“Relatório do Interior”, de Paul Auster

Depois de Diário de Inverno (2011),  Paul Auster continua em registo de diário com este Report from the Interior (2013), no entanto, não gostei tanto deste como daquele.

relatorio do interiorEnquanto no Diário de Inverno, Auster relata as suas memórias de infância, contando episódios curiosos, relacionando-os com os acontecimentos da História dos EUA e do Mundo, em Relatório de Inverno, o escritor norte-americano detém-se sobre a sua adolescência e os primeiros anos da idade adulta e grande parte do livro baseia-se nas cartas que escreveu à sua namorada de então e que viria a ser a sua primeira mulher, Lydia Davis – a qual se tornou famosa como autora de contos (ver Contos Completos).

No entanto, o livro não deixa de ser interessante, sobretudo para quem, como eu,  gosta de Auster e leu quase toda a sua obra.

Percebe-se, por exemplo, por que razão ele é considerada como um dos escritores americanos mais “europeu”. No livro, Auster fala-nos dos tempos que passou em Paris, das suas traduções de poetas franceses, que lhe permitiu ganhar algum dinheiro, numa altura em que estava falido e não consegue evitar palavra amargas sobre a América, como estas:

«A América era perfeita. A América vencera a guerra e mandava no mundo, e a única pessoa má que alguma vez produzira era Benedict Arnold, o traidor infame que se virara contra o seu país e cujo nome era injuriado por todos os patriotas. Todas as outras figuras históricas eram sábias e boas e justas. Cada dia trazia mais progresso, e por muito extraordinário que o passado americano tivesse sido, o futuro era ainda mais promissor. Nunca te esqueças da sorte que tens. Ser americano é participar no maior empreendimento humano desde a criação do homem».

O livro inclui, no seu final, uma série de fotos relacionadas com alguns dos factos narrados pelo autor.

“Diário de Inverno”, de Paul Auster (2011)

Para quem nunca leu nenhum livro de Paul Auster, este não é o melhor para começar.

Trata-se de um livro intimista, talvez demasiado intimista para quem não conheça este escritor norte-americano.

Para quem, como eu, o conheço de ginjeira, tendo lido todos os seus livros, este pequeno livrinho foi uma maneira de me reconciliar com Auster, depois da semi-desilusão que foi Sunset Park (2010).

Em Winter Journal, Auster fala consigo mesmo e vai recordando episódios da sua vida, desde a infância (problemática, pelos vistos), até aos dias de hoje.

Mais em jeito de autobiografia do que de diário, Auster conta episódios divertidos, momento de angústia, acidentes de automóvel, quedas, encontros amorosos, cenas de pancadaria, viagens, refeições e tudo com muita simplicidade; às tantas, parece que estamos a ouvir um amigo a contar-nos a sua vida.

E Auster vai ao pormenor de nos contar coisas tão comezinhas como daquela vez que estava muito aflito para urinar e não tinha onde nem como, porque ia no banco de trás do carro da família, com a mãe ao volante e ela já tinha dito que não ia parar por causa da sua urgência urinária. E foi assim, que Auster, já com 15 anos, ouviu a sua mãe ordenar-lhe que se mijasse pelas pernas abaixo. A propósito deste episódio, o escritor lembra as últimas palavras proferidas pelo pai de um seu amigo: «Lembra-te, Charlie! – disse – nunca percas uma oportunidade de mijar!».

É a narração deste e de outros episódios, simples e corriqueiros, que tornam este pequeno e honesto livro, uma obra indispensável para quem gosta de Paul Auster.