Três Cantos – José Mário Branco, Sérgio Godinho e Fausto

3cantosNo dia 26 de Novembro de 1971, tinha eu 18 anos, estive sentado na plateia do antigo cinema Roma e, com o coração exaltado, assisti à emissão, ao vivo, do Programa Página Um, da Rádio Renascença.

Nessa emissão, foi feita a apresentação pública do primeiro disco de José Mário Branco, “Mudam-se os Tempos…”. O Página Um era um programa “revolucionário”, de José Manuel Nunes, onde passava música que mais nenhuma rádio transmitia. A apresentação do disco, sem a presença do seu autor, exilado em França, foi feita pelo jornalista Adelino Gomes que, mais tarde haveria de ser meu colega na redacção do Telejornal da RTP.

A música do José Mário Branco era diferente de tudo o que tinha ouvido antes, em português, entenda-se: os arranjos eram notáveis, as melodias complexas e simples, simultaneamente, as letras empenhadas politicamente. José Mário Branco tinha conseguido fazer algo de novo: um produto musical sofisticado e, ao mesmo tempo, revolucionário, no sentido político do termo.

Como em muitas outras coisas, a “luta” contra a ditadura unia pessoas com diferentes estilos e opções de vida. O 25 de Abril afastou-as. Nos primeiros anos, ainda me exaltei com algumas das músicas do José Mário Branco, compostas para o colectivo GAC, com o “Ser Solidário”, como o “FMI”, mas, a pouco e pouco, afastei-me.

No entanto, ontem, ao assistir, em dvd, ao concerto do Campo Pequeno, não pude deeixar de passar por muitos momentos de emoção, com um nó na garganta, sobretudo quando tentei acompanhar canções como “Mariazinha”, “Confederação” ou “Inquietação”.

No que respeita ao Sérgio Godinho, sempre acompanhei a sua carreira e sempre pensei que ele tem uma enorme capacidade para meter o Rossio na Betesga e acho que tem músicas notáveis, que vão ficar na história da música popular portuguesa, incluindo, mesmo, aquela do “tractor, trabalha a todo vapor”…

Também me emocionei, ontem, com “Maré Alta” e “Primeiro Dia”.

No que respeita a Fausto, a coisa é um pouco diferente. Nos anos 70, na sala de alunos da Faculdade de Medicina de Lisboa, assisti a um espectáculo em que ele cantou, mas em que a estrela foi, sem dúvida, Ary dos Santos, que pôs aquela malta toda de pé a berrar “S.A.R.L! S.A.R.L.”

Para além de “Por este Rio Acima”, que é um grande disco, pouco conheço da carreira de Fausto.

O espectáculo captado no Campo Pequeno, para além da surpresa de juntar estes três figurões da música popular “revolucionária”, não tem mais nenhuma surpresa: os arranjos orquestrais e vocais são competentes, mas expectáveis, as versões das canções são o mais possível parecidas com os originais e o inédito é mais do mesmo.

No fundo, era isto que as pessoas queriam: o Zé Mário, o Sérgio e o Fausto o mais parecidos possível com o tempo em que tínhamos 18 anos!…

One thought on “Três Cantos – José Mário Branco, Sérgio Godinho e Fausto

  1. Vale a pena ouvir recordando mas espanta como tantas coisas datadas e marcadas pelas circunstâncias específicas, do antes e do 25ABR, passam hoje sem envelhecerem. Ou fomos nós que envelhecemos?
    O Fausto , menos engajado e mais profissional, fez só um dos melhores álbuns do século passado.
    Antes era o Zeca mas depois são estes 3 quem marca um certo tipo de música mais ou menos revolucionária. Revolucionária certamente com José Mário Branco diminuindo gradualmente atá ao Fausto.
    Para os cotas vale a pena.

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