A cona da mãe

Dizem que Braga é a cidade dos arcebispos.

Só isso seria o suficiente para afastar o comum dos mortais dessa cidade.

Imaginem uma cidade só com tipos vestidos com aqueles fatos ridículos, uma espécie de saias até aos pés, com botões de cima a baixo, como se tivessem braguilhas gigantes, e todos sibilando os “ésses”, juntando as mãos, em prece, e sentando meninos no colo, fazendo cavalinho com os joelhos, numa atitude ameaçadoramente terna.

Sente-se, assim, uma espécie de asco, de nojo que nos vem do âmago.

Mas, felizmente, Braga é uma cidade bonita, com muita gente nova e a história dos bispos e arcebispos tem cada vez menos importância.

Senhores vestidos de negro, ou com naperons sobre os ombros e chapéus cónicos e ridículos, e segurando grandes cajados cravados de diamantes, têm cada vez menos influência numa sociedade moderna, evoluída, civilizada.

Ou não?

Então nao é que, em Braga, numa feira do livro, a polícia apreendeu cinco exemplares de um livro, intitulado “Pornocracia”, que tinha esta figura na capa?

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Trata-se da reprodução de uma pintura, da autoria de Gustav Courbet, datada de 1866, e intitulada “A Origem do Mundo”.

Suponho que os polícias, ao verem a capa dos livros, tenham exclamado: “Mas esta é a cona da minha mãe!”

E toca a apreender o livro, não fossem as criancinhas que por ali andavam, mascaradas de homem-aranha, capuchinho vermelho ou bela adormecida, olhassem para a capa do livro e exclamassem: “Ó mamã! Olha aquela senhora com tantos pêlos no pipi! Parece mesmo a mãe do senhor polícia ou do senhor arcebispo de Braga!”

Não estou a insinuar que foram os bispos de Braga que obrigaram a PSP a ir àquela feira do livro apreender os livros com a reprodução da pintura de Courbet na capa.

Longe de mim imaginar que os bispos e os polícias têm algo contra a vagina – já que todos eles, todos sem excepção, tiveram uma mãezinha e, exceptuando os que nasceram de cesariana, todos sairam por aquele orifício, ali representado na pintura do francês, bem rodeado de pêlos.

Não foi por isso.

Também não acredito que quem decidiu a apreensão dos livros se tenha querido armar em agente da PIDE – que é uma coisa que cada vez menos pessoas se lembra do que foi e ainda bem!

Finalmente, não acredito que este gesto tenha algum significado especial, tipo “estamos a voltar ao antes do 25 de abril”, ou “cada vez há menos liberdade”, ou “o Sócrates é responsável por este clima de medo, que leva as autoridades a tomarem atitudes cada vez mais discricionárias”.

Nada disso.

O que se passou foi bem mais simples: alguns cidadãos bracarenses, altamente traumatizados por mães castradoras, não resistiram quando viram, na capa daqueles livros, a representação da cona da mãe deles.

E fizeram queixa à polícia.

Os polícias, por sua vez, também não conseguiram resistir à imagem da cona da mãe deles, e levaram os livros todos para a esquadra.

Algum espanto?

É este o poder da cona da mãe!

11 thoughts on “A cona da mãe

  1. Eh!Eh!
    Com uma Polícia assim eficiente até nem é de admirar que o crime vá aumentando cada vez mais!…
    …continuamos ainda a ser um país de gente parola em grande percentagem…
    Texto hilariante e bem conseguido.Bravoooooo!…..

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