“Once Upon a Time in Hollywood”, de Quentin Tarantino (2019)

Beethoven compôs nove sinfonias. Tarantino realizou nove filmes.

Não vou comparar Beethoven com Tarantino. Seria o mesmo que comparar grelos cozidos com laranjas.

Mas sempre direi que, no que respeita às sinfonias de Beethoven, é impossível dizer qual é a melhor. Será a famosa Quinta ou a Nona, conhecida como Coral? Será a Terceira, a Heróica, ou a Sexta, a Pastoral?

Já no que diz respeito aos nove filmes de Tarantino, o melhor é, sem dúvida, Pulp Fiction.

A este nono filme de Tarantino, falta-lhe alguma coisa para ser um Pulp Fiction.

Falta-lhe algum ritmo (há cenas intermináveis de Rick a conduzir pelas ruas e estradas de LA), faltam-lhe o monólogos de Keitel e de Cristopher Walken e falta-lhe uma personagem feminina como a de Uma Thurman.

Mas tem outros ingredientes muito bons: a dupla de Brad Pitt e Leonardo DiCaprio iguala a de Travolta e Sammuel L. Jackson, os diálogos são dignos de Tarantino e a banda sonora é excelente (Joe Cocker, Mamas and Papas, José Feliciano, Easy Beats e muitos outros, em versões menos conhecidas de êxitos de finais dos anos 60).

E depois, há a homenagem aos filmes, a Hollywood, aos western spaguetti, às séries televisivas a preto e branco, aos cromos e aos tiques dos actores, realizadores e restante família.

DiCaprio faz um óptimo Rick Dalton, um actor de séries televisivas que está em declínio; muito bem acompanhado por Brad Pitt, o seu duplo e que, agora, faz de motorista e faz-tudo do actor.

Dalton mora mesmo ao lado da vivenda que Polanski partilha com Sharon Tate e, como a acção decorre em 1969, sabemos que estamos no ano em que Charlie Manson é o mentor dos assassínios brutais de Tate e dos seus amigos, na noite de 9 de agosto de 1969.

Por isso mesmo, o final do nono filme de Tarantino é surpreendente.

Embora não consiga atingir o nível de Pulp Fiction, Once Upon a Time in Hollywood garante um bom entretenimento durante três horas.

“Inglourious Basterds”

Tarantino está em forma!

Estava um pouco desiludido com ele. Depois do inolvidável “Reservoir Dogs” e do inultrapassável “Pulp Fiction”, o díptico “Kill Bill” não me entusiasmou. As artes marciais não são o meu forte…

Em contrapartida, este “Inglouriou Basterds” é um entretenimento cinco estrelas, contendo todos os tiques geniais de Tarantino: os longos diálogos aparentemente sem sentido, a divisão da narrativa em capítulos, a banda sonora muito especial.

A primeira cena do filme dá logo o tom: Christoph Waltz, que faz um espantoso Coronel Hans Landa, conversa com um produtor de leite francês, à mesa da sua modesta casa, sabendo que, por baixo, se esconde uma família de judeus. Lá fora, estão alguns soldados alemães, que aguardam a ordem do coronel para chacinarem os judeus, e as três jovens filhas do agricultor, virginais e cândidas. Não lhes acontece nada, mas Tarantino cria o ambiente de tal modo que nós estamos sempre à espera da maior desgraça.

Brad Pitt faz o papel do sargento Aldo Raine que, com o seu bando de “basterds” (fazendo lembrar “Dirty Dozen”), se entretém a matar nazis e a tirar-lhe os escalpes. Algumas cenas são citações dos westerns de Sérgio Leone, incluindo a banda sonora, a fazer lembrar “The Good, the Bad and the Ugly”.

Na cena final, ou quase, Hitler é metralhado, juntamente com todo o seu Estado-maior, o que fez com que a guerra tenha acabado naquele dia. O facto disso nunca ter acontecido não tem a menor importância.

Destaque para a figura criada por Brad Pitt mas, sobretudo, para a interpretação de Christoph Waltz. O tipo consegue que odiemos o coronel Landa e aprovemos a sua sanguinária morte.

(Eu sei que ele não morre no fim do filme – mas aprovamos, ou não, a sua sanguinária morte?)