“21 Lições para o Século XXI”, de Yuval Noah Harari (2018)

Depois de lermos, com muito agrado, o primeiro livro deste historiador israelita, Sapiens, avançámos para este, que é o seu terceiro livro, e ainda gostámos mais.

O livro está dividido nas seguintes partes: O Desfio Tecnológico, o Desafio Político, Desespero e Esperança, Verdade e Resiliência.

Cada uma destas partes, encerra diversos capítulos, num total de 21.

Já tinha escrito um texto a propósito de uma passagem deste livro, em que Harari fala dos nacionalismos – está aqui.

Mas todo o livro é citável…

Na impossibilidade de transcrever todo o livro, vou salientar aqui alguns trechos que me tocaram mais.

“Não tenho a menor ideia de como será o mercado de trabalho em 2050. É relativamente consensual que a aprendizagem automática e a robótica irão mudar quase todas as áreas profissionais – da produção de iogurte ao ensino do yoga.”

(pag. 41 – Capítulo Trabalho – Quando fores grande, talvez não tenhas profissão)

“A seguir, combinamos o algoritmo com sensores biométricos e o algoritmo, agora, fica a saber de que modo cada frame do filme influenciou o nosso ritmo cardíaco, a nossa tensão arterial e a nossa actividade cerebral. Enquanto vemos, por exemplo, Pulp Fiction, de Quentin Tarantino, o algoritmo pode reparar que a cena da violação suscitou em nós uma levíssima e quase imperceptível excitação, que quando Vincent dispara sem querer para a cara de Marvin isso nos faz rir com sentimentos de culpa, e que não percebemos a piada do «Big Kahuna Burger» mas que nos rimos na mesma para não parecermos estúpidos. Quando forçamos o riso, usamos músculo  e circuitos cerebrais diferentes dos que accionamos quando algo nos faz rir de verdade.”

(pag. 77; Capítulo Liberdade – A Big Data está de olho em ti)

“Em 2011, irrompeu um escândalo quando o jornal ultraortodoxo de Brooklyn Di Tzeitung publicou uma fotografia oficial do governo de Obama mas apagou digitalmente a secretária de Estado Hillary Clinton. O jornal explicou que se viu forçado a fazê-lo devido às «leis de castidade judaicas». Deu-se um escândalo parecido quando o HaMevaser apagou Angela Merkel de uma fotografia tirada numa manifestação contra o massacre do Charlie Hebdo, não fosse a sua imagem despertar pensamentos libidinosos nas mentes dos leitores devotos. O editor de um terceiro jornal judeu ultraortodoxo, Hamodia, defendeu esta política, explicando que «estamos a seguir milhares de anos de tradição judaica».

(pag. 123 – Capítulo Civilização – Só existe uma civilização no mundo)

“Há mil anos, se adoecêssemos, o sítio onde vivíamos era decisivo. Na Europa, o padre local provavelmente dir-nos-ia que tínhamos provocado a ira de Deus e que, para recuperarmos a nossa saúde, deveríamos doar qualquer coisa à Igreja, fazer uma peregrinação a um local sagrado e rezar com fervor a Deus, pedindo-lhe perdão. Ou, por outro lado, a bruxa da aldeia podia explicar-nos que estávamos possuídos por um demónio e que ela podia expulsá-lo com cânticos, danças e o sangue de um galo preto.
No Médio Oriente, os médicos formados à luz das tradições clássicas podiam explicar-nos que os nossos quatro humores corporais estavam em desequilíbrio e que podíamos harmonizá-los seguindo um dado regime alimentar e tomando poções fedorentas. Na Índia, os peritos ayurvédicos avançariam as suas próprias teorias sobre o equilíbrio entre os elementos corporais, conhecidos como doshas, e recomendar-nos-iam um tratamento de ervas, massagens e posturas de yoga. Médicos chineses, xamãs siberianos, curandeiros africanos, terapeutas ameríndios – todos os impérios, reinos e tribos tinham as suas próprias tradições e os seus respectivos peritos (…). A única coisa comum às práticas medicinais europeias, chinesas, africanas e americanas era o facto de, em todos esses lugares, pelo menos um terço das crianças morrer antes de atingir a idade adulta e a esperança média de vida se situar abaixo dos 50 anos.”

(pag. 133 – Capítulo Civilização – Só existe uma civilização no mundo)

“Então, como deve o estado lidar com o terrorismo? Um combate contra-terrorista bem-sucedido deve fazer-se em três frentes. Primeiro, os governos devem concentrar-se em acções clandestinas contra as redes terroristas. Em segundo lugar, os meios de comunicação não devem perder a perspectiva, evitando a histeria. O teatro do terror não consegue viver sem exposição mediática. Infelizmente, os meios de comunicação oferecem-na de graça, relatando obsessivamente ataques terroristas e inflacionando o seu perigo, uma vez que as peças jornalísticas sobre terrorismo aumentam muito mais as vendas do que as peças sobre diabetes ou poluição atmosférica.”

(pag. 197 – Capítulo Terrorismo – Não entrar em pânico)

“E quanto à bestialidade? Já participei em diversos debates públicos e privados sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo e há quase sempre um espertalhão que pergunta: «Se permitimos o casamento entre dois homens, por que não permitir o casamento entre um homem e uma ovelha?». Do ponto de vista secular, a resposta é evidente. As relações saudáveis requerem profundidade emocional, intelectual e até espiritual. Um casamento que não tenha esta profundidade vai deixar o indivíduo frustrado, só e psicologicamente atrofiado. Enquanto dois homens podem certamente satisfazer as necessidades emocionais, intelectuais e espirituais um do outro, um relacionamento com uma ovelha não pode.
(…) E o que dizer de uma relação entre um pai e sua filha? São ambos seres humanos, então qual é o mal? Bom, vários estudos psicológicos já demonstraram que esse tipo de relação inflige um dano imenso e geralmente irreparável nos filhos. Além disso, reflectem e intensificam tendências destrutivas nos pais. A evolução moldou a psique do Sapiens de modo que as relações românticas não se misturem com as relações parentais. Assim, não precisamos de Deus ou da Bíblia para nos opormos ao incesto – basta lermos os estudos psicológicos sobre o assunto.”

(pag. 240 – Capítulo Secularismo – Reconhecer a nossa sombra)

“O poder do pensamento grupal é tão inexorável que é difícil romper com a sua influência mesmo quando as perspectivas em causa parecem bastante arbitrárias. Assim, nos EUA, os conservadores de direita tendem a importar-se menos com coisas como a poluição e as espécies em vias de extinção do que os progressistas de esquerda, motivo pelo qual o Louisiana tem leis ambientais muito mais permissivas do que o Massachussetts. Estamos habituados a esta situação, pelo que damos como banal, mas, na verdade, é surpreendente. Seria de pensar que os conservadores se importariam muito mais com a conservação da velha ordem ecológica e com a protecção das suas terras, as suas florestas e os seus rios ancestrais. Por sua vez, seria de esperar que os progressistas estivessem muito mais abertos a mudanças na natureza, especialmente se o objectivo fosse acelerar o progresso e aumentar a qualidade de vida dos seres humanos. No entanto, uma vez estabelecidas as directrizes partidárias quanto a um tema, devido a várias particularidades históricas, torna-se normal para os conservadores desvalorizarem as preocupações com rios poluídos e com o desaparecimento de aves, ao passo que os progressistas de esquerda tendem a recear qualquer alteração à velha ordem ecológica”.

(pag. 256 – Capítulo Ignorância – Sabemos menos do que julgamos)

Vale a pena ler.

 

 

Os piropos não passarão!

O Bloco de Esquerda insiste nos temas fracturantes.

Agora, quer acabar com os piropos.

Duas militantes bloquistas, cujos nomes convém repetir, são elas Adriana Lopera e Elsa Almeida, consideram que o piropo é uma forma de assédio e que o “assédio só pode estar enquadrado na área na violência contra as mulheres, portanto da violência de género ou violência machista”.

Sendo assim, as senhoras pretendem iniciar um debate que, no final, levará à criminalização do piropo.

Quando isso acontecer, deixaremos de ouvir coisas como:

«Ó Catarina Martins, és tão gira a andar de patins!»

ou ainda: «Ó Elsa Almeida, pareces uma miúda da Al-Qeida!»

ou ainda: «Ó Adriana Lopera, por que você é tão bera?»

Mas há aqui uma coisa que não compreendo: por que raio é que o piropo há de ser só dirigido às mulheres?

Por que não havemos de ouvir: «João Semedo, deixe-me beijar-lhe a careca, não tenha medo!»

Por favor, Dona Elsa e Dona Adriana, não tornem as nossas ruas ainda mais tristes!