Jornadas da Juventude Envelhecida

Se estivéssemos na Primeira República, o Papa vinha a Portugal mas era em gesso! Nesses tempos, tínhamos um regime verdadeiramente laico.

Agora, os pichas-moles do governo, cederam ao presidente beato e vamos levar com as Jornadas Mundiais da Juventude e com Portugal transformado numa enorme sacristia. Não vai faltar o cheio a estearina queimada e a bafio. Ainda me lembro bem de S. Marcelo a agitar os bracinhos e a gritar “…Conseguimos! Conseguimos!”

Estive a ler, por curiosidade ateia, o programa das Jornadas e fiquei estupefacto com a falta de originalidade dos organizadores.

As festividades começam na chamada Colina do Encontro. Sabem onde fica? Pois, no Parque Eduardo VII.

Dar o nome de um monarca britânico ao parque já foi uma ideia abstrusa, mas renomeá-lo Colina do Encontro ainda é mais estranho. Conhecendo a fama de que goza o parque, no que respeita a encontros mais ou menos suspeitos, e aliando isso í  tradição de abuso de menores no seio da santa madre igreja, temos de concordar que Colina do Encontro não foi uma boa ideia.

Depois de se encontrarem todos na tal colina, segue-se uma vigília no Campo da Graça, que não fica na Graça, mas sim no Parque Tejo. E por que se chama Campo da Graça? Porque é lá que se vão realizar os Encontros Rise Up. Diz o programa que Rise Up é um novo modelo de catequese, mas a mim soa-me a mais uma ordinarice. Rise up quer dizer levantar-se, aumentar, vir í  superfície… malandrecos, estes católicos…

Segue-se a chamada Cidade da Alegria, o que não espanta. Depois dos encontros na colina e de se terem levantado, estão todos muito alegres. A Cidade da Alegria é um espaço que junta a Feira Vocacional e o Parque do Perdão. Está tudo explicado, depois de terem pecado, os jovens têm direito a ser perdoados, através da confissão. Os confessionários foram construídos por presidiários e, dentro deles, estarão padres dispostos a perdoarem todos os pecados cometidos na Colina e arredores.

Haverá ainda um Festival da Juventude, onde certamente serão consumidas toneladas de hóstias e, para terminar, haverá mais uma missa.

Em resumo, uma seca de Jornadas!

Expresso e a conjunção adversativo mas

Hoje é dia de debate sobre o estado da nação e o Expresso decidiu fazer um inquérito sobre “…o que melhorou e o que está por fazer”.

Faz lembrar aquela anedota do homem que, depois de levantar halteres de 100 quilos, é apupado porque não consegue levantar 105.

Vejamos os títulos:

Educação: “…abandono escolar continua a cair, qualificações a aumentar, mas há uma crise de professores”.

Saúde: “…SNS tem mais profissionais, mas não chegam para dar médico de família a todos”.

Economia: “…é das que mais crescem, mas nível de vida não descola da cuada da Europa”.

Salários: “…chegaram ao fim de 2022 acima de 2019, mas entraram no ano a cair.

Emprego: “…perto dos máximos, mas há menos pessoas a trabalhar com ensino superior.”

Pobreza: taxa desce em 2021, mas Portugal mantém-se longe da meta para 2030″.

Pensões: “…aumentos reais garantidos, mas reformas continuam baixas”.

Inflação: “…está a descer, mas continua elevada nos bens alimentares”.

Dívida pública: “…cai mais rápido do que previsto, mas Portugal mantém-se no grupo dos mais endividados”.

Ambiente: “…uso de transporte está a aumentar em Lisboa e no Porto, mas o carro continua a liderar.”

Bancos: “…estão mais rentáveis, mas procura de crédito arrefece”.

Como se vê, não há notícia boa que não mereça um mas.

Apetece-me dizer que o Expresso era um jornal como deve ser, mas agora é uma merda!

“Colchão de Pedra”, de Margaret Atwood (2014)

A idade não parece afectar a imaginação de Margaret Atwood. Actualmente com 83 anos, a escritora canadiana continua bem viva.

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Esta colectânea de contos foi publicada originalmente há nove anos, e saiu agora em Portugal, pela Bertrand.

São nove fábulas de humor negro. É a própria autora que lhe chama fábulas, embora os personagens sejam humanos, e não animais.

Na história que dá nome ao livro, uma turista, a bordo de um cruzeiro no írtico, engendra um assassínio perfeito, usando um estromatólito.

Na última fábula, idosos de um lar enfrentam uma multidão de manifestantes jovens que querem acabar com os idosos que não servem para nada, a não ser, para consumirem os parcos recursos do planeta.

Vale a pena ler.

“O Mago do Kremlin”, de Giuliano da Empoli (2022)

Na capa, a editora afirma que este é o “…«romance» que intriga os serviços secretos ocidentais”. E coloca romance entre aspas como quem diz que o livro será o relato verídico de um ex-conselheiro de Putin.

O livro é um longo monólogo desse tal ex-conselheiro, Vadim Baranov, que relata, ao longo de mais de 200 páginas, como conseguiu levar Putin ao Poder e como o manteve lá e acabou por se afastar, porque Putin, no fundo, não precisa de mais ninguém a seu lado, a não ser a sua cadela lavrador.

Não sei se haverá outro Vadim Baranov, mas googlando este nome, apenas me aparece um crítico literário russo, que faleceu em 2014. Deve ser coincidência.

Romances í  parte, o autor dá-nos uma descrição do Poder russo demasiado caricaturizada, na minha opinião.

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Página 35, diversas piadas sobre o tempo dos soviéticos:

“…«Sabes o que é um dueto soviético? É um quarteto que foi em digressão ao estrangeiro.»

«Uma comissão de inspectores visita um asilo de loucos. Os pacientes recebem-nos cantando: “˜Como é bom viver em terra soviética!”™ Mas a comissão repara que um homem continua calado. “˜Porque é que não cantas?”™, perguntam-lhe eles. “˜Eu sou enfermeiro, não sou doido!”™Â»

«O camarada Khrushchev visita uma criação de porcos e é fotografado. No Pravda, os grafistas discutem qual a legenda a colocar na imagem: “˜O camarada Krushchev entre os porcos”™, “˜O camarada Krushchev e os porcos”™, “˜Os porcos ao redor do camarada Krushchev?”™ Todas as propostas são rejeitadas, umas atrás das outras. Por fim, o director toma a sua decisão. A legenda escolhida é: “˜Terceiro í  direita, o camarada Krushchev”™Â».

Página 126, após um diálogo com um oligarca que vai acabar por “…suicidar”:

“…Sobra a guerra civil, devo confessar que me deu vontade de rir: como dizia aquele diplomata francês, a vantagem da guerra civil sobre a outra é que se pode ir comer a casa.”

Nas páginas 172 e seguintes, o tal suposto conselheiro do Czar, fala da Ucrânia:

“…Apoiados pelos americanos, os rebeldes (ucranianos) recusaram reconhecer o resultado das eleições, ocupando a praça principal de Kiev com os seus cânticos, as suas faixas cor de laranja, os seus alegres slogans pró-ocidentais. De súbito, comissões de observadores internacionais, delegações do Congresso americano, missões diplomáticas da União Europeia, materializaram-se do nada: todas concordavam em julgar ilegítimo o resultado das eleições ganhas pelo candidato pró-russo. Tinha-se acabado de votar no Afeganistão, no Iraque, com bombas a explodirem nas ruas e as tropas americanas a ocuparem as mesas de voto ““ aí, claramente, nenhum problema, tudo estava regular. Mas na Ucrânia não, claro que não.”

Romance ou relato verídico, é um livro curioso, que se lê como um daquelas novelas para ler no aeroporto.

“Os Engenheiros dos Caos”, de Giuliano Da Empoli 2019)

Empoli foi conselheiro de Matteo Renzi e conhece, por dentro, a política italiana. A partir do fenómeno do Movimento 5 Estrelas, Empoli analisa os movimentos populistas que levaram ao poder personagens como Trump, Bolsonaro, í“rban e outros.

Podemos extrapolar para o Ventrusca, sem muito esforço.

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“…Os defeitos dos líderes populistas transformam-se, aos olhos dos seus eleitores, em qualidades. A inexperiência deles é a prova de que não pertencem ao círculo corrupto das elites e a incompetência deles é a garantia da sua autenticidade.” –  escreve Empoli, na página 17.

O capítulo dedicado í  ascensão de Trump e í  influência de Steve Bannon, é simplesmente assustador. O modo como o tipo do cabelo amarelo diz uma coisa e, no dia seguinte, o seu contrário ““ e, sobretudo, como ele consegue que isso o favoreça, deixa-nos de queixo caído.

Por vezes, ficamos um pouco espantados quando percebemos que países do Leste, tantos anos, sob domínio comunista, viram agora í  Direita.

Diz Empoli:

“…Aos olhos dos conservadores húngaros, checos e polacos, a Europa Ocidental representava um ideal porque, contrariamente ao comunismo, garantia o respeito pelas tradições e pela religião. Não é de espantar, portanto, que eles se tenham sentido enganados quando compreenderam que a norma, no Ocidente, era o multiculturalismo e os casamentos homessexuais”.

Um livro que devia ser leitura obrigatória em algumas bancadas da Assembleia da República.

Um presidente que acredita na indigestão

Marcelo desmaiou!

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Estava na faculdade de Ciências e Tecnologia, a inaugurar um laboratório, quando alguém lhe ofereceu um moscatel. Quente.

O presidente não resiste a um copo ““ seja de moscatel, de ginjinha, de cerveja ou de qualquer outro líquido com uma percentagem de álcool aceitável.

Ignorando o facto ““ grave! ““ de já ter engolido o conteúdo de uma embalagem de Fortimel, Marcelo bebeu o Moscatel.

Estava quente!

Toda a gente sabe o mal que faz um cálice de moscatel quente.

Assim que o moscatel entrou no estí´mago presidencial, iniciou-se uma reação química com o Fortimel que ainda lá estava, a sobrenadar.

Consultando as precauções que constam da embalagem do Fortimel, podemos ler que só deve ser usado como suplemento, não sendo adequado como fonte alimentar única.

Ora, o presidente não almoçou e usou o Fortimel como fonte alimentar única. Ainda por cima, emborcou um cálice de moscatel. Quente!

Desceu-lhe a tensão!

Estava-se mesmo a ver.

Aliás, todos os médicos receitam moscatel quente aos hipertensos. É conhecida a sua ação hipotensora.

Felizmente, Marcelo recuperou bem. Depois de ter feito exames no Hospital, teve alta í s 8 horas, mesmo na abertura dos telejornais!

Marcelo afirmou aos jornalistas que, muito provavelmente, o Moscatel interferiu com a digestão do Fortimel.

Um presidente que acredita nas indigestões, é mesmo o que todos nós merecemos!

“A Mais Secreta Memória dos Homens”, de Mohamed Mbougar Sarr (2021)

Trata-se de um livro sobre outro livro.

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O outro livro chama-se O Labirinto do Inumano e foi escrito por um senegalês que emigrou para França, um tal Elimane. Esse livro ou é uma obra-prima ou um conjunto de plágios e Elimane desapareceu da circulação e ninguém sabe o que lhe aconteceu. Nunca ficamos a saber, ao certo, de que tratava o livro, embora muitos o tenham lido e tenham ficado fascinados com a escrita de Elimane.

Sarr (Dakar, Senegal, 1990), recebeu o Prémio Goncourt em 2021 graças a este complexo livro, que mistura cartas, mails, notícias de jornal, depoimentos de quem privou com o autor do tal livro e mais.

Confesso que tive alguma dificuldade em seguir o livro que, para mim, me pareceu uma sucessão de pequenas histórias, sendo que o livro de Elimane serve de costura a todos esses retalhos.