Terroristas e revolucionários

Nelson Mandela era terrorista?

Para os Estados Unidos era, até à semana passada.

A Frente Armada Revolucionária da Colômbia (FARC) é uma organização revolucionária?

Para o Partido Comunista Português, continua a ser.

Dito isto, que é absurdo, passo a explicar:

Nelson Mandela era o líder do ANC (Congresso Nacional Africano) que, durante anos, lutou contra o apartheid, na África do Sul. Essa luta não se fez só a nível político; teve, também, uma vertente de luta armada, de atentados bombistas, de assassinatos. Foi numa acção armada que Mandela foi preso e condenado a prisão perpétua. Por esse motivo, o Pentágono colocou o ANC na lista das organizações terroristas.

O resto da história é conhecido. O apartheid acabou, Mandela foi libertado e eleito presidente da África do Sul, o ANC também ganhou as eleições. Mas, para os Estados Unidos, o ANC continuou a ser uma organização terrorista e Mandela, um perigoso terrorista. Sempre que um ministro ou qualquer outro representante do governo sul africano pretendia deslocar-se aos States, só o podia fazer se fosse a alguma reunião da ONU porque se quisesse, por exemplo, ir à Disneylândia com os filhos, era muito provável que não conseguisse o visto de entrada nos EUA.

Esta semana, o assunto foi resolvido. O Congresso, finalmente, aprovou, por unanimidade (também era melhor…) a retirada do ANC da lista de organizações terroristas.

Mais vale tarde do que nunca.

Quanto às FARC, toda a gente sabe que pouco têm a ver com as organizações revolucionárias dos anos 60, tão características da América Latina, de inspiração Guevariana: Tupamaros, Sandinistas, Sendero Luminoso…

Há muito tempo que as FARC são um exército ao serviço do narcotráfico e pouco ou nada têm a ver com ideologias revolucionárias (a menos que se considere revolucionário distribuir coca pelos filhos dos capitalistas, para assim acabar com essa praga que esmaga a classe operária, os soldados e os marinheiros, os pescadores e os camponeses…).

Quem não ficou satisfeito com a libertação de Ingrid Betencourt? Foi com a ajuda dos serviços secretos israelitas e norte-americanos? E qual é o problema?

Na Assembleia da República, todos os partidos votaram a favor de uma moção que felicitava a libertação de Ingrid Betencourt. O PCP votou contra.

Os funcionários do PCP, que continuam a classificar as FARC como revolucionárias, deviam juntar-se aos congressistas norte-americanos que, durante todos estes anos, consideraram Mandela um terrorista.

Depois, todos juntos, podiam ir à merda.

16 thoughts on “Terroristas e revolucionários

  1. Não acredito que o PCP tenha votado contra a moção de felicitação. Queriam o quê? Que a senhora ficasse cativa o resto da vida?

    Absurdo!

    Ainda por cima foi, ao que parece, uma operação “limpa”.

  2. Não só votou contra a moção como fez publicar, no Avante! um texto de Miguel Urbano Rodrigues cheio de encómios às FARC…

  3. o PCP, pelos vistos, não está sozinho: Equador, Bolívia, Brasil, Argentina e Chile (países vizinhos da Colômbia) não consideram as FARC-EP uma organização terrorista e não criminalizam a sua acção.
    Aliás, em todo o mundo, só os EUA, o Canadá e a UE, catalogam as FARC-EP como “organização terrorista”.
    Vale o que vale.

  4. Como também não esteve isolado na AR – por muito que as manchetes “PCP vota contra voto de congratulação pela libertação de Ingrid Betancourt”, “PCP isolado” e afins, tenham sido repetidas à exaustão… por muito que façam fé na palavras de Goebbels, a verdade é que o PCP apresentou um voto de congratulação próprio – o único, dos apresentados, que incluía a palavra “paz” e apontava para a necessidade da resolução pacífica do conflito armado que se regista naquele país há já 60 anos.

  5. Da mesma maneira que “elementos de uma empresa norte-americana, contratada para vigiar o espaço aéreo colombiano, onde se incluía um luso-descendente – Marc Gonçalves” é eufemismo para “agentes da CIA” E/ou “narcotraficantes”, também “reféns” é eufemismo para “prisioneiros de guerra”… só a desonestidade intelectual E/ou a desinformação de alguém levará a que se descure o contexto histórico do aparecimento das FARC-EP, o seu desenvolvimento, e a actual situação sócio-política daquele país, e partirá para uma interpretação sumária dos últimos acontecimentos.

  6. Ó Maria Olivia, deixou-me sem palavras! Não sei mesmo o que dizer, a não ser, talvez, que, por momentos, você conseguiu transportar-me para os meus tempos de estudante, quando comprava os Cadernos D. Quixote e vibrava com os feitos das guerrilhas sul-americanas. Obrigado por este momento de nostalgia…

  7. …entretanto “o muro cai-nos” na cabeça, dá-se “o fim da História”, e, de repente, deixamos de ler os Cadernos D. Quixote para passar a vibrar com os editoriais do Público…e é a merda que se vê.

  8. Provocação à parte, não me leve a mal… a minha solidariedade vai para com o povo colombiano na sua luta contra o fascismo…

  9. Ai o povo colombiano a lutar contra o fascismo!… que imagem bonita!…
    Olhe, o que eu não sabia é que lhe tinha caido um muro em cima da cabeça!… Coitada de si!… Isso explica muita coisa…

  10. Sim, sim – o povo colombiano a lutar contra o fascismo. O fascismo que, na Colômbia, persegue, tortura e assassina sindicalistas, comunistas e outros democratas. Mas admito que o Público desses não fale…ainda assim, veja se apanha esta nalguma TV ou jornal cá do burgo:

    http://tempodascerejas.blogspot.com/2008/07/no-no-para-estragar-nenhuma-justa.html#links

    É que, a bem da coerência intelectual seria, no mínimo, correcto que todos quantos se preocuparam com a tal de Ingrid Betancourt, agora se preocupassem de facto com o que se passa na Colômbia.

  11. é como muito orgulho que os funcionários do PCP votaram contra e obrigada Maria Olivia (pelo menos alguém que não seja influenciada apenas pelo que passa pelos media).

    o povo colombiano vive sob o domínio fascista, e na sua luta pela liberdade é apoiada pelos que sempre lutaram pela democracia e liberdade, que não são guiados pelo poder ou dinheiro.

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