se usarmos, por exemplo, o futuro simples, na segunda pessoa do plural, e dissermos: “se vós foderdes”, até parece uma coisa monárquica.
Voltando ao cardeal patriarca.
D. Manuel Clemente, no fundo, disse aos recasados: “ide e guardai continência”.
Ora aí está outro verbo curioso: o verbo ir que, de certo modo, está relacionado com o verbo foder, já que o objectivo final de foder é vir-se, que é a forma reflexa do verbo ir.
Em conclusão, e ao contrário da opinião do cardeal, dir-vos-ei, casados, solteiros e recasados, ide e fodei em paz.
E que o Senhor vos acompanhe, se for caso disso…
Por acaso (ou não) o verbo foder tem alternativa: fornicar. Este termo já não é considerado obsceno e, de certa forma, até é mais engraçado. Assim, D. Manuel Clemente poderia ter dito em vez de “ide e guardai continência” a frase “ide e abstei-vos de fornicar”, ou então “ide e deixai-vos de fonicanços que nem uns coelhos danados”, o que tinha muito mais impacto.
Concordo!